Ponto eletrônico: SEEDF desconsidera especificidades das unidades central e regionais; cenário é de prejuízo aos servidores

Enquanto a educação pública do Distrito Federal enfrenta dificuldades profundas devido à falta de investimentos em infraestrutura e valorização dos(as) profissionais, a Secretaria de Educação (SEEDF) optou por direcionar recursos para a instalação de Registradores Eletrônicos de Pontos com reconhecimento facial nas unidades administrativas e regionais de ensino. A iniciativa, em fase experimental até meados de junho deste ano, levanta preocupações devido aos eventuais prejuízos aos(às) professores(as) e orientadores(as) educacionais dos setores.

Realizada de forma unilateral pela SEEDF, a medida desconsiderou a importância do diálogo com o Sinpro, entidade representativa do magistério público, e com os(as) próprios(as) servidores(as) atingidos(as). Com isso, as especificidades do trabalho de professores(as) e orientadores(as) educacionais desses espaços foram completamente ignoradas.

Elos de implementação da proposta de política-pedagógica da SEEDF nas unidades escolares, os(as) servidores(as) das unidades administrativas e regionais de ensino realizam atividades externas ao seu local de trabalho, como formação e acompanhamento de projetos.

Dentro da lógica do registro de ponto eletrônico, o(a) servidor(a) deve bater o ponto na entrada da jornada em seu local de lotação ou através de aplicativo, baixado em seu aparelho telefônico particular. É importante perceber que o registro de ponto somente no local de trabalho aumentaria a quantidade e o tempo e de percursos feitos pelo(a) professor(a) ou orientador(a) educacional. Na prática, o(a) servidor deve registrar o ponto no início do dia para, depois, dirigir-se à atuação externa. Em seguida, ele retorna à unidade administrativa ou regional de ensino para registrar o ponto do almoço. Após, novamente, é feito o deslocamento para a atividade externa e, por fim, deve ser feito o retorno ao local de trabalho para bater o ponto no término do dia.

Foi desconsiderado pela SEEDF que as idas às atividades externas, inclusive às escolas do campo, são realizadas com veículo particular e combustível custeado do próprio bolso do(a) servidor(a). A situação é reflexo da insistência da Secretaria em não estabelecer uma indenização para transporte, como é previsto para outras categorias do GDF. Além disso, o Taxigov é insuficiente e extremamente burocrático para atender as reais necessidades de trabalhadoras e trabalhadores em atividade nas unidades central e regionais.

Ao fim e ao cabo, a imposição do ponto eletrônico engessa o desenvolvimento da política-pedagógica educacional nas escolas do DF. Além disso, pode ameaçar a privacidade desses(as) servidores(as), já que orienta a instalação do aplicativo de registro de ponto no aparelho celular particular do(a) servidor(a).

Como apresentado pelo Sinpro em Mesa de Negociação com a SEEDF, a pasta não pode impor a servidores(as) as prioridades de instalação de aplicativos nos seus próprios dispositivos móveis. É importante alertar ainda que o programa de geolocalização, por não ter precisão absoluta, poderia causar transtornos, sobretudo, para quem precisa se deslocar para realizar seu trabalho.

Como agravante, se mantido constantemente ativado, o sistema de geolocalização pode realizar vigilância ostensiva. Com isso, esses(as) servidores(as) podem desenvolver ansiedade, estresse, sensação de desconfiança e outros problemas que atacam a saúde mental.

Privatização
O ponto eletrônico nas unidades administrativas e regionais de ensino, conforme informou a SEEDF, é gerido e concebido por uma empresa privada contratada, o que reforça o caráter privatista do governo. Um dos problemas constantes neste tipo de contratação para área de educação é que o sistema desenvolvido concebe o espaço educacional como uma repartição burocrática do serviço público ou, até mesmo, uma empresa privada.

Educação não é mercadoria. Portanto, não pode ser enquadrada na lógica mercadológica de produtividade e gerencialismo, com foco em uma suposta eficiência e mensuração de resultados, e totalmente distante da qualidade do ensino e das condições de trabalho.

Traçar caminhos que partam da compreensão de educação como mercadoria e desembocam na privatização deste setor é transformar um direito fundamental em produto, e isso o Sinpro nunca permitirá.

 

Racismo
O reconhecimento facial funciona por meio de um sistema que utiliza algoritmos e softwares para mapear padrões nos rostos das pessoas. No entanto, se um sistema de reconhecimento facial é treinado principalmente com imagens de pessoas brancas, ele terá dificuldade em identificar rostos de pessoas negras ou de outras etnias.

O problema é agravado pelo fato de que as equipes responsáveis pelo treinamento desses algoritmos são, em sua maioria, compostas por homens brancos. De modo geral, há uma falta significativa de diversidade entre os profissionais que desenvolvem e treinam os algoritmos de reconhecimento facial. Como resultado, se os dados utilizados para treinar esses sistemas refletem desigualdades ou preconceitos raciais, os algoritmos tendem a aprender e reproduzir esses mesmos padrões discriminatórios.

O mesmo mecanismo adotado pela SEEDF nas unidades administrativas e regionais de ensino foi, inclusive, desencorajado por organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU). Isso porque uma série de estudos flagram a prática de racismo no reconhecimento facial.

A educação pública precisa de respeito. A fiscalização das atividades dos(as) servidores(as) das unidades administrativas e regionais de ensino pode buscar caminhos que dialoguem com a inclusão, com a democracia, com a saúde, com a qualidade de vida no trabalho e na vida. E é isso que o Sinpro defende.

 

O que diz a SEEDF
Na tarde da última sexta-feira (14/03), a Comissão de Negociação do Sinpro reuniu-se com a SEEDF para discutir os problemas gerados pela adesão aos Registradores Eletrônicos de Pontos com reconhecimento facial nas unidades administrativas e regionais de ensino. A Comissão apresentou diversas situações relatadas pelos(as) servidores(as) atuantes nas unidades central e intermediárias.

A SEEDF reafirmou que a implementação está em fase experimental e que possíveis problemas em relação ao registro não seriam empecilhos para o correto pagamento salarial. Segundo a pasta, também não há previsão de ponto eletrônico nas unidades escolares.

A Secretaria de Educação justificou a adesão ao ponto eletrônico a processo tramitado, de forma sigilosa, no Ministério Público de Contas. Nele, há supostas denúncias, demonstradas a partir de prints e ouvidores, sobre o não cumprimento adequado do horário de trabalho.

A Comissão de Negociação do Sinpro reforçou que a SEEDF cometeu um equívoco ao implementar o sistema de registro de ponto sem levar em conta as particularidades das atividades pedagógicas e administrativas desempenhadas tanto nas unidades centrais quanto, principalmente, nas regionais (intermediárias). Além disso, o sistema desconsidera o comprometimento e a dedicação que são marcas fundamentais dos(as) servidores(as) em seu cotidiano de trabalho.

Durante a reunião, o Sinpro ressaltou a necessidade de aprofundar o debate em Mesa de Negociação e ratificou o total desrespeito aos trabalhadores e trabalhadoras que atuam nestes espaços ao realizar a implementação do ponto eletrônico sem qualquer diálogo com o grupo.

Continuaremos a discussão e mobilização da nossa categoria contra este modelo de controle concebido de forma unilateral e antidemocrática.

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