Ensino Médio ou medieval?

Como educador eu sempre clamei pela questão ideológica dentro da educação e das escolas: um crime humano e social sem precedentes cometido todos os dias desde que as tais escolas existem. Mas, como sempre eu sou “aquela voz que clama no deserto.” Isto fere e as pessoas não querem ouvir o que fere, elas não querem abandonar o que imagina que seja a sua própria zona de conforto, com tudo respeito, mas muito em especial, os educadores.
Nossas escolas são frias, inumanas, duras, ruins, chatas, mesquinhas. Há no inconsciente do âmago da educação (chefiada pela Raquel Teixeira, por exemplo, em Goiás) um desejo incontido não de educar, mas de adestrar pessoas para que o capitalismo e o consumismo que aí temos e que já deram mais do que suficiente provas de que precisam mudar, continuem funcionado do mesmo modo, ou seja, concentrando poder e riqueza nas mãos de poucos, cujos representantes diletos administram a educação, e, por consequência, as escolas, e, logicamente, socializando a fome, a miséria, o desemprego, a crise.
É aquela velha história do não se faz omeletes sem quebrar os ovos, sem gerir conflitos, quebrar zonas de conforto. Enfim, se não se pensar em diminuir – drástica e profundamente – a concentração da riqueza, nada poderá ser feito e as crises, os problemas e os conflito se saturarão até pontos insustentáveis – onde, na prática quase já chegamos.
A mudança proposta do Ensino Médio, promovida pelo Governo Federal e operacionalizada pelo MEC nada mais é do que uma prova inequívoca disto. Mexe, remexe, fazem-se pequenas modificações superficiais aqui e ali, para se evitar o que é mais do que necessário: UMA MUDANÇA POLÍTICA, FILOSÓFICA, PSICOLÓGICA, REAL E PROFUNDA – como sempre digo – UMA AUTÊNTICA MUDANÇA DE PARADIGMAS. Mas isto, estes sacanas não fazem e a classe dos trabalhadores da educação ingênua e incauta, apoia, aplaude, e, mais uma vez, acredita. Educação e escolas como aí estão não têm a menor chance de contribuir minimamente que seja para o que tanto sonhamos: as mudanças, as transformações pacíficas e produtivas da sociedade, gerando, o que é muito mais do que necessário, uma qualidade de vida plena e aceitável para todos.
Não temos, que, para isto, fazer pequenas e pontuais mudanças no currículo, trocando seis por meia dúzia, deixando muitas coisas até piores. Não precisamos e nem devemos falsear a democracia, dando ao estudante adolescente a sensação de autonomia e da escolha, quando na verdade, tudo isto não passa de uma falseta. É preciso dar voz e vez a quem nunca teve – o estudante. Fundir novos processos com liberdade, escolhas, ludicidade, alegria, prazer. Redistribuir o poder, escutar as pessoas e ensinar e aprender o que, de fato, elas precisam para viver melhor, para ganharem a vida com dignidade e para que o viver valha a pena.
Precisamos muito mais do que discursos bonitos e de secretários de educação menos preocupados com burocracia e controles para maquiar o funcionamento e a aparência das escolas e mais preocupados com a qualidade da educação e do ensino que se processam dentro delas. É preciso, finalmente, que o aluno goste da escola e que queira frenquentá-la. Que tenha prazer nisto e que sinta que ali está para melhorar a sua vida e não para aprender táticas e fórmulas para ser um escravo moderno, subserviente e calado.
Precisamos de uma educação e de uma escola para ajudarem a modificar o mundo, a vida, as relações humanas para que todos vivam com dignidade e não, como tem sido o contrário: adestrando as maiorias para que elas se conformem com nada, para que seus mandantes e líderes tenham tudo. Precisamos, enfim, substituir o medieval pelo contemporâneo, entendo, na prática que já estamos no Século XXI, em plena era do conhecimento para a vida e a dignidade.
 
* Prof. Antonio da Costa Neto: Mestre em Políticas, Planejamento e Administração da educação. Professor, consultor, conferencista. Autor dos livros: Paradigmas em educação no novo milênio, Escolas & Hospícios – ensaio sobre a educação e a construção da loucura e vários artigos na área. Professor aposentado e atuante em faculdades particulares do DF e Entorno.