Na surdina e sem debate, Senado aprova reforma do ensino médio

 

O Senado aprovou na noite desta quarta-feira (8), por 43 votos a 13, a medida provisória (MP) que estabelece uma reforma no ensino médio.
O plenário rejeitou os dois destaques (propostas de alteração do texto) apresentados pela oposição. A matéria já passou pela Câmara. Com a aprovação no Senado sem mudanças, seguirá agora para sanção presidencial.
Vale lembrar que, inicialmente, a matéria só iria a plenário por volta do dia 3 de março. Numa manobra para evitar manifestações contrárias, os senadores incluíram a medida provisória na ordem do dia sem dar a devida publicidade que o assunto requer.
Dentre outras alterações, o texto aprovado aumenta a carga horária das atuais 800 horas anuais para 1.000 horas e divide o currículo entre conteúdo comum e assuntos específicos de uma das áreas que o aluno deverá escolher (linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica).
O relator da matéria, senador Pedro Chaves (PSC-MS), registrou que a reforma do ensino médio vem sendo debatida no Congresso desde 2012 e que a comissão mista que analisou a MP 746 promoveu nove audiências públicas sobre o tema.
Em desacordo com esta abordagem, a coordenadora do Finanças do Sindicato, Rosilene Corrêa, destacou que o conteúdo da reforma não responde às necessidades do país e dos estudantes, introduzindo de forma açodada e não planejada mudanças que afetam a estrutura do ensino público, os currículos e o próprio perfil do ensino médio no País. “O ensino médio que o governo Temer e  grande parte do parlamento impuseram à nossa juventude, na verdade, é uma retirada de direitos. Retiram de nossa juventude  o direito ao conhecimento previsto em lei. Sob uma propaganda enganosa, convencendo os estudantes de que eles têm autonomia para escolher o que mais lhes convêm, oferece-se menos – com vistas a prepará-los para um mercado de trabalho com pouca perspectiva e que vai retirar esses estudantes de seu percurso natural de chegar a uma faculdade, de fato conclui-la e ter uma carreira, competindo em igualdade de condições nesse mercado. Enfim, o Estado está se desobrigando a ofertar aquilo que está previsto e que é direito dos nossos estudantes”, enfatizou Rosilene.
Para o diretor de Finanças do Sinpro, Polyelton de Oliveira, a aprovação da MP representará um grande retrocesso no ensino público brasileiro. “O governo alega que o Ensino Médio não é atrativo e os jovens não estão estimulados. Para isso apresenta uma proposta que dilacera a educação e não aponta nenhuma melhoria nas condições de trabalho, na valorização dos professores e na criação de perspectivas para os alunos. Esse projeto é uma grande contradição se o colocarmos juntos com a PEC do limite de gastos: como o governo quer melhorar o Ensino Médio se por 20 anos os investimentos em educação estarão congelados? É impossível acreditar que esse governo pensa que vai contribuir com a melhoria do ensino agindo dessa forma”, ponderou.
Marta Vanelli, secretária de Formação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), classificou a aprovação da MP como a destruição de ensino médio brasileiro. “Além de privatizar, a medida prevê a educação a distância e desprofissionaliza os professores das disciplinas técnicas profissionais, vez que o texto aprovado manteve a autorização para que profissionais com “notório saber” possam dar aulas para cursos de formação técnica.
Regime Militar – No Senado, a senadora Fátima Bezerra (PT-RN) comparou a atual reforma promovida pelo governo Michel Temer com a reforma educacional promovida em 1971 pelo regime da ditadura militar. Segundo a senadora, o governo militar fez a reforma sem debates, impondo a reformulação. Ela registrou que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já deu parecer apontando falhas na proposta. Segundo ela, Janot argumentou que medida provisória não é o instrumento adequado para implantar mudanças estruturais em políticas públicas.
Também contrárias à MP, as senadoras Ângela Portela (PT-RR) e Regina Sousa (PT-PI) reforçaram as críticas. Para a primeira, o governo não promoveu debates democráticos com professores, alunos, especialistas ou sociedade em geral. Ângela Portela disse que as mudanças prejudicarão a formação geral de qualidade. Disse ainda que o governo não pretende aumentar investimentos em livros didáticos, transporte escolar e merenda. Regina Sousa também afirmou que a proposta foi pouco debatida e que os alunos de escolas públicas terão formação muito inferior aos estudantes do setor privado. Para ela, a reforma do ensino médio aprofundará a precariedade do ensino público.
A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) posicionou-se contrária à aprovação por entender que a proposta foi pouco debatida. E questionou como municípios e estados financiarão escolas em período integral. A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) criticou a MP e disse que as mudanças desvalorizam o magistério e precarizam a situação do trabalho do professor, ao prever o fim da aposentadoria especial da categoria. Disse ainda que o governo engana a população, pois aumenta as exigências para a educação, mas retira recursos do setor.
Na visão do senador Humberto Costa (PT-PE), a MP é “absolutamente nefasta”. Ele apontou que um assunto tão complexo como uma reforma do ensino médio deveria ser debatido com mais profundidade, e não por meio de uma MP — que tem um rito mais rápido.
Mais críticas – De acordo com a CNTE, a tão propalada ajuda federal às escolas de ensino médio integral rebaixa a política dos governos Lula e Dilma, pois não é universal. Ao contrário, parece mais um projeto piloto, na medida que poderá atender até 500 mil estudantes (cerca de 6% do total das matrículas), desde que haja recursos suficientes para tanto. Ou seja, a MP 746 está subordinada à Emenda Constitucional 95, oriunda da PEC 55 do ajuste fiscal.
Diante da concepção do ajuste fiscal, o eixo central da reforma – para além do ataque à profissionalização do magistério e ao currículo universal voltado à formação integral dos estudantes – está na privatização do ensino médio. A lei permite que os sistemas públicos firmem parcerias, inclusive na modalidade a distância, com a iniciativa privada para a oferta da parte diversificada do currículo, em especial na modalidade de educação técnica-profissional. E diante dessa perspectiva, o Estado reduz sua obrigatoriedade de oferta escolar aos conteúdos da BNCC, podendo delegar aos empresários o restante da formação, também por meio de repasses de verbas públicas para as escolas privadas, subordinando novamente a educação brasileira aos ditames das agências multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial.
“A CNTE manterá ação junto ao STF para que seja julgada a ação direta de inconstitucionalidade nº 5604, que visa suspender os efeitos da MP 746, mesmo depois de a mesma ser convertida em lei. A referida ADI já conta com parecer favorável da Procuradoria Geral da República, podendo, assim, suspender no todo ou em parte a futura lei que regerá o ensino médio no país”, afirmou a Diretoria Executiva da Confederação em nota.
Com informações da Agência Senado e CNTE