Dia Mundial do Cuidado Auditivo e o Brasil na contramão da inclusão social

No dia 3 de março, celebra-se o Dia Mundial do Cuidado Auditivo. Este ano, apesar da pandemia do novo coronavírus, governos de quase todos os países adotam políticas cada vez mais eficientes de inclusão social das pessoas com deficiência. O Brasil é um dos únicos países em que o governo federal segue na contramão, pois faz exatamente o contrário do que preconiza a Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a inclusão social das pessoas com deficiência.

 

No País, a falta de inclusão das pessoas com deficiência começa do básico, desde as dificuldades de acesso à saúde e, muitas vezes, até no acesso à alimentação e à educação. Os mais de 10 milhões de brasileiros surdos, segundo dados divulgados em fevereiro de 2020, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), representam 5% da população brasileira e têm sofrido um golpe atrás do outro, pela política econômica neoliberal do governo Jair Bolsonaro (sem partido).

 

No primeiro ano de governo, ele extinguiu a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi) tão logo o ex-ministro Vélez Rodriguez assumiu o Ministério da Educação (MEC). Até hoje, a continuidade de programas é incerta. A secretaria, criada em 2004, atendeu à demanda de movimentos sociais para inclusão da parcela da população excluída da educação pública e gratuita.

 

Analistas do próprio governo afirmam que o movimento do governo Bolsonaro visa a eliminar temáticas de direitos humanos, étnico-raciais e a própria palavra “diversidade”. A alteração foi confirmada pelo próprio Presidente da República em seu Twitter. “O foco [agora é] oposto de governos anteriores, que propositalmente investiam na formação de mentes escravas das ideias de dominação socialista”, escreveu.

 

“As escolas precisam estar preparadas para receber todas as pessoas, incluindo aí as pessoas com deficiência. Mas, até hoje, o Distrito Federal e o resto do Brasil ainda não mudaram as sirenes. Um som estilo ‘toque de recolher’, esse dispositivo também pode trazer grandes prejuízos e desconforto a saúde dos estudantes, trabalhadores e comunidade escolar, incluindo aqueles que usam aparelho audito e implante coclear”, informa Carlos Maciel, diretor do Sinpro-DF.

 

Ele lembra que tema já foi abordado no PL nº 235/2019, já aprovado pela Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) e veda o uso das sirenes nas escolas do DF. “Trata-se de um som muito alto que também pode provoca deficiência auditiva nas pessoas e, de acordo com a intensidade, incomoda, profundamente, pessoas com autismo. Atrapalha os cuidados com a audição”, afirma o diretor do Sinpro-DF

 

Em 2020, o governo Bolsonaro piorou ainda mais a situação das pessoas com deficiência: reduziu em cerca de 71% o valor a ser disponibilizado pelo Programa Nacional de Apoio à Saúde da Pessoa com Deficiência (Pronas/PCD) em relação a 2019. Por meio de uma portaria interministerial, publicada no dia 29/10/2020, o valor global máximo previsto das deduções do imposto que poderiam ser destinadas ao programa foi de R$ 34,2 milhões, muito menor do que os R$ 117,4 de 2019.

 

Com o corte do financiamento público ao Pronas/PCD, que capta recursos de renúncia fiscal da iniciativa privada, pessoas físicas e jurídicas e reverte esses valores em projetos para a população com deficiência, muitas iniciativas de inclusão social foram extintas. Com a Medida Provisória *(MP) 917/2019*, o governo Bolsonaro, prorrogou até 31 de dezembro de 2020 o prazo para que todas as salas de cinema do País se adequassem ao Estatuto da Pessoa com Deficiência, prevista na Lei Brasileira de Inclusão, se isso não bastasse, as pessoas com deficiência, foram pegas de surpresa no início do ano, com outra medida provisória, a MP 1.025/2020, que prorroga o prazo por mais dois anos.

 

Os dados apresentados pelo IBGE também dão conta de que duas em cada três pessoas surdas têm dificuldades para realizar suas atividades diárias. A consequência disso é que a comunidade de pessoas surdas encontra, no governo federal, uma barreira que a mantém diante da falta de oportunidade no entretenimento, no mercado de trabalho e no sistema educacional para a comunidade surda.

 

Dentre os resultados negativos, as empresas brasileiras, que não querem investir em inclusão, impõem ao País um dos mais perversos dados de inclusão no trabalho das pessoas com deficiência, uma das desculpas dos empregadores para a baixa inclusão, em torno de 1% do total de empregos com carteira assinada, é a falta de profissionalização dos surdos. Um exemplo disso é que apenas 7% dessas pessoas tem curso superior completo, 15% o ensino médio, 46% o fundamental e mais de 32% não tem escolaridade alguma.

 

Dados mundiais

O primeiro “Relatório Mundial sobre Audição”, lançado este ano pela OMS, defende investimentos para prevenir e tratar doenças relacionadas à perda auditiva. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), que criou o Dia Mundial do Cuidado Auditivo, quase 60% da perda auditiva pode ser evitada.

 

Dados inéditos do relatório dão conta de que um quarto da população global, ou cerca de 2,5 bilhões de pessoas, viverá com algum grau de perda auditiva em 2050. O estudo, divulgado nessa terça-feira (2 de março), estima que sem medidas para prevenir e tratar este tipo de perda, pelo menos 700 milhões de pessoas precisarão de acesso a cuidados auditivos e outros serviços de reabilitação. 

 

A OMS diz ainda que “os governos podem ter um retorno de quase US$ 16 para cada dólar que for aplicado nesses esforços”. De acordo com a ONU News, a otorrinolaringologista Danielle Torres, do Rio de Janeiro, destacou haver avanços tecnológicos que ainda não estão disponíveis para grande parte da população que estão sofrendo os impactos dessas perdas auditivas.

 

“Eles são sentidos na cognição, na escolaridade e na renda desses pacientes. É fundamental que todas as tecnologias que nós já possuímos, e que a ciência conseguiu desenvolver até o momento, como próteses auditivas de grande qualidade e algumas cirurgias que permitem restabelecer a audição em alguns casos. A gente tem cirurgias de implante coclear e cirurgias de próteses que podem ser colocadas dentro do ouvido. A gente tem aparelhos auditivos de grande qualidade que oferecem sons puros e facilitam a conectividade até com equipamentos eletrônicos”, diz a médica.

 

A publicação foi lançada um dia antes do Dia Mundial da Audição, neste 3 de março, e defende a expansão do acesso a serviços de saúde auditiva. O Dia Mundial do Cuidado Auditivo foi criado também para alertar sobre o risco da exposição ao som alto provocado por dispositivos de áudio, como os fones de ouvido. Dados da organização indicam que a exposição crônica e prolongada a sons com mais de 85 decibéis pode causar perda auditiva. Portanto, escutar música em som elevado (em torno de 100 decibéis), por mais de 1 hora ao dia, todos os dias, pode causar danos irreversíveis às células sensoriais dos ouvidos.

MATÉRIA EM LIBRAS