Golpistas vestem farda por cima da toga

Fernando Frazão/Agência Brasil

A narrativa do combate à corrupção que levou milhares às ruas, legitimando o golpe de 2016 e a perseguição política em curso, vem cedendo lugar ao discurso, não menos distorcido, do combate ao crime organizado. Basta ligar a TV, é notório o esforço em tornar o crível o inacreditável: a existência, 30 anos após decretada a Constituição de 1988, de um Estado sob intervenção militar.

O governo militar no Rio de Janeiro seria impensável sem a colaboração da mídia, em especial, das Organizações Globo. Sem pudores, a mídia agora veste a farda em cima da toga e, novamente, trabalhando com os preconceitos da classe média, cria o ambiente para a legitimar a violência e o uso da força neste conturbado ano eleitoral.
Na mira, obviamente, não estão os traficantes, mas a sociedade civil. Estivesse o alvo nos primeiros, os primeiros presos seriam os traficantes da elite brasileira, aqueles que detêm conta no estrangeiro e assento garantido no Parlamento. Todos sabemos: não é mais violência, muito menos intervenção militar nas comunidades que resolverá o problema, mas a presença de um Estado que lute a favor e não contra o povo, garantindo dignidade e cidadania para todos.
Caberia, portanto, aos veículos de comunicação colocar esse debate em pauta. Caberia, obviamente, não fossem eles o aparato de um partido político, comandando por uma elite disposta a tudo para impor seus interesses e garantir seus privilégios.
Crime organizado se combate com aumento e não diminuição de renda; com emprego e não desemprego; com direitos e não a perda deles; com dinheiro investido em educação, segurança, cultura, lazer, saúde e não drenado no jogo da especulação financeira.
Combate ao crime organizado se faz com Estado efetivo e não com o estado mínimo, cada vez mais mínimo, de Temer e a corja que o colocou no poder. Como falar em combate ao crime organizado se milhões e milhões vem sendo, brutalmente, destituídos de direitos básicos, empurrados para a pobreza e para a miséria?
Mais do que nunca, precisamos estar atentos e desmontar a narrativa da direita, lembrando que “a aventura do golpe, cujo fracasso é retumbante em seu sentido mais profundo e amplo, e cujas consequências à política, à economia, à sociedade e ao sentido de ´Nação` são criminosas, já demonstrou que não tem limites”, como avalia Francisco Fonseca em artigo sobre a intervenção no Rio de Janeiro (leia a íntegra aqui).
O mesmo tema é tratado por Juarez Guimarães em “Ditadura neoliberal e os caminhos para vencê-la”. “Em seu momento de menor legitimação e dificuldade de coordenação, a coalização golpista trilha o caminho da violência judicial contra Lula e, agora, militariza seus movimentos e instituições”, afirma.
Regredimos no tempo? O ex-diretor-executivo do FMI, Paulo Nogueira Batista Jr. responde essa pergunta, ao analisar os paralelos entre o que vivemos hoje e  a crise de 1950 a 1964, quando os agentes políticos que se diziam “liberais” (antes a UDN, agora o PSDB) optaram por “sequestrar o processo político”, cientes de que jamais venceriam as eleições pela via democrática (Confira aqui a entrevista).
Eleições que, neste 2018, destaca Eric Nepomuceno, “são, sem dúvida, as de mais difícil previsão desde 1989”, afinal, “nem o grupo instalado no poder, nem o sacrossanto mercado financeiro, nem o conglomerado oligopólico de comunicação e menos ainda o grande empresariado têm um candidato viável para manter as coisas tal como estão” (leia mais aqui).
A democracia brasileira está numa encruzilhada”, avalia o professor Boaventura de Sousa Santos, ao traduzir a sensação de perplexidade e impotência que, certamente, muitos de vocês sentem neste momento. Afirma Boaventura:
“A perplexidade é enorme e ameaça ser paralisante durante algum tempo” por quatro razões principais: a conjuntura eleitoral, o Brasil profundo, a intervenção imperial e a “dificuldade das forças democráticas, sobretudo de esquerda organizarem uma estratégia de resistência e de alternativa eficaz e com credibilidade”.
Cientes de que os ataques do neoliberalismo contra a democracia não acontecem apenas no Brasil, recomendamos a leitura de “Livros que apontam rumos” de Ladislau Dowbor, com indicação de oito obras (publicadas no exterior) de grande valia para termos a dimensão global das transformações que tanto nos afetam. E, obviamente, convidamos vocês a acompanharem o conteúdo internacional que Carta Maior vem disponibilizando em sua página.
Confiram nosso Clipping Internacional, com síntese de manchetes e/ou reportagens dos principais jornais do mundo (veja o clipping de 19 de fevereiro e 20 de fevereiro). Não deixem de acompanhar, também, as editorias “Cartas do Mundo”, nesta semana com cartas de Buenos AiresMontevidéuParisCaracasLimaBerlimBogotá e La Paz; e “Pelo Mundo” com reportagens sobre o Canal Fox News, a reforma tributária dos Estados Unidos e o martírio dos deportados mexicanos, entre outras.
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Joaquim Ernesto Palhares
Diretor da Carta Maior