Desperdício em nome da Ciência

O presente artigo discute questões relativas à forma como a Secretaria de Educação do Distrito Federal tem implementado o programa “Ciência em foco”. O referido programa é mais uma das estratégias privatizantes adotada pelo atual Governo que, dentre outros aspectos: deixa de considerar as reais necessidades das escolas públicas, numa ruptura com o processo de gestão – “gestão compartilhada” – adotado pela SEDF, não leva em conta a proposta pedagógica de cada escola e deixa de considerar a infraestrutura necessária para o desenvolvimento das atividades pedagógicas. O programa “Ciências em foco” tem resultado em um grande desperdício de recursos públicos, ocasionado pela falta de planejamento ou pelo descompromisso dos gestores com a coisa pública.

PALAVRAS CHAVE: escola, políticas públicas e neoliberalismo, privatização, ensino de ciências.
Em outra oportunidade teci considerações sobre o programa “Ciência em Foco”. Hoje, após alguns meses de implantação do mesmo, volto à discussão, por entender que os pontos levantados há quase um ano permanecem nebulosos, dentre outros pontos destaco:
Não se tem uma idéia do custo do referido programa. Foi possível constatar que há materiais que com toda certeza poderiam ser adquiridos por um preço menor se comprados no mercado local e não em São Paulo, (…) Mas, o governo não se descuidou de fazer a propaganda. Para demonstrar que o programa é aceito por boa parte dos professores a Sangari Brasil fez uma pesquisa sobre o material. A pesquisa constava de um questionário apresentado, ao final de cada dia, no qual se perguntava sobre a qualidade do material e nunca sobre o programa como um todo. (…). (artigo “Neoliberalismo e retrocessos nas escolas públicas do Distrito Federal”, publicado no site do SINPRO-DF em 2007.).
Os pontos acima mencionados, bem como outros tão ou mais importantes, continuam a merecer considerações. As criticas aqui desenvolvidas não têm o objetivo de desconsiderar o programa como um todo. Cabe destacar que, naquele momento, também não o fiz, levantei aspectos relacionados à concepção política administrativa e pedagógica do programa, como citado anteriormente. Estes questionamentos levantados em 2008 continuam sem respostas, assim como os questionamentos quanto aos usos políticos e pedagógicos do referido programa.

Reconhecemos que o fato de existirem materiais e equipamentos para o desenvolvimento das aulas de ciências é importante, só não queremos que tal situação se dê a qualquer custo, principalmente quando as despesas são pagas com recursos públicos e têm como destino o pagamento de empresas contratadas com critérios pouco claros.
Hoje, após trabalharmos com o programa em nossa escola, e o temos feito da melhor maneira possível, constatamos vários desvios, vícios ou mesmo atitudes de ma fé dos gestores do programa, vejamos alguns exemplos: a) os treinamentos, inicialmente suntuosos, em hotéis de luxo da cidade, foram substituídos por eventos mais modestos, ocorre que nunca se soube o custo de uns e de outros, a eficiência dos primeiros e dos demais, continua questionável.

Qual o custo de cada treinamento? b) fato extremamente grave é que a aplicação do programa, com todos os seus módulos, obriga ao professor regente dispensar o uso do livro texto – já existente na escola, comprado com dinheiro público, e de boa qualidade.

Quanto custa o desperdício gerado com o abandono dos milhares de livro financiados com recursos federais? Não tenho a resposta exata para esta questão, o que é certo é que isto ocorre por absoluta falta de planejamento ou por uma sanha em comparar, tanto em um quanto em outro caso estamos longe do modelo de eficiência tão divulgado pelo atual governo. Uma alternativa, simples e bem factível, para resolver este problema seria, por exemplo, o desenvolvimento das aulas em “salas ambientes” o que permitiria uma melhor organização das atividades e reduziria sobremaneira a compra de material, além de possibilitar uma melhor organização das atividades. Esta “vontade de comprar” tem levado a que muitos dos materiais que poderiam ser comprados em números modestos sejam multiplicados ao extremo e, logicamente seus custos também. Para não ficar na retórica, vejamos meu caso pessoal: sou professor de Ciências, tenho 6 turmas de oitava série e uma de quinta série, sete turmas com um total de 28 horas aula por semana, sou feliz – minha escola, antiga escola normal do Gama, possui infra-estrutura – minhas turmas possuem em media 40 alunos, considerando que as recomendações do programa são para que se trabalhe com grupos de quatro alunos, na realização de experimentos, em uma turma de quarenta alunos eu necessitaria, por exemplo de dez balanças, recebemos 240; para as atividades que necessitam do uso de bússolas, cronômetros, pipetas, livros etc. a situação se repete, ou seja o material que poderia ser utilizado em mais de uma turma é sempre comprado para o total de turmas da escola, novamente desconsideram que o atendimento das turmas se dará em horário diferente o que permite, com facilidade, o uso do mesmo material permanente e não descartável nas diferentes turmas. Veja-se que estou fazendo referência ao material chamado de permanente ou não consumível, de acordo com a própria SE-DF e pela SANGARI.

Qual o custo de multiplicar por 6 ou 7 o material permanente comprado, sabe-se-lá que preço? Cabe à Secretaria de Educação e aos órgãos de controle de contas públicas pronunciarem-se a este respeito. No geral, é necessário que o material impresso exista um para cada turma, assim como os reagentes, uma vez que se esgotam com o uso imediato. Quanto ao livros (roteiros das atividades a serem desenvolvidas no laboratório), por serem não consumíveis poderiam ser adquiridos em quantidades menores; lembrando-se de que um dos princípios da administração pública e a economicidade e que a sua produção tem um elevado custo ambiental e financeiro.
Em tempo: se o Governador Arruda fala em transparência, cabe ressaltar, que, assim como os demais servidores públicos, público, presto contas regularmente à Receita Federal e meu salário é público(basta ver os editais para concurso e o plano de carreira do magistério).

Quanto custam programas como o “ciência em foco” e o “programa de aceleração” (comprados de empresas privadas) e quais são os seus resultados Sr. Governador? Respostas a estas e outras perguntas podem contribuir não só para os programas em si, mas para aperfeiçoar os mecanismos de gestão da educação pública e aumentar a transparência na gestão dos recursos.

Autor: Olimpio Sabino Lourenço – Professor de Ciências do Centro de Ensino Fundamental 15 do Gama.