UIPSS: Professores apostam no esporte para ressocializar jovens

L 16 deu passos firmes até o púlpito montado na área externa da Unidade de Internação Provisória de São Sebastião (UIPSS). Com a responsabilidade de um adulto, o menino preto de pele clara – assim como quase todos os outros internos – segurou a tocha que acendeu a pira da 7ª Olimpíadas do Núcleo de Ensino/UIPSS.

Nos Jogos Olímpicos tradicionais, a chama simboliza paz, união, perseverança. Nos Jogos Olímpicos do NuEn/UIPSS os significados vão além: a chama representa a possibilidade de visibilidade pela capacidade – e não pelos erros. O ato traz a esperança de um futuro onde se possa falar, sem medo e com orgulho, nome e sobrenome com todas as letras.

 

Corrida de 100 metros | Foto: Deva Garcia

 

“É dentro do esporte que os meninos (internos) acabam se achando. O sedentarismo dos jovens, entre outras questões, afeta o condicionamento físico e, com os jogos, eles começam a ver como a saúde é importante para a vida, além da disciplina e o respeito às regras que o esporte exige. Têm os talentos descobertos também, e com essa descoberta, a autoestima”, analisa o coordenador do NuEn/UIPSS Eduardo da Silva Baptista.

Ele conta que, nesta edição, as Olimpíadas têm corrida com barreira, tênis de mesa, futevôlei, futebol de salão, arremesso de peso, corrida de 100 metros e salto em distância. Os atuais 51 internos (39 em internação provisória e 12 em sanção) participam de todas as modalidades. “O futebol sempre é o preferido, mas tudo que é novidade eles (os estudantes) se empolgam. O futevôlei tem sido a modalidade mais admirada pelos adolescentes. Até porque fora daqui esse é um esporte de acesso da elite”, diz o professor.

Professor Eduardo tem 12 anos de atuação no sistema socioeducativo, três deles no NuEn/UIPSS. Ele destaca que o espaço físico da Unidade de Internação de São Sebastião possibilita a implementação de novas modalidades esportivas, como bech tênis e badminton. “Essa estrutura não existe em outras unidades de internação”, diz.

 

Respeito e parceria
Bastam alguns minutos de diálogo com os estudantes do NuEn/UIPSS para perceber o respeito e a admiração dos jovens em ressocialização pelos professores e professoras que os acompanham.

“O professor é parceiro! Não trata a gente diferente”, faz questão de dizer V 17. Ele se refere ao professor Bruno Coimbra Alverca, que atua na Secretaria de Educação do DF em regime de contratação temporária.

 

O futebol é o queridinho dos estudantes da UISS | Foto: Deva Garcia

 

 

Bruno foi comerciante durante 25 anos. Por questões da vida, participou do processo simplificado para professor substituto e há 11 meses está em sala de aula. Professor de Geografia, ele não imaginava o que a docência traria enquanto ganho pessoal. “Aqui eu me sinto o cara!”, fala o professor. Logo em seguida, ele pede ao fotógrafo do Sinpro, Deva Garcia, que acompanhava a abertura da 7ª Olimpíada: “tira uma foto nossa aqui!”. Professor Bruno se junta aos adolescentes e posa para foto. O ato simples promoveu um dos poucos momentos em que aqueles adolescentes abrem sorriso largo, deixam a cabeça ereta e as mãos, sempre para trás do corpo no trânsito entre os espaços da unidade de internação, podem agir de forma autônoma.

“Hoje me sinto satisfeito dando aula para esses meninos. Gosto de participar com eles, sorrir com eles, sonhar com eles. Como aqui todo dia tem menino saindo e entrando, a gente atua com projetos. E nesses projetos a gente pode fazer a diferença na vida deles”, diz professor Bruno.

 

Destino das vidas
Na abertura da 7ª Olimpíadas do NuEn/UIPSS, a supervisora do núcleo de ensino, Sara Araújo, disse que “ama o que faz”. Ela esteve à frente de todas as edições do evento esportivo e de todos os outros projetos que o NuEn/UIPSS realiza, em parceria com a unidade.

Há 23 anos na rede de ensino do DF, Sara atua junto a uma equipe de 15 profissionais, sendo seis efetivos e nove substitutos. E além de supervisora, a professora faz também a matrícula de todos os estudantes que passam pela unidade.

Professora Sara está satisfeita com o resultado da 7ª Olimpíadas do NuEn/UIPSS, que vai até dia 10 de outubro. Entretanto, ela e toda a equipe da unidade de internação estão ansiosas com o destino de suas vidas.

 

Equipe da NuEn/UIPSS, além de servidores da unidade de internação provisória | Foto: Deva Garcia

 

No dia 11 de setembro, o Ministério Público do Distrito Federal, por meio da Promotoria de Execução de Medidas Socioeducativa, publicou recomendação de desativação da unidade de internação (Recomendação Nº 03/2025 – PREMSE).

O documento do Ministério Público afirma que a estrutura da UIPSS foi “originalmente concebida para fins prisionais” e, por isso, não consegue atender os “princípios pedagógicos” que devem orientar o período de internação dos jovens internos.

A recomendação, entretanto, foi destinada à Secretaria do Estado de Justiça e Cidadania do DF (Sejus) e ao subsecretário do Sistema Socioeducativo. A Secretaria de Educação não consta como destinatária, mesmo com Portaria específica (Portaria Conjunta nº 14, de 02 de setembro de 2025) que estabelece cooperação fundamental entre a SEEDF e a Sejus. Pelo texto da Portaria, o ponto central do documento é a regulamentação, implementação, acompanhamento e avaliação da política pública de escolarização de adolescentes e jovens que se encontram privados de liberdade.

Embora o documento do Ministério Público tenha sido publicado dia 11 de setembro, Sara afirma que os rumores da desativação da UIPSS vêm desde o início do ano. Procurada pela redação do Sinpro, a direção da unidade de internação confirmou que ainda não houve nenhuma informação oficial da Sejus sobre a desativação do espaço ou do remanejamento dos servidores. “O que a gente sabe é que existe todo um trabalho pedagógico estruturado e imprescindível para esses jovens, e a separação dessa equipe traria perdas significativas”, ressalta o diretor da UIPSS, Leonardo Leão.

Para Sara, já que o espaço não é o mais adequado para os jovens, o mínimo deveria ser a transferência de toda a equipe pedagógica, para outra unidade de internação que garanta aos profissionais as mesmas gratificações e o mínimo de mudanças na rotina de cada um, já que a maioria dos professores residem em São Sebastião, próximo à UIPSS.

 

Clique aqui e acesse o álbum de fotos do evento | Crédito: Deva Garcia