Entrevista | “O tema dos impostos parece de difícil compreensão, mas é fundamental socializar esse debate”
Leia abaixo a entrevista com Rosilene Corrêa, professora aposentada da SEE-DF e dirigente da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), sobre a taxação dos super ricos prevista no PL 1087/2025. Rosilene representa a CNTE na Campanha Tributar os Super Ricos, que reúne mais de 70 entidades nacionais. A Campanha tem como personagem central a menina Niara, criada pelo cartunista Aroeira.

O PL 1087/2025, além de isentar e garantir desconto no imposto de renda de fatia expressiva da população, também determina que essa iniciativa será sustentada por outra: a alíquota mínima de 10% para aqueles que recebem a partir de R$ 50 mil por mês. É uma vitória da luta popular?
Rosilene Corrêa: Com certeza. Diversos setores da sociedade estão, há muito tempo, reivindicando impostos progressivos. Do jeito que é hoje, as pessoas de menor renda e a classe média sustentam os privilégios de milionários e bilionários, e isso é descarado.
Taxar os super ricos e seus superlucros é primordial para aliviar a carga tributária de quem ganha pouco e tem que manter a família. É primordial também para aumentar a arrecadação da União, para que o governo possa investir em políticas públicas de inclusão, de combate à desigualdade, de garantia de uma vida digna para o nosso povo, que tem direito a saúde, educação, moradia, alimentação saudável, lazer.
Além disso, essa vitória – a aprovação do PL 1087/2025 na Câmara – veio num contexto de vitórias importantes, como foi a derrota da PEC da Blindagem e os avanços no diálogo com os EUA pelo fim do tarifaço. O Brasil manteve uma postura digna e soberana, que certamente sairá vitoriosa.
Você falou da taxação dos superlucros. O estabelecimento de uma alíquota de imposto de renda sobre lucros e dividendos é uma medida inédita e que era necessária havia muito tempo.
Rosilene Corrêa: Muito tempo! Pra se ter ideia, entre 46 membros e prováveis futuros membros da OCDE [Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico], só 3 países não taxam lucros e dividendos: Brasil, Estônia e Letônia. Essa informação é da Agência Câmara.
A proposta é reter na fonte um imposto de renda de 10% sobre lucros e dividendos de quem recebe mais de R$ 50 mil por mês de uma mesma fonte pagadora. Para se ter uma ideia, esse imposto, na Dinamarca, não é de 10%, é de 42%. No Reino Unido são 39%.
O “problema” que restou é que o setor do agronegócio manteve seus privilégios. Seriam mais R$ 3 a 4 bilhões arrecadados, mas o lobby da bancada ruralista é fortíssimo. Em algum momento será necessário encarar essa questão.
O Sinpro e a CNTE aderiram prontamente à campanha pela taxação dos super ricos. Na sua opinião, qual o papel da Niara nessa campanha?
Rosilene Corrêa: A Niara nasceu para responder a um desafio que a gente tinha, e, na verdade, continua enfrentando, que é o de aproximar esse debate da população. Precisamos dialogar com aqueles e aquelas que serão alcançados pela isenção, por exemplo.
O tema dos impostos, muitas vezes, é tratado em termos técnicos, que dificultam a compreensão e fazem parecer que é uma coisa distante da vida das pessoas, do dia a dia. Mas é o contrário, é muito próximo, é decisivo na vida de todo mundo. É fundamental socializar esse debate. Então, nós pensamos em ter uma personagem que pudesse falar de forma a ser facilmente compreendida.
A Niara aborda temas de interesse da população, palpáveis, sempre fazendo a conexão com a tributação dos super ricos. O objetivo é mostrar que todo mundo pode saber do que se trata, o que é imposto, o que um paga, o que outro não paga.
O Aroeira, que é um grande chargista brasileiro, é central na campanha, é quem cria as tirinhas da Niara.

Agora, o PL vai para o Senado e, depois, para sanção do presidente Lula. Alguma expectativa quanto a essa tramitação?
Rosilene Corrêa: Nós acreditamos que os parlamentares entenderam o recado das ruas. Esse tema está bastante em evidência e quem votar contra vai se expor muito. Por isso, a expectativa é de que o projeto seja aprovado sem obstáculos no Senado, e, na sequência, sancionado pelo presidente Lula.
Quais os próximos passos daí para frente?
Rosilene Corrêa: Em se consolidando essa vitória importantíssima da isenção do IR pra quem ganha até R$ 5 mil, do desconto pra quem ganha até R$ 7,5 mil e da tributação dos super ricos, é a hora de fortalecermos a campanha contra a escala 6×1.
Derrotar esse modelo de jornada de trabalho é uma vitória das classes populares e, sobretudo, das mulheres, que infelizmente ainda concentram a responsabilidade pelo trabalho doméstico e de cuidados, além do trabalho fora de casa. Descanso semanal de um único dia precisa urgentemente ser abolido das nossas leis trabalhistas.
