"Estou ferido por dentro e por fora", diz docente atingido no olho no Paraná

Uma semana tinha se passado desde o que aconteceu. “Como o senhor se sente?”. “Não existe palavra para definir aquilo lá”. Repito a pergunta, e ele desabafa: “Eu me sinto muito machucado por dentro e por fora”.
O professor de química Lúcio Roberto Vaisvila, 58, foi uma das centenas de pessoas que ficaram feridas no confronto entre policiais militares e professores no Centro Cívico, em Curitiba, no dia 29 de abril. Ele foi atingido por uma bala de borracha no olho.
Vaisvila recebeu a reportagem do UOLna casa de um parente no bairro residencial de Vista Alegre. Veio de Cianorte (a cerca de 500 km da capital), sua terra natal, para uma consulta médica na capital.
“O tiro pegou na testa e bateu no olho. Eu perdi a visão totalmente. Hoje está bem comprometida, está uns 20% ou 30%”, descreve. Ele mostra os três colírios diferentes que tem usado na esperança de voltar a enxergar com o olho esquerdo.
“Eu tenho medo de ficar sequelas porque eu dependo da minha visão para trabalhar. Eu só sei fazer isso. Se ficar sequela, não vou poder ensinar porque eu não estou enxergando letra nenhuma.”
“O senhor se imagina fora de sala de aula?”. Os olhos do professor se enchem de lágrima imediatamente. “Não, não imagino; não dá para imaginar. Eu gosto daquilo que eu faço, é uma paixão, mesmo sendo professor de química”. Ele ri. “Tem de gostar muito porque você vai contra uma maré que não é brincadeira.”
Exames revelaram que não houve descolamento da retina nem perfuração do globo ocular. Professor há quase 30 anos, ele nunca imaginou passar por essa situação. “Não dá para imaginar, nem na pior de todas as hipóteses. Nossa profissão é avessa às armas, à violência. A  nossa vida é repassar conhecimento, é construir o cidadão para que ele faça um mundo melhor.”
“O senhor sente algum tipo de revolta?”. “Não tenho sentimento de revolta porque eu estava lutando pelos meus direitos. Mas a agressão que o Estado praticou eu não vou perdoar. Nenhuma forma de agressão tem justificativa”.
(Do Uol)