Artigo – O dever da esperança na Educação

A greve dos(as) professores(as) e orientadores(as) educacionais da rede pública de ensino do Distrito Federal completa, nesta sexta-feira (19), dezesseis dias de luta pela valorização desta categoria tão importante e necessária para o futuro do Brasil e do mundo, e pela educação, setor tão desvalorizado pelo Governo do DF e pelo governo de Jair Bolsonaro. Durante o movimento paredista os(as) educadores(as) têm mostrado à sociedade a necessidade de refletir não somente sobre a necessidade dos profissionais da área obterem ganhos financeiros, conquista justa pela importância que têm e por todas perdas que tiveram ao longo dos últimos anos, mas, também, e principalmente, sobre qual educação queremos para as próximas gerações.

Uma educação pública de qualidade se constrói com investimento, com o GDF elencando o setor como uma prioridade, fatores que não têm ocorrido. Além disto, é preciso reconhecer a importância que os(as) educadores(as) têm neste processo, oferecendo melhorias nas condições de trabalho, na formação de professores(as) e orientadores(as) educacionais, na valorização social e profissional da profissão docente, além de acabar com a precarização das relações de trabalho que atingem direta e indiretamente a categoria, como evidenciado pela lida diária de educadores(as).

Em artigo publicado no jornal Correio Braziliense, o professor de educação básica da Secretaria de Educação do DF e Doutor em geografia pela Universidade de Brasília (UnB), Rodrigo Capelle Suess, ressalta a justa luta da categoria por uma melhoria da qualidade de vida, na redução de suas perdas e da necessidade de se colocar a educação como uma prioridade.

Confira o artigo na íntegra:

 

ARTIGO

O dever da esperança na educação

O que reivindicam os professores do Distrito Federal não são privilégios corporativistas, mas reposição salarial e reestruturação de carreira para que possam viver dignamente

 
Rodrigo Capelle Suess*
postado em 28/04/2023 19:49 / atualizado em 29/04/2023 19:50

 

Rodrigo Suess, doutor em geografia e professor de educação básica do DF - (crédito: Arquivo pessoal)
Rodrigo Suess, doutor em geografia e professor de educação básica do DF – (crédito: Arquivo pessoal)

No dia 25 de abril meus colegas professores votaram pela adesão à greve como estratégia de luta diante do ponto de inflexão entre a classe trabalhadora docente e o Governo do Distrito Federal. Sobre essa questão, tomo a liberdade de expressar aquilo que sinto, vivo e pesquiso por meio deste texto.

Ao considerar essa questão estrutural, gostaria de tecer alguns comentários sobre a questão posicional do professor de Educação Básica da rede pública de ensino do Distrito Federal. Reconhece-se que o Distrito Federal possui vantagens competitivas em relação à considerável parcela das redes públicas de outras unidades da federação. Entretanto, não o suficiente para romper com o subdesenvolvimento do sistema educacional brasileiro.

Sabe-se, assim, que podemos ser mais do que aquilo que estamos sendo nesta conjuntura social. Tomada essa consciência, independente do espectro político, a única direção plausível para o nosso corpus social é o olhar para frente: pensando no presente, na melhoria da qualidade de vida da população, na redução de seu sofrimento e no respeito à sua dignidade humana; pensando no futuro, no conjunto de possibilidades e disponibilidade de condições que se tem para a realização e desenvolvimento do país.

Trata-se, ainda, de desvelar aquilo que todos os professores vivenciam nas escolas públicas do Distrito Federal. Se, por um lado, a estrutura física das escolas têm melhorado, por outro lado, ainda pouco contempla a execução de processos mais complexos, criativos e emancipatórios em prol da comunidade escolar. Soma-se a essa base material outros problemas que envolvem as condições de trabalho, a formação de professores, a valorização social e profissional da profissão docente, além da latente precarização das relações de trabalho que atingem direta e indiretamente à classe trabalhadora brasileira, como evidenciado pela lida diária do professor e diversas pesquisas científicas realizadas nos últimos anos.

Soma-se, ainda, a esse montante a previsão inflacionária de 6,01% para o ano de 2023, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), realizado pelo IBGE, além do aumento da alíquota previdenciária sofrido recentemente. Assim, registra-se estagnação na perspectiva profissional e salarial do professor nos últimos anos.

Em termos relacionais, a situação mostra-se preocupante se comparada com outras categorias de nível superior do Governo do Distrito Federal, a classe dos professores é a mais desvalorizada em termos salariais e em desacordo com o Plano Distrital de Educação – 2015-2024, que, em sua meta 17, prevê a equiparação salarial com outras carreiras equivalentes do serviço público do Distrito Federal, a um ano de seu vencimento, nenhuma medida governamental foi tomada para o cumprir seus dispositivos.

Nesse aspecto, não se considera adequado e justo o discurso retórico e simplista que prega isonomia salarial entre as carreiras, enquanto existirem expressivas assimetrias entre elas. Nesse caso, o adequado seria a igualdade entre as profissões que desenvolvem atividades de complexidade semelhante e possuem importância estratégica para o desenvolvimento do Distrito Federal, o que não ocorre. Sabe-se que a formação integral do ser humano, por meio do processo de ensino-aprendizagem nas escolas, é da mais elevada complexidade e exige condições de trabalho adequadas, formação permanente e dedicação exclusiva. Desse modo, a luta da categoria visa uma reparação histórica diante de uma desigual e injusta estrutura hierárquica profissional.

Desse modo, o que reivindicam os professores do Distrito Federal não são privilégios corporativistas, mas reposição salarial e reestruturação de carreira para que possam viver dignamente, com o devido reconhecimento social, profissional e salarial. Relacionam-se, também, às questões apresentadas, melhores condições de trabalho nas escolas e trabalhistas para os professores temporários, isonomia entre os professores que se encontram na ativa e os aposentados e incorporação de gratificações.

Nesse caminho, conta-se com a compreensão da sociedade da importância e função social do professor para o desenvolvimento sustentável, justo e solidário do Distrito Federal. Em respeito ao Estado Democrático de Direito e como integrantes dele, conta-se, ainda, com o diálogo aberto e franco entre os professores, o Governo do Distrito Federal e a Câmara Legislativa do Distrito Federal para que juntos possam pensar numa solução plausível de reparação das disparidades de condições de trabalho e remuneração salarial entre os professores e os demais servidores públicos do DF, com o devido reconhecimento dos profissionais da educação.

O nosso dever enquanto classe profissional, que dispõe de compromisso social com as classes populares e médias, afetadas intensamente pela crise econômica e pandêmica nos últimos anos, é o da esperança, sem a qual a educação não existiria, segundo Paulo Freire. A educação é, portanto, uma causa indissociável de nossa natureza e de nossa construção social, nos cabendo deixar como herança para as novas e futuras gerações condições melhores e compreensões mais lúcidas do que recebemos, nos comprometendo com o desenvolvimento contínuo de um mundo melhor. Assim, a luta pela educação para todos e de qualidade não é uma luta apenas dos professores, mas de toda a sociedade.

*Doutor em geografia pela Universidade de Brasília (UnB), Rodrigo Capelle Suess é professor de educação básica na carreira de magistério público do Distrito Federal

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