Mulheres educadoras debatem democracia, sindicalismo e IA em Brasília
Nos dias 20 e 21 de setembro, Brasília sediou o Encontro Regional da Rede de Trabalhadoras da Educação, promovido pela Internacional da Educação América Latina (Ieal) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).
O evento reuniu mulheres das Américas Latina, Central e do Norte, África e Europa para discutir a realidade dos sindicatos, as condições de trabalho, a violência política e de gênero, os impactos da Inteligência Artificial (IA) na educação e as estratégias de fortalecimento da base sindical.
Abertura: mulheres e múltiplas jornadas
Na abertura, a presidenta da Associação Nacional de Educadores e Educadoras da Costa Rica (ANDE), Gilda Montero, destacou os desafios das mulheres diante da sobrecarga das rotinas.
“As mulheres não recebem uma remuneração adequada, apenas a do trabalho formal, mas o trabalho doméstico e de cuidados não é remunerado. E sabemos que as mães se sacrificam mais. Isso precisa mudar. É importante respeitar as diferenças que temos, pois elas são uma oportunidade para trazer ideias diversas e levá-las adiante. Por isso, é tão importante o papel da mulher nos sindicatos”, afirmou.
A secretária de Organização Educacional e Sindical da Federação Colombiana de Trabalhadores da Educação (Fecode), Isabel Olaya Cuero, ressaltou a relevância da presença masculina no encontro como sinal de apoio à luta pela igualdade.
“Hoje, nós temos alguns homens aqui e isso é importante para mostrarmos a nossa força. Nós mulheres não somos apenas importantes nos sindicatos, somos imprescindíveis. Se temos mulheres nos sindicatos é porque lutamos por isso. Na Colômbia, já temos quase metade da diretoria feminina, eu acredito que em breve estaremos em número igualitário e isso mostra a mudança que começamos”, destacou.
Já a presidenta da Ieal, Sonia Alesso, lembrou das dificuldades enfrentadas por professoras que também são mães, e como isso impacta a ascensão a cargos de liderança.
“Quando uma mulher, professora, tem um filho e ele fica doente, quem falta é a professora. Não é o homem, o professor. Elas trabalham mais, têm sobrecargas, e isso dificulta chegar aos cargos de liderança”, explicou.
Sábado, 20 de setembro
Na parte da manhã, ocorreu uma análise coletiva sobre estratégias de organização e mobilização de mulheres em sindicatos em contextos hostis, com a participação de representantes da América Latina, África, Estados Unidos e Europa. Foram relatadas experiências e conquistas no fortalecimento da base sindical e no crescimento da participação feminina.
À tarde, o foco voltou-se para a tecnologia. A conferência sobre regulação estratégica da Inteligência Artificial no setor educacional foi conduzida por Sofía Scasserra, especialista em regulação de IA e negociação coletiva, além de diretora do Observatório de Impactos Sociais da IA da Argentina (OISIA).
“A digitalização nos permitiu chegar em lugares remotos, mas também prejudica quem não tem acesso, em economias desiguais, com custos elevados. A tecnologia precisa estar ao alcance de todos, ser transparente. Hoje, ela é mal interpretada, faltam leis, há uma falsa dicotomia entre novidade e transparência”, disse Scasserra.
Ela também chamou atenção para a dimensão política da tecnologia:
“Toda tecnologia é um espaço de disputa política, com interesses. Nós, sindicalistas, temos uma visão do mundo com inclusão, igualdade, valores que o fabricante da tecnologia não considera muitas vezes. É preciso entender que essa tecnologia não é neutra, tem gênero, segue os vícios da sociedade e não vai solucionar tudo. Ela vai ajudar, mas depende para o quê foi criada e precisa ser acessível a todos.”
Depois da exposição, as participantes se dividiram em grupos para propor estratégias sindicais e demandar regulação em três áreas prioritárias:
- condições laborais e proteção das trabalhadoras e trabalhadores;
- uso da inteligência artificial na educação;
- violência política contra as mulheres, intensificada por ferramentas digitais.
Domingo, 21 de setembro
O domingo iniciou com uma análise coletiva sobre democracia e sindicalismo, abordando duas questões centrais: como os movimentos de mulheres podem ser motores de mobilização em defesa dos sindicatos e se os sindicatos estão preparados para integrar a agenda de direitos das mulheres como parte essencial da luta da classe trabalhadora.
Na sequência, foi apresentada uma proposta de atividades formativas para 2026, envolvendo comunicação, formação sindical e negociação coletiva. Outras prioridades levantadas incluíram a valorização das professoras negras na América Latina, ações de combate à violência política de gênero e maior incentivo à participação de jovens lideranças.
Ainda pela manhã, foi exibido um vídeo sobre a educação em Gaza. O material trouxe relatos de destruição de escolas e a necessidade de apoiar docentes em contextos de guerra.
A secretária-geral da CNTE, Fátima Aparecida da Silva, emocionou-se ao comentar o tema:“Em meio a tanto desastre, a escola era um lugar de alegria, mas esses espaços já não existem. O que as pessoas devem fazer é apoiar a luta dos docentes, mas também pedir a paz para o mundo. Hoje, viver bem não é suficiente, é preciso pensar nos Direitos Humanos para todos”, reforçou.
Também foi apresentada a 5ª Conferência de Mulheres da Internacional de Educação, prevista para 2026, em um espaço representativo da diversidade feminina. A secretária da CNTE sugeriu convidar referências como Angela Davis, que aborda a violência política contra mulheres, além de parlamentares de diferentes países para ampliar os debates.
O encontro foi encerrado ao meio-dia, seguido de almoço coletivo, com um chamado à mobilização em defesa da democracia e da educação pública. Entre as ações previstas, destacou-se o ato “Domingo é na Rua, contra a Anistia e contra a PEC da Impunidade”, realizado em todo o país no mesmo dia, 21 de setembro.
Fonte: CNTE