Alfabetização na pandemia: 40,8% das crianças entre 6 e 7 anos não sabem ler e escrever

Em matéria do site Reconta Aí, Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), lembra que o problema da exclusão educacional de crianças já existia antes da pandemia da Covid-19 e que “o afastamento da escola foi uma decisão correta aplicada de uma forma incompleta”, afirma. “A medida foi correta, mas o País falhou em não dar as condições de manter a formação escolar dos estudantes”. Confira a matéria completa a seguir:

 


Alfabetização na pandemia: 40,8% das crianças entre 6 e 7 anos não sabem ler e escrever

De acordo com nota técnica publicada nesta terça-feira (8) pela organização da sociedade civil Todos Pela Educação, os impactos da pandemia na alfabetização de crianças foram devastadores. O número de crianças entre 6 e 7 anos que não sabem ler e escrever, por exemplo, passou de 25,1% em 2019, para 40,8% em 2021. Uma porcentagem que, traduzida em números, corresponde a 2,4 milhões de crianças em 2021 contra 1,4 milhões em 2019.

 

Contudo, entre os educadores existe o pensamento que a tragédia poderia ter sido ainda maior se as aulas presenciais não tivessem sido paralisadas nos períodos mais agudos de contaminação e óbitos da pandemia. Segundo o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, havia problemas na quantidade de crianças alfabetizadas mesmo antes da Covid-19. Porém, a falta de financiamento adequado, de estruturas e de tecnologia piorou muito a situação.

 

“O afastamento da escola foi uma decisão correta aplicada de uma forma incompleta”, afirma. “A medida foi correta, mas o País falhou em não dar as condições de manter a formação escolar dos estudantes”, completa Araújo.

 

A mesma opinião é compartilhada por Matheus Lima, professor em Cotia (SP) e diretor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp). “Era preciso uma resposta diante da pandemia. Uma opção era a de não ter aulas presenciais para diminuir o contágio e as mortes, mas com evidente prejuízo educacional. A outra opção era manter as aulas presenciais, com menos prejuízo educacional, mas com maior risco de contágios e de mortes. Não havia solução boa de fato”, destaca.

 

E o ensino à distância?

 

“Nós temos uma estrutura na educação brasileira que começa na educação infantil. Desde 2009, com a Emenda Constitucional 59, todas as crianças entre 4 e 17 anos anos devem estar na escola”, explica Araújo. Entretanto, com a educação à distância, ou “atividades remotas emergenciais” como prefere o educador, o acesso ao aprendizado ficou ainda mais desigual.

 

Uma desigualdade mensurada por pesquisas como a da TIC Educação – 2019, que apontou que quase 40% dos alunos de escolas públicas não tinham computador ou tablet para estudar em casa antes da pandemia.

 

Além da aprendizagem da leitura e da escrita, Araújo ressalta que há ainda mais prejuízos – alguns difíceis de serem mensurados -, como a falta de socialização e a falta de acesso a merenda escolar. Por esses e outros fatores, Araújo não considera a modalidade à distância adequada para as crianças.

 

“O ensino a distância não é adequado à formação básica escolar. Dos 4 aos 17 anos de idade a educação precisa ser presencial, bem como a formação inicial dos profissionais da educação. Só a tecnologia e o conteúdo não são capazes de proporcionar aos estudantes uma formação cidadã“, ressalta o educador.

 

Todo cidadão tem direito à alfabetização

 

Apesar da educação ser um direito constitucional, os números mostram a exclusão de uma importante parcela da sociedade. Somente em relação as creches, por exemplo, há um déficit de 65% das vagas no Brasil. Quanto ao analfabetismo entre adultos, o número também assusta: são pelo menos 11 milhões de pessoas. E esse é um retrato anterior à pandemia.

 

“O Congresso Nacional buscou atuar para melhorar o panorama”, afirmou Araújo. Ainda em 2020, Senado e Câmara dos Deputados aprovaram uma lei para que o Governo Federal destinasse 3,5 bilhões para garantir o acesso à internet para alunos e professores.

 

Contudo, a lei foi vetada pelo presidente Bolsonaro, e depois o veto foi derrubado pelo Congresso. Com isso, o Governo Federal acabou levou a questão ao Supremo Tribunal Federal. Bolsonaro terminou por assinar o decreto somente em 30 de dezembro de 2021, uma demora de um ano para garantir o direito dos alunos.

 

Gabriel Corrêa, líder de políticas educacionais do Todos Pela Educação, acredita que a retomada da educação depende da vontade política de enfrentar esse desafio. “Precisamos urgentemente de políticas consistentes para a retomada das aulas, para que essas crianças tenham condições de serem alfabetizadas e sigam estudando”, diz.

 

(*) Matéria assinada pela repórter Renata Vilela e postada, originalmente, no site Reconta Aí e repostada no site da CNTE na Mídia.