Os absurdos ditos por Milton Ribeiro expressam um projeto para a Educação

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, tem chamado a atenção da grande mídia pela sua imensa capacidade de proferir absurdos indefensáveis. Porém, não nos enganemos: as malfadadas frases do ministro não são meros equívocos, nem consequência da sua falta de preparo e qualificação para ocupar o posto que ocupa. Elas refletem um projeto de país e de Educação muito bem definidos, e que sempre estiveram nos planos de Bolsonaro.

A Educação defendida por eles é uma não Educação. É excludente, direcionada a formar uma massa amorfa e acrítica para ser servil a um mercado de trabalho hostil e explorador, subordinado aos interesses internacionais e de uma mínima minoria, que é a elite brasileira. Sustenta princípios religiosos deturpados e seletivos – a solidariedade, por exemplo, não é um deles – e desqualifica a ciência como produtora de saberes, e ferramenta fundamental da construção de soberania. Tudo isso está presente nas posturas e nas falas tanto de Bolsonaro quanto de seu ministro. E, vale lembrar, os dois anteriores (Ricardo Véles e Abraham Weintraub) não agiam diferente.

Recentemente, Milton Ribeiro chocou todos e todas que têm apreço pela civilidade e pela democracia ao afirmar que algumas crianças com deficiência são “de impossível convivência”, e que “atrapalham” o aprendizado dos demais colegas. “Não queremos inclusivismo”, foi a frase que arrematou o conjunto do “raciocínio”.

As ideias do ministro Ribeiro sobre o tema expressam um profundo retrocesso, considerando o histórico recente. Em junho de 2007, sob comando do então ministro Fernando Haddad, um grupo de trabalho montado pelo MEC formulou uma nova política voltada para alunos com deficiência, com diretrizes sobre o atendimento educacional especializado (atividades complementares no contraturno escolar); acessibilidade na arquitetura e na comunicação; e parceria com a família e a comunidade.

Foi então que houve a implementação do Plano de Desenvolvimento da Educação; o decreto nº 6.094, em 2007, que estabeleceu como diretriz a garantia do acesso e da permanência dos estudantes com deficiência na escola; o decreto nº 6949, em 2009, que define a obrigatoriedade de um sistema de educação inclusiva em todos os níveis de ensino; e o de nº 7.611, de 2011, que institui o atendimento educacional especializado gratuito e transversal a todos os níveis de ensino.

No entanto, em 2020, o governo Bolsonaro editou o decreto 10.502/20, que procura desobrigar a rede pública de oferecer atendimento para esse público. A base do decreto era um documento que ia na contramão de todos os avanços anteriores, a “Política Nacional de Educação Especial”, que combatia as políticas de inclusão.

No DF, o movimento conquistou a manutenção dos centros de ensino especial como direito dos estudantes. A meta 4 do PDE (Plano Distrital de Educação) garante: “Universalizar o atendimento educacional aos estudantes com deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, independente da idade, garantindo a inclusão na rede regular de ensino e o atendimento complementar ou exclusivo, quando necessário, nas unidades de ensino especializadas”.

Para poucos

Em mais de uma ocasião, Ribeiro também manifestou sua triste concepção de universidade. “Não é para todos”, ele declarou, destacando que o país precisa de técnicos e não de pessoas com formação superior. Para ele e Bolsonaro, o lugar do Brasil é o de apenas importar conhecimento e tecnologia.

Ribeiro “embasa” sua fala justificando que “não adianta ter diploma se não tem emprego”, como se a geração de emprego e renda e a construção de políticas públicas para a soberania não fossem obrigação do governo do qual ele faz parte. Isso sem contar a grande falácia que se encontra nessa frase, afinal, qualquer pesquisa superficial aponta que o desemprego é menor entre aqueles e aquelas que cursaram uma graduação em relação aos que não tiveram essa oportunidade.

A exclusão também está presente no discurso do ministro no que se refere às questões de gênero e de orientação sexual. Em setembro de 2020, ele afirmou ao jornal O Estado de São Paulo que “o adolescente que muitas vezes opta por andar no caminho do homossexualismo [sic]” vem, algumas vezes, de famílias desajustadas”. Não contente em expressar seu preconceito de forma tão violenta, ele ainda foi além: reforçou o discurso de ódio dizendo que professores ou professoras trans não podem incentivar os estudantes a “andarem por esse caminho”.

Na época, o portal G1 entrevistou Beatriz de Souza Cruz, primeira diretora trans de uma escola estadual de São Paulo. “Deixo claro que eu, enquanto mulher e transexual, não influencio a orientação de ninguém. Isso não existe, justamente, porque não é uma escolha. Eu represento e deixo claro que há lugar no mercado de trabalho para todos, por exemplo”, afirmou ela na ocasião.

Desgoverno

Tudo isso somado à defesa dos demais absurdos do governo Bolsonaro, como o comprovadamente ineficaz “tratamento precoce” para Covid-19, e às mesmas tendências utoritárias de seu chefe. Vale lembrar que ele já deu declarações ameaçando intervir na elaboração das provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).

Como vimos, nada disso é por acaso, as falas não “escaparam” e nem foram descontextualizadas. Elas representam um projeto de país e, portanto, de Educação excludente, subordinado a interesses da elite internacional, visando a abandonar o país na periferia do sistema capitalista, e oferecendo seu povo à exploração. Tudo isso roubando do povo seus direitos e sua possibilidade de reagir.

A trama é perversa e está muito bem montada.