GDF não repassa recursos, abandona e sucateia escolas de tempo integral

Metade das escolas que aderiram ao Projeto Piloto de Educação Integral em Tempo Integral  (Proeiti) nos últimos anos desistiram dele. Das 46 instituições que até 2014 haviam adotado essa modalidade de ensino, apenas 23 ainda resistem, nesses quase dois anos do governo Rodrigo Rollemberg (PSB), à falta de investimento financeiro. O Proeiti é uma modalidade de educação integral em que o estudante fica 10 horas na escola e faz todas as refeições na instituição, que está em risco de extinção no Distrito Federal.
Diferentemente do que prometeu durante a campanha eleitoral, o governador Rollemberg não amplia essa modalidade de ensino e não repassa os recursos financeiros para viabilizar as poucas escolas que aderiram ao projeto. Ao contrário, a cada dia ele dificulta ainda mais a continuidade do Proeiti com abandono e sucateamento. Com isso, aprofunda a ilegalidade do seu governo porque contraria frontalmente os Planos Nacional e Distrital de Educação (PNE e PDE), leis em vigor no país e no Distrito Federal. A situação é tão séria que foi debatida em audiência pública, nessa segunda-feira (24/10), na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). A atividade foi convocada pelo deputado distrital Wasny de Roure (PT).
Roure enfatizou a necessidade de o Governo de Brasília garantir o cumprimento das metas previstas no PDE, criado pela Lei nº 5.499/2015. O distrital explicou que cabe ao DF “oferecer educação em tempo integral em no mínimo 60% das escolas públicas, de forma a atender a pelo menos 3% dos estudantes da educação básica, por meio da ampliação de no mínimo 10% ao ano da matrícula de educação integral nas unidades escolares já ofertantes, até o último ano de vigência do Plano”.
Na audiência, que contou com a participação de diretores (as), professores (as), estudantes e lideranças sindicais do Sinpro-DF, foi denunciada a falta de tudo, até mesmo de alimentos e outros instrumentos primordiais e necessários à permanência dos(as) estudantes na instituição durante 10 horas seguidas. Pais de estudantes da Escola Classe 05 (EC 05), do Cruzeiro, contaram que há mais de 20 dias a escola estava sem alimentos para o almoço. A diretora disse que havia solicitado os mantimentos, mas recebeu a informação da Secretaria de Estado da Educação do Distrito Federal (SEEDF) de que as licitações do governo estão suspensas.
De acordo com o cardápio fornecido pela SEEDF, nas segundas-feiras deveria ser servido almoço com arroz, feijão, macarrão, frango ao molho com coxa e sobrecoxa e verduras para as 172 crianças de 6 a 10 anos, todas do ensino integral que passam 10 horas na escola.  Contudo, no dia 24 de outubro, segundo denúncia do DF TV, a escola tinha apenas feijão doado pelos pais e uma quantidade mínima de arroz que só dava para servir naquele dia. Não havia carne fornecida pelo governo. Os pais que tinham melhores condições financeiras fizeram uma “vaquinha” e a compraram.
A diretoria da EC 05 pediu doação de arroz, feijão, macarrão, extrato de tomate e alho para não deixar as crianças com fome. Essa e outras situações foram detectadas em todas as escolas de tempo integral e denunciadas na audiência pública. Desde falta de alimentos até o uso indiscriminado e exagerado de alimentos enlatados e industrializados, que têm alta rejeição entre as crianças. “O governo não pode deixar faltar itens básicos para as principais refeições dos(as) estudantes que permanecem na escola no período integral, até porque, em muitos casos, a única refeição que as crianças têm por dia é a que é oferecida na escola”, alerta Samuel Fernandes, diretor de Imprensa e Divulgação do Sinpro-DF.
O diretor acredita que “o governo precisa rever com urgência a utilização de alimentos enlatados nas escolas de tempo integral, pois pode causar sérios danos à saúde dos estudantes. Feijão enlatado, quando tem, é apenas um exemplo do absurdo que é servido, pois temos grandes produções de alimentos naturais no DF, mas, mesmo assim, o governo prefere servir ração, ou seja, alimentos industrializados que comprometem a saúde das crianças”.
Na abertura da audiência, estudantes da EC 05 apresentaram trabalhos feitos com latas de feijão, do projeto de reutilização de lixo reciclável desenvolvido na escola, e também um jogral sobre a situação de precarização da escola. A diretoria do CAIC de Brazlândia, Ana Maria Santiago, que também integrou a Mesa e representou as escolas do Proeiti, denunciou a situação atual e entregou um documento com uma lista de demandas dessas escolas.
No documento, destaque para vários problemas, como, por exemplo, o do transporte escolar, do lanche e da refeição, do PDAF e da coordenação pedagógica. As escolas do Proeiti pedem ao governo que priorizem coordenadores para esse tipo de escola no começo do ano porque têm um trabalho diferenciado.
Regina Pinheiro, diretoria de Política Educacional, representou o sindicato na Mesa da audiência pública e disse que a educação do DF está nessa situação porque o governo não cumpre as diretrizes dos PNE e PDE. E denunciou também a redução dramática do número de escolas de tempo integral. “O Proeiti começou com 23 escolas e aumentou mais 23, somando 46 escolas de período integral. Hoje, menos de dois anos de gestão Rollemberg, fechou a metade. As escolas não eram obrigadas a adotar a modalidade, mas muitas aderiram ao programa contando com a promessa do governo de assegurar a sustentabilidade para execução do projeto”,  lembra Regina.
Ela diz ainda que os pais e mães gostam do projeto porque é uma forma de assegurar a eles e elas o ingresso no mercado de trabalho e a saída de muitas famílias da situação de vulnerabilidade.  “As próprias escolas viram a necessidade de oferecer essa modalidade porque é uma forma também de assegurar justiça social, mas, no meio do caminho, apareceram estas dificuldades, uma delas é a do PDAF. Muitas vezes o repasse não é feito no valor adequado, suficiente para uma escola com turno de 10 horas”, informa a diretora do Sinpro-DF.
A situação é ainda mais grave no Centro de Ensino Fundamental 215 (CEF 215), de Santa Maria, que atende a mais de 500 estudantes. Nessa escola, professores e professoras tem discutido a precarização da escola e a possibilidade de desistirem do Proeiti por causa das dificuldades. Todos os problemas relatados no documento apresentado na audiência pública fazem parte do cenário do CEF 215 de Santa Maria.
“Falta de apoio e estrutura e de todo o tipo de problemas relacionado à falta de recursos financeiros. Desde os recursos do PDAF até falta de mantimentos para as refeições e até banheiros. O PDAF chega pela metade e não sustenta o número de estudantes que temos. Nossa escola é bonita, porém, falta de tudo, até banheiro”, afirma Jairton Souza Santos, professor de Atividades do CEF 215.
Os(as) professores(as) vêm debatendo com a comunidade e com o Conselho Escolar, desde julho deste ano, a possibilidade de acabar com o período integral. Já foi feita até reunião com os pais, os quais se mostraram surpresos com a decisão, uma vez que o governador Rollemberg prometeu, durante a campanha eleitoral, ampliar ainda mais as escolas de educação integral no DF.
“A possibilidade de mais um fechamento de escola de tempo integral, que é o caso do CEF 215 de Santa Maria, mostra o descaso do GDF com a educação pública do DF. E mostra também o descuido dele com uma comunidade extremamente carente, que precisa dessa modalidade de ensino. O argumento que Rollemberg usa para justificar a incompetência e o descompromisso dele com a educação, de que a comunidade escolar, sobretudo os profissionais do magistério, é que são responsáveis pelo fechamento, é um absurdo porque as escolas que têm abandonado esse tipo de atendimento o tem feito porque o GDF, simplesmente, não assegura os recursos mínimos para que a educação integral funcione”, afirma Cleber Soares, diretor de Imprensa do sindicato.
Soares explica que o governador usa nas escolas de tempo integral a mesma lógica que vem imprimindo desde o início do governo no serviços públicos: “A lógica do sucateamento da educação, dos serviços públicos, para no passo seguinte efetivar a terceirização. Ele faz isso com a Saúde e tem tentado fazer com a Educação. E, no final das contas, quem mais sofre com essa política de desconstrução do serviço público é a maior parte da população do DF, sobretudo, as comunidades carentes e a da periferia, que precisa da proteção do Estado forte e de serviços públicos e gratuitos de qualidade”.
O diretor afirma que a diretoria colegiada do Sinpro-DF vai continuar brigando para que a comunidade escolar e os profissionais do magistério público do DF sejam respeitados porque, “afinal de contas, a educação pública e gratuita seja, talvez, o único caminho para os filhos e filhas da classe trabalhadora terem um futuro melhor, de mais oportunidade no mercado de trabalho e na sociedade. Por isso exigimos do Governo do Distrito Federal: respeito à educação, aos profissionais do magistério público e à comunidade escolar”, finaliza.
Confira as imagens da audiência pública: