Sinpro realiza aula pública sobre racismo estrutural e misoginia no CEM 09 de Ceilândia

O Sinpro realizou, na sexta-feira (17/3), uma aula pública, ministrada numa roda de conversa, no Centro de Ensino Médio 09 de Ceilândia (CEM 09), sobre racismo estrutural e misoginia. A atividade de conscientização foi realizada após um estudante dessa unidade escolar “presentear” uma professora negra, no Dia Internacional da Mulher, com um pacote de palha de aço de lavar louça com o propósito de discriminar e humilhar, conforme foi revelado nos vídeos veiculados na Internet. Confira no link:  https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2023/03/5080098-estudante-presenteia-professora-negra-com-palha-de-aco-no-dia-da-mulher.html

 

Realizada pelas Secretarias de Raça e Sexualidade e de Mulheres do Sinpro, em conjunto com a Frente de Mulheres Negras do Distrito Federal, “a aula pública abordou o histórico do Brasil, construído em cima dos conceitos do patriarcado, do racismo e de como essa violência pode ser sutil a ponto de a pessoa, muitas vezes, nem perceber que está sendo vítima de uma atitude misógina e racista”, afirma Márcia Gilda, coordenadora da Secretaria de Raça e Sexualidade do Sinpro.

 

Para contrapor o presente ostensivo do estudante, o sindicato presentou todos(as) os(as) professores(as) e orientadores(as) educacionais com o caderno “É preciso ser antirracista”, produzido e lançado, em 2022, para ser material de apoio nas práticas pedagógicas de enfrentamento e combate ao racismo na rede pública de ensino do DF. O caderno segue as diretrizes do Artigo 2ª da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e da Lei nº 10.639/2003, que, há 20 anos, incluiu o ensino de história e cultura afro-brasileiras nos currículos oficiais da educação do País. A publicação será usada no planejamento pedagógico.

 

Segundo Márcia Gilda, a recepção da escola foi muito boa. A direção se colocou à disposição para receber o Sinpro e envolveu toda a unidade escolar na atividade. A diretora conta que as estudantes se sentiram ofendidas e perceberam a atitude misógina e racista na ação do estudante porque a palha de aço trouxe a dupla mensagem de que a professora negra não deveria estar ali exercendo sua profissão acadêmica, e sim em casa, lavando louças.

 

“Ele poderia ter usado qualquer outro objeto de uma casa, mas ele usou o Bombril, um objeto simbólico na perspectiva de que durante muito tempo o Bombril foi utilizado para ridicularizar as pessoas negras pela tentativa de associá-lo ao cabelo afro. Trata-se de crime de racismo porque atingiu e ofendeu a toda uma coletividade”, explica Márcia Gilda.

 

Na avaliação da diretora, o que falta para o Brasil vencer o racismo estrutural e reestruturar esse tema de forma plena, que respeite a diversidade de gênero e de raça, é de fato implantar a lei. “Pôr a lei em prática é a nossa sugestão e é pelo o que lutamos. Infelizmente, a educação antirracista ainda está na perspectiva da pedagogia de projeto. A gente precisa fazer com que a lei seja cumprida em todos os espaços sociais e prevista no próprio Projeto Político-Pedagógico da escola porque a educação é a chave que muda essa consciência. É a porta de entrada de transformação da sociedade”.

 

A diretora afirma também que, quando a escola trabalha esse tema efetivamente, consegue mudar essas consciências. “Infelizmente, nos últimos 6 anos, no Brasil, deu entrada o ‘empoderamento’ do racismo, homofobia, misoginia, xenofobia e algumas atitudes que a gente tinha conseguido dar uma parada, amenizar, fazer com que as pessoas começassem a pensar um pouco mais antes de cometer determinadas ações. Mas, nesses últimos anos, elas passaram a se sentir empoderadas nesse sentido da discriminação. Isso é resultado desse governo derrotado nas eleições de 2022, que colocou um negro na Fundação Palmares que era contra a pauta dos negros; uma mulher na Pasta de direitos humanos, que era contra as mulheres; uma pessoa na Pasta do meio ambiente, que era contra o meio ambiente”, destaca.

Márcia Gilda ressalta que, recentemente, um deputado federal eleito na última eleição tem se manifestado, claramente, contra os direitos trabalhistas. “A gente tem hoje um deputado que é contra direitos trabalhistas enquanto no País há uma explosão de denúncias com centenas de pessoas sendo resgatadas, diariamente, do trabalho análogo à escravidão. Essas pessoas que estavam, de certa forma, adormecidas, submersa, surgiram empoderadas, ganharam força nesses 6 últimos anos”, afirma.

 

Ela lembra que, recentemente, outro deputado federal usou a tribuna na Câmara dos Deputados para ofender as mulheres trans em pleno Dia Internacional das Mulheres. “Se a lei for cumprida e a gente começa a fazer esse não só na escola, mas também em todos os espaços em que existem grupos que debatem, como no trabalho, nas comunidades, nas escolas, a gente vai conseguir vencer esse tipo de situação, essas atitudes e esses gestos que tanto desconstroem o ser humano enquanto humano”.

 

Mônica Caldeira, coordenadora da Secretaria de Mulheres do Sinpro, informa que o evento foi muito agregador e envolveu o movimento negro, o sindicato, os estudantes, os(as) professores(as), a direção da escola, e que todos(as) participaram do debate acerca da importância de uma educação de combate ao racismo. Além do Sinpro, Mônica representou o movimento de mulheres do Distrito Federal e falou sobre o quanto a estereotipização foi utilizada, historicamente, para oprimir um grupo social em detrimento de outro.

 

“Ou seja, a exploração do homem pelo homem. Falei da estereotipização dos judeus no genocídio desse povo durante o nazismo; sobre a escravização do povo negro pela estereotipização da cor da pele e dos traços; e a estereotipização da mulher na condição de cuidadora, doméstica. Até quando isso vai para o mercado de trabalho, são as profissões menos valorizadas porque entra dentro da força e do poder que a estereotipização traz na hora de se correlacionar poderes na sociedade e até mesmo justificar a exploração de grupo social pelo outro”, explica.

 

Mônica considera que a atividade foi positiva e conta que fez um breve relato histórico até chegar ao movimento de mulheres. Houve também apresentações musicais do movimento negro e de mulheres. “Cantamos músicas sobre o empoderamento feminino e foi muito bom. Tivemos a participação dos e das estudantes com uma ciranda”.  A diretora relata que os(as) professores(as) consideraram a realização do evento nessa temática, com a presença do Sinpro, muito importante, e que ajuda a escola na dinâmica do processo pedagógico, trazendo pessoas de fora para abordar as questões em foco.

 

Ela explicou que abordou o tema pelo viés do estereótipo da mulher e a sua condição de cuidadora e doméstica porque o gesto do estudante tem também o viés de que o Bombril, no Dia Internacional da Mulher, passa a mensagem de que a professora só serve para lavar louça, além da discriminação do cabelo afro. “Por isso, foquei minha fala na estereotipação da mulher e expliquei que um grupo é marginalizado pelos traços físicos e que é por isso que não podemos admitir bullying, zoação com características físicas, porque existe um contexto histórico nelas”, finalizou.

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