Assassinatos sinalizam a importância da escola e da Lei do Feminicídio

Nem ao menos cicatrizou a ferida aberta pelos feminicídios das estudantes Louise Maria da Silva Ribeiro, 20 anos, e Jane Fernandes Cunha, 21 anos, ocorridos em março, o Distrito Federal volta a se surpreender e a se atemorizar com outro assassinato de mulher com todas as características de violência de gênero.
Na sexta-feira (8), uma professora aposentada da rede pública de ensino foi morta a facadas pelo marido. O crime ocorreu diante dos filhos adolescentes. A diretoria colegiada do Sinpro-DF, por intermédio da Secretaria de Assuntos e Políticas para Mulheres Educadoras, entende que essa sequência de feminicídios no período de menos de 30 dias revela a urgência de se divulgar mais intensamente e de forma pedagógica a Lei nº 13.104/2015, mais conhecida como Lei do Feminício.
“Por causa de nossa insistência em divulgá-lo, parece que o tema do feminicídio é cansativo, contudo, os crimes estão acontecendo e, por isso, a gente não pode descansar. Diante dessa situação de violência, precisamos levar para a escola, de forma pedagógica, a notícia de que conquistamos a Lei do Feminícidio, os avanços que ela representa e que ela prevê a punição para quem comete esse tipo de crime”, comenta Eliceuda França, coordenadora da Secretaria de Assuntos e Políticas para Mulheres Educadoras.
Ela diz que, “ainda de forma pedagógica, é preciso levar para a sala de aula, em todos os níveis de ensino, o debate sobre a violência de gênero. Faz parte de nosso fazer acadêmico e da execução do próprio magistério saber o que nossos e nossas estudantes pensam sobre isso e desenvolver um trabalho de conscientização. Muitas vezes, num debate sobre esse tema em sala de aula, conseguimos descobrir quem está vivendo situação de violência em casa”, explica a diretora.
A diretora do sindicato lembra também que, além da Lei do Feminicídio, sancionada no ano passado pela presidenta Dilma Rousseff, há ainda a Lei Maria da Penha que, juntas, formam um conjunto de legislações que visam a defender e a proteger a mulher contra a violência de gênero.
Em março, quando Louise e Jane foram assassinadas, Lourdes Bandeira, professora do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) e integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas Sobre as Mulheres (Nepem), disse à imprensa que a violência contra a mulher é um problema estruturado na sociedade e que os dados levantados em pesquisas sobre esses crimes dão conta de que a cada três casos de jovens agredidas ou mortas, um é praticado pelo namorado.
“Isso representa que vivemos em uma sociedade masculinista com resquícios patriarcais. O homem se sente dono, proprietário daquela pessoa e assume a responsabilidade de que, se ela não for dele, não será de mais ninguém”, diz.
Novos dados sobre violência de gênero
O levantamento da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República –, sobre os dados da violência contra a mulher nos 10 primeiros meses do ano de 2015, indica que, entre janeiro e outubro do ano passado, 85,85% dos relatos coletados corresponderam a situações de violência doméstica e familiar contra as mulheres. (Confira aqui o documento consolidado: Balanço 2015)
Em 67,36% dos relatos ficou demonstrado que as violências foram cometidas por homens com quem as vítimas tinham ou já tiveram algum vínculo afetivo – ou seja, foi cometido por companheiros, cônjuges, namorados ou amantes, ex-companheiros, ex-cônjuges, ex-namorados ou ex-amantes das vítimas –, e em 27% dos casos, o agressor era um familiar, amigo, vizinho ou conhecido.
Os atendimentos registrados pelo Ligue 180 revelaram que nos dez primeiros meses de 2015, do total de 63.090 denúncias de violência contra a mulher, 31.432 corresponderam a denúncias de violência física (49,82%); 19.182 de violência psicológica (30,40%); 4.627 de violência moral (7,33%); 1.382 de violência patrimonial (2,19%); 3.064 de violência sexual (4,86%); 3.071 de cárcere privado (1,76%); e 332 envolvendo tráfico (0,53%). Indicaram também que 77,83% das vítimas têm filhos (as) e 80,42% desses (as) filhos(as) presenciaram ou sofreram a violência.
Outros estudos também mostram o nível da violência de gênero no país e que as legislações precisam ser mais bem divulgadas e as mulheres empoderadas. A última pesquisa DataSenado (confira o documento aqui) sobre violência doméstica e familiar de 2015 indica que uma em cada cinco mulheres já foi espancada pelo marido, companheiro, namorado ou ex e 100% das brasileiras conhecem a Lei Maria da Penha.
O documento do Senado aponta que, nas eleições de 2014, apesar de um pequeno aumento no número de mulheres parlamentares, a desigualdade entre a representatividade é abissal e não chegou aos 30% das cotas exigidas por lei: em 2010 o número de mulheres correspondeu a 8,8%; em 2014, chegou a apenas 10%.
No mercado de trabalho, as mulheres ainda recebem 30% a menos do que homens para exercerem, muitas vezes com muito mais competência, a mesma função. As mulheres representam dois terços do universo de 774 milhões de adultos analfabetos. Dos 4.762 homicídios de mulheres registrados em 2013, 50,3% foram cometidos por familiares, sendo a maioria desses crimes (33,2%) cometidos por parceiros ou ex-parceiros.
Esse número mostra que a cada sete feminicídios, quatro foram praticados por pessoas que tiveram ou tinham relações íntimas de afeto com a mulher. O Mapa da Violência de 2015 traz, em números, a confirmação de que a violência doméstica e familiar é a principal forma de violência letal praticada contra as mulheres no Brasil.