Lei de Meios: Sanção é ponto de partida para democratizar meios de comunicação

Nova lei beneficia liberdade de expressão, mas aplicação tendenciosa impede transformações necessárias
A Lei de Meios argentina democratiza os meios de comunicação em favor da liberdade de expressão?
SIM
O modelo de democracia de uma sociedade reproduz, entre outros aspectos, as condições de participação e acesso da cidadania à comunicação e à cultura. Isto é, as sociedades democráticas são formadas, ainda que não totalmente, por comunicações democráticas.
É complexo responder se a Lei Audiovisual argentina democratiza os meios de comunicação em benefício da liberdade de expressão, porque, como se verá, a sanção de uma norma não resolve: é apenas um ponto de partida de um processo grande.
Por diversas razões (sobre as quais ainda não se discute em profundidade), desde 2008 o governo de Cristina Fernández de Kirchner e os grandes grupos de comunicação (fundamentalmente o Grupo Clarín) mantêm um enfrentamento muito visível, cujo ponto alto aconteceu a partir da aprovação da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual (LSCA) 26522/09, que estabelece limites para a concentração de propriedade dos meios e propõe novas condições para a produção de conteúdos audiovisuais.
No texto da norma se reconhece a capacidade de administrar os meios de comunicação de três tipos de atores: o Estado, o ator privado com fim lucrativo e o ator privado não comercial, caracterizado de modo amplo e inclusivo. A reserva de 33% para este último setor, em todos os canais e todas as frequências, é o avanço mais relevante, somado aos argumentos que sustentam tal decisão (sua possibilidade de autonomia em relação aos poderes econômicos e políticos).
A isto se pode somar a possibilidade de outorgar licenças de modo direto a emissoras de baixa potência em regiões em que não há conflito, o que poderia acelerar o processo de inclusão de emissoras comunitárias. Além disso, a inclusão de novos limites para a concentração e o avanço na estrutura (não ainda em sua administração) dos organismos de aplicação e controle (Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual, Conselho Federal, Comissão Bicameral) são aspectos destacáveis.
Desde a sua sanção, a LSCA nunca foi plenamente aplicada. Em 2009 e 2011, primou a reação dos grandes grupos concentrados na tentativa de frear a lei e a permeabilidade de alguns setores jurídicos.
Em segundo lugar, houve a falta de decisão integral do governo e, em último lugar, houve o papel exercido pela maioria dos partidos de oposição, que tomaram como própria a agenda dos grupos concentrados e deslegitimaram a LSCA com suas ações.
De 2011 adiante, os fatores se alternam, com destaque para a redução que o governo realizou da norma original no “pacote Clarín”, manteve-se o acionamento dos setores jurídicos atrasando as decisões sobre as medidas cautelares.
Enquanto isso, a oposição mudou sua estratégia, mas foi incapaz de gerar efeitos, como constituir a Bicameral e nomear seus diretores na AFSCA (Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual).
É possível sustentar, então, que a nova lei democratiza os meios de comunicação em benefício da liberdade de expressão em seu texto, mas sua aplicação tendenciosa impede as transformações concretas de que o sistema necessita.
(*) Santiago Marino é diretor do mestrado em Indústrias Culturais na Universidade Nacional de Quilmes, docente dos cursos de graduação e pós-graduação na Universidad Nacional de Quilmes, Universidad de Buenos Aires, e Universidad del Salvador.

Escrito por: Santiago Marino (*)
Fonte: Ópera Mundi
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A batalha judicial sobre a aplicação da LSCA (Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual) – a Lei de Meios – chegou ao fim nesta terça-feira (29/10) na Argentina. A Suprema Corte do país, com seis votos a favor e um contra, considerou constitucional todos os artigos fundamentais para a reconfiguração do espectro radioelétrico – alguns eram contestados pelo Grupo Clarín.