Dia de traição e golpe aos votos democráticos da nação
Para a maioria dos brasileiros e das brasileiras, para aqueles comprometidos com a democracia e com a justiça, foi difícil conter as lágrimas após o resultado final do processo de impeachment contra a presidenta legitimamente eleita Dilma Rousseff. Por 61 votos a favor (entre os quais os três senadores do DF) a 20 contra, sem nenhuma abstenção, a primeira mulher eleita ao cargo máximo do Executivo Federal foi condenada e afastada do cargo sem ter cometido nenhum crime, julgamento este feito por senadores que, em maioria, são acusados de corrupção. Este 31 de agosto fica marcado como um dos dias mais tristes da história do Brasil pelo golpe parlamentar, pela traição aos votos e esperanças do povo e pelo retrocesso político e social aos trabalhadores.
Em votação subsequente, por 42 votos favoráveis, 36 contrários e 3 abstenções, o Senado decidiu que a presidenta Dilma Rousseff não ficará proibida de exercer função pública. Para que a presidenta perdesse os direitos políticos por oito anos, seriam necessários 54 votos favoráveis. O destaque para o voto em separado desta questão foi apresentado pelo senador Humberto Costa, líder do PT no Senado, em nome da bancada do partido. O pedido foi acatado pelo presidente da sessão, Ricardo Lewandowski, ministro presidente do STF (Supremo Tribunal Federal).
“É fato que a garantia dos direitos políticos da presidenta Dilma garantem a ela o mínimo de justiça, diante de um processo inescrupuloso como foi este do impeachment. Entretanto, para a sociedade, os danos não foram apaziguados. Com a confirmação de que o golpista Temer assume definitiva e ilegitimamente a presidência do Brasil, todos os projetos que já corriam a passos largos no governo e no Congresso ganham mais força. Projetos esses que priorizam o mercado em detrimento dos direitos dos trabalhadores, das garantias e proteções sociais”, afirma o presidente da CUT Brasília, Rodrigo Britto.
Para ele, embora o peso da consolidação de um golpe, que, desta fez, foi aplicado não por armas, mas por alegações jurídicas falsas, é hora de intensificar a luta. “Assim como o povo resistiu ao golpe de 1964, vai resistir a este de 2016. Vamos intensificar nossa mobilização nas ruas, nosso repúdio aos golpistas, entreguistas e ladrões de direitos. Se eles pensam que vamos encarar isso de cabeça baixa, eles estão muito enganados. Nós estamos prontos para a luta e vamos dar nossa resposta nas ruas e também nas urnas, em todas as instâncias e espaços.”
Vigília pela democracia
A presidenta Dilma Rousseff assistiu à votação no Palácio da Alvorada, ao lado de aliados, como o ex-presidente Lula, o presidente do PT, Rui Falcão, e ex-ministros. Do lado de fora da residência oficial, militantes da CUT, de partidos políticos e de movimentos sociais demonstraram apoio a Dilma e também acompanharam a votação pelo telão instalado no local.
O sentimento predominante era de resistência. Os militantes começaram a se reunir nas primeiras horas da manhã e se mostravam bastantes esperançosos em relação ao desfecho do processo. Portando faixas, cartazes, tambores e entoando gritos de “Dilma guerreira da pátria brasileira”, “Fora golpistas” e “Fica querida” o grupo fez muito barulho e deixou claro que, independente do resultado, a luta nas ruas irá continuar.
Para a professora e militante do Movimento Rosas Pela Democracia, Neliane Maria, neste momento, em que se consuma o golpe que ataca os direitos trabalhistas e das mulheres, é necessário que haja luta. “Em vez de protestarmos em frente ao Senado, decidimos ficar ao lado de quem sempre legitimamos e defendemos como nossa presidenta. Dilma precisa saber que nós mulheres estamos do lado dela e da democracia”, disse.
O vice- presidente regional da União Nacional dos Estudantes (UNE), Messias da Silva, esteve presente no ato e reafirmou a importância da participação e mobilização dos estudantes nas ruas. Para ele, há perspectivas sombrias para os estudantes caso o golpe seja consumado. “Haverá retirada de conquistas sociais, direitos trabalhistas e da juventude negra, adquiridos através de muita luta. Hoje nós temos um governo interino que está prestes a consolidar um golpe e não podemos aceitar essa farsa. Precisamos resistir e a resistência só se dá por meio da luta”, afirma.
Nossa arma é a luta nas ruas
Minutos antes de ser anunciado o desfecho da votação do processo de impeachment, os militantes se reuniram emfrente ao telão. Os olhos grudados tela e o silêncio entre os presentes eram indícios de que seria difícil conter o choro. Eram centenas de pessoas, dos mais diversos segmentos sociais, movidas por uma mesma causa: defender a jovem democracia do país, conquistada com muito suor. Ao sair o resultado final, apesar do choro de muitos militantes, o sentimento de resistência prevaleceu.
A participante do ato e militante do Movimento LGBT, Tânia Martins, afirmou que a luta ficou maior. Para ela, o golpe parlamentar judiciário e midiático não enfraqueceu a luta pela democracia, pelo contrário, aumentou o desejo de justiça. “Já vivemos essa mesma situação em 64 e a nossa arma foi a luta nas ruas”.
A militante afirmou, ainda, que a luta durante os nove meses do processo não foi de toda em vão. “O fato de não tirarem os direitos políticos da presidente eleita democraticamente já é uma vitória. Esses parlamentares golpistas rasgaram a constituição e estão devolvendo, para lutar conosco nas ruas, uma guerreira”.
Não terão um minuto de sossego
Em frente ao Palácio da Alvorada, o presidente da CUT Brasília, Rodrigo Britto, também reagiu à consumação do golpe: “O que vai vir agora nesse governo é uma chuva de decretos e iniciativas contra a classe trabalhadora. São projetos a mando de uma minoria que quer aumentar sua lucratividade explorando a população”, disse. Britto reafirmou que a CUT, como defensora dos trabalhadores, irá à luta nas ruas. “Esses apoiadores do golpe não terão um minuto de sossego. Se eles acham que vamos parar e diminuir a perseverança, eles estão enganados. Não aceitaremos o roubo dos nossos direitos”.
“Nós nunca esqueceremos essa data. Uma nova geração de brasileiros e democratas vai lutar para anular essa sessão do Senado Federal. E esse Senado pedirá desculpas formais à presidenta”, disse o senador Lindberg Farias (PT-RJ). Para ele, “o senador que optou pela infâmia, carregará junto a desonra.”
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-SC) reforçou que o impeachment concretizado nesta quarta é golpe. “Quando tem um rito legal sem um crime, não é um impeachment, é um golpe. Não contra Dilma, mas contra a sociedade.”
Já o senador ruralista Ronaldo Caiado (DEM-RN), que submeteu trabalhadores a condições análogas às de escravo em suas propriedades, votou pela saída definitiva de Dilma da presidência, e afirmou: “Este é momento de praticar a maior assepsia para tirar esse modelo que naufragou o Brasil”. O modelo ao qual o senador se refere é aquele que tirou milhares de brasileiros da miséria, inseriu jovens negros e pobres nas universidades, ampliou o serviço da saúde e da educação pública, além de ter implementado tantas outras políticas públicas capazes te tornar o Brasil um pouco mais justo e respeitado como país emergente no exterior.
Golpe em cima de golpe
Os parlamentares que votaram pelo impeachment de Dilma Rousseff e criticaram a decisão do Senado em poupar os direitos políticos da presidenta já anunciaram que vão tentar amenizar os danos da possível cassação do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ele foi citado em diversos esquemas de corrupção e adjetivado como gângster por jornais de dentro e de fora do país.
Se cassado, Cunha perde, por oito anos, os direitos políticos, entre eles, o de ocupar, neste período, qualquer função pública.
Nove partidos assinaram um compromisso para votar a cassação do mandato de Eduardo Cunha no dia 12 de setembro. A data cai em uma segunda-feira, em geral, dia de plenário vazio na Câmara. Entretanto, há um compromisso dos líderes dos partidos em garantir quórum.
Dilma vai à luta
Veja o depoimento de Dilma no meio da tarde, após ser afastada injustamente da presidência: Golpe enfrentará recursos e “firme, incansável e enérgica oposição”