Professores paranaenses impõem derrota judicial ao tucano Beto Richa

O governador tucano Beto Richa acaba de sofrer uma significativa derrota judicial em meio a sua campanha de confronto permanente com os professores da rede pública estadual de ensino do Paraná.
Acionada pela APP Sindicato, entidade que representa os educadores paranaenses, a Justiça do Paraná ordenou ao governo do estado que retifique os valores distorcidos referentes a supostos supersalários dos professores da rede pública publicados no Portal da Transparência mantido pelo executivo. Também ficou determinado que o governo retire do ar uma nota publicada pela agência estatal de notícias em que os supostos supersalários são comparados com os vencimentos dos prefeitos de 111 cidades paranaenses.
Na denúncia, a APP acusa o governo de utilizar o Portal da Transparência e a Agência de Notícias do Estado (AEN), ambos mantidos com dinheiro dos contribuintes paranaenses, para divulgar informações distorcidas referentes aos salários dos professores. Na avaliação da APP, a decisão do juiz Guilherme de Paula Rezende mostra que “o governo tinha a real intenção de criminalizar os salários dos educadores e, assim, colocar a população contra os trabalhadores depois de uma greve histórica a favor da educação paranaense”.
Rezende deu 48 horas para que o governo retirasse do ar a comparação dos salários dos professores com os de prefeitos e estabeleceu prazo de 90 dias para que os dados no Portal da Transparência sejam ajustados.
“É o mínimo que poderia se esperar de uma decisão que tivesse algum grau de senso de justiça e de lucidez”, declarou o presidente da APP Sindicato, Hermes Leão.
Do link onde encontrava-se a nota do governo com as informações distorcidas consta agora um comunicado informando que foi retirada do ar.
Os salários divulgados pelo governo, alguns deles superiores a R$ 20 mil, constavam da folha de pagamento de maio. Tais vencimentos, no entanto, representam um ponto fora da curva. No início do ano, ao término da primeira greve dos professores, o governo comprometeu-se a pagar nos meses seguintes as promoções e progressões de carreira devidas havia um ano e meio. As quantias devidas pelo governo havia pelo menos 18 meses foram pagas retroativamente, motivo pelo qual alguns professores chegaram a receber três ou quatro vezes mais do que seus salários normais em maio, explicou o deputado estadual Professor Lemos (PT).
“A decisão da Justiça repõe a verdade”, avaliou Lemos. “O governo mais uma vez agrediu os professores do nosso estado. Ele expôs os professores de modo mentiroso, como se eles recebessem realmente aqueles salários. Tratava-se de direitos atrasados, devidos pelo governo, que deixou de implementar promoções e progressões. A Justiça corrigiu em tempo esse erro”, prosseguiu o deputado.
Hermes Leão, por sua vez, afirmou que a APP, com o objetivo de evitar o estrago, entrou em contato com o governo quando Richa antecipou em entrevista que estava empenhado na pesquisa sobre os professores com salários supostamente superiores aos de prefeitos de cidades do interior do Paraná. “Fizemos um esforço para que fosse evitada essa divulgação distorcida”, assegurou. “Mas o governador se dedicou pessoalmente a esse episódio, desastroso inclusive para a imagem dele, pois foi desmontado pela própria imprensa. A gente lamenta que tenha sido necessário recorrer à Justiça em uma situação como essa, ridícula, que nem deveria ter acontecido”, prosseguiu Leão.
O revés judicial de Richa ocorre em meio a uma intensiva campanha do governo com o aparente objetivo de minar a credibilidade e a razoabilidade das reivindicações dos professores depois de duas greves realizadas este ano.
Muitos imaginaram que a animosidade fosse diminuir quando os professores e estudantes voltassem às salas de aula, especialmente depois do chamado Massacre do Centro Cívico, ocorrido em 29 de abril. Na ocasião, a repressão da polícia a professores, estudantes e servidores contrários a mudanças na previdência estadual deixou mais de 200 feridos.
A guerra de informação – ou desinformação – encampada pelo governo, porém, persistiu depois do fim da segunda greve, em 9 de junho, quando os educadores decidiram voltar ao trabalho mesmo com o governo terceirizando a negociação à Assembleia Legislativa e sem conseguirem nem ao menos repor a inflação. Apenas cinco dias depois do fim da greve, durante a convenção estadual do PSDB, o governador acusou os professores pela crise financeira paranaense e disse que “errou ao conceder generosos aumentos” à categoria. Nos dias seguintes, divulgou os supostos “supersalários” de professores.
Além disso, na volta às aulas, os professores passaram a trabalhar em um clima qualificado pelo deputado estadual Professor Lemos (PT) como “patrulhamento ideológico”. Em 22 de junho, a Secretaria de Educação publicou em seu site nota na qual orientava pais e mães a denunciarem o que qualificava como “doutrinação política dentro da sala de aula”.
“Parece que a greve ainda não acabou para ele (Richa)”, lamentou Hermes Leão.
Nas últimas semanas, a mídia paranaense chegou a noticiar casos de pais que levaram adiante queixas contra professores, principalmente de história, por terem levantado em sala de aula temas como o Massacre do Centro Cívico.
“A Secretaria de Estado da Educação tem sido informada que em algumas escolas da rede pública os alunos estão recebendo informações de caráter doutrinário e político”, inicia a nota do governo. “Conforme reclamações que chegam à Secretaria, alguns professores que fizeram greve estão insuflando crianças e adolescentes contra o governo do Estado”, prossegue o texto.

Hermes Leão confirmou que têm havido denúncias anônimas contra professores. “Como são anônimas, não sabemos se são pais e mães ou se são servidores do governo”, prosseguiu. “O que temos orientado ao pessoal sobre o conteúdo é evitar citação pessoal contra autoridades, mas o conteúdo, os fatos históricos, são sim elementos de estudo”, explicou Hermes Leão. “Estas são práticas de governos autoritários e antidemocráticos”, completou o presidente da APP.
O deputado Lemos concorda: “Isso é muito comum em regimes de exceção. Quando tivemos o triste período da ditadura no Brasil houve patrulhamento ideológico. O professor tinha inclusive que ter autorização do Dops para lecionar. Ele passava por uma entrevista, por toda uma triagem para saberem o que ele pensava. Isso é lamentável, é mais um erro, mais uma agressão”, critica o opositor.
“Nossa Constituição determina que a educação pública tem que ser ofertada com gestão democrática. E tanto a Constituição quanto a Lei de Diretrizes e Bases da educação brasileira asseguram ao professor autonomia para, na sala de aula, fazer o seu trabalho.”
Para Lemos, porém, tal patrulhamento não deve surtir resultado. “Lembremos que nem a ditadura, mesmo com todo o patrulhamento que fez, conseguiu calar os nossos professores e os nossos estudantes. Então, certamente esta ação do governo tem que ser reprovada por todos nós, mas não deve ter efeito prático nas salas de aula.”
(Da Rede Brasil Atual)