Agressões no CED 01 da Estrutural revelam o fracasso da militarização das escolas públicas

O Centro Educacional nº 01 da Cidade Estrutural (CED 01 Estrutural) está se tornando, involuntariamente, uma vedete das páginas policiais da imprensa de Brasília desde que foi transformada em escola militarizada. Todo dia a tal gestão compartilhada cria um problema com alguém da comunidade escolar e, cada vez mais, tem transformado a unidade em ambiente de terror e medo. Essa escola é uma das instituições públicas do programa do Estado policial bolsonarista denominado Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim).

 

Esse tipo de arranjo faz parte de um projeto maior intitulado “Estado policial”. Sabe o que é isso? É um tipo de “organização” neoliberal que se apropria do aparelho estatal e o transforma em um arranjo fortemente armado, baseado no controle da população e, principalmente, de opositores e dissidentes por meio da polícia política, das Forças Armadas e de uma profusão de outros mecanismos de controle ideológico e repressão política, como, por exemplo, a militarização das escolas públicas.

 

Nada melhor do que dinheiro público para atrair adeptos

 

O Pecim nada mais é do que a militarização das escolas públicas nos governos neoliberais de Jair Bolsonaro (PL) e de Ibaneis Rocha (MDB). De 2019 para cá, cerca de 100 escolas públicas foram transformadas em unidades cívico-militares, das quais 16 estão no Distrito Federal. Uma reportagem do início de maio deste ano do jornal O Globo mostra que esse tipo de projeto serve também para desviar dinheiro público da Educação. Na reportagem, o jornal diz que, “mesmo sendo somente 0,1% das escolas públicas, as unidades cívico-militares tiveram o seu orçamento triplicado”. O valor passou de R$18 milhões para R$64 milhões, o dobro do previsto para o Novo Ensino Médio.

Trata-se de um dos dez maiores orçamentos discricionários da educação básica e mostra como o autoritarismo anda de mãos dados com o uso indevido do dinheiro público. E é justamente essa promessa de injeção de dinheiro nas escolas públicas abandonadas pelo Estado que leva muitas comunidades escolares se sujeitarem a qualquer tipo de gestão, mesmo essas, as militarizadas, comprovadamente despreparadas para lidar com crianças e adolescentes no ambiente escolar e que não entende nada de aprendizagem e pedagogia.

 

Gestão compartilhada é incompatível com a gestão democrática

As gestões militarizadas têm comprovado que, pedagogicamente, são um fracasso e são também um mecanismo para desincompatibilizar a gestão democrática, uma forma de extinguir a categoria de professores, uma maneira autoritária de privatizar a educação pública e de o setor privado se apropriar dos equipamentos públicos, como os prédios, os objetos e, principalmente, os recursos financeiros públicos da educação.

Só este ano, a Polícia Militar (PM) que atua nas escolas militarizadas do Distrito Federal já agrediu estudantes, gestores e professores de várias formas e, mais do que isso, afrontou a gestão democrática. A mais recente ação violenta ocorreu no Centro Educacional 01 da Cidade Estrutural (CED 01 Estrutural). Nessa segunda-feira (30/5), um PM utilizou spray de pimenta, uma chave de braço e as algemas para imobilizar um adolescente que brigava com outro estudante.

Na manhã desta quarta-feira (1º), o governo Ibaneis anunciou que toda a equipe “disciplinar” da escola foi afastada. No entanto, a solução é só uma: desmilitarizar a escola e acabar com a tal “gestão compartilhada” e devolver os policiais para os Batalhões Escolares para prevenirem o crime nas ruas.

 

Essas agressões não ocorrem somente no CED 01 da Estrutural. Ocorre em todas. Um exemplo é o vídeo de uma confusão entre estudantes e policiais militares no Centro Educacional 07 de Ceilândia (CED 07), uma das escolas militarizadas do DF, que viralizou nas redes sociais em abril de 2019. Nas imagens é possível ver o momento em que um PM empurra o adolescente e ele cai no chão. Em seguida, outros militares e estudantes se aproximam do adolescente. O vídeo ainda mostra um outro militar por cima do aluno que está no chão. Um segundo militar se aproxima e a gravação acaba.

 

 

CED 01 da Estrutural sufocado entre ameaças, agressões e medo

No início de maio, um policial militar ameaçou “arrebentar” um estudante de 14 anos. A ameaça ocorreu durante um protesto dos estudantes contra a exoneração da vice-diretora Luciana Pain, que critica, com razão, a gestão autoritária na escola pública. Essa não é a primeira ocorrência de violência da PM contra a comunidade escolar. O CED 01 é um exemplo do fracasso da militarização das escolas públicas.

A militarização destruiu o processo pedagógico desenvolvido pela rede pública de ensino do DF. No ano passado, o Sinpro-DF teve de divulgar uma nota de repúdio contra o assédio moral contra professores(as). A PM obrigou a vice-diretora, Luciana Pain, retirar o mural sobre o Dia Consciência Negra em que estavam expostas imagens que denunciavam atitudes racistas da PM; em uma delas, um PM aparece com uma suástica. As ilustrações foram feitas pelos estudantes.

As turmas de 8º e 9º Anos do Ensino Fundamental, a convite do professor de história, expressão reflexões e sensações acerca do Dia da Consciência Negra por meio de charges encontradas, principalmente, na Internet. Os(as) estudantes atenderam e construíram o mural na área comum da escola, onde exibiram os resultados do trabalho. Segundo os(as) professores(as), essa prática pedagógica não é nova, não é exclusiva do CED 01 e, ao contrário da militarização, gera bons resultados na construção de diálogo e trocas entre estudantes e entre eles(as) e seus(as) professores(as).

Mas o tenente e diretor disciplinar da escola se incomodou com os trabalhos, que abordavam a violência e, dentre elas, as abordagens racistas dos policiais, e mandou a vice-diretora, professora Luciana Pain, retirar os trabalhos dos murais. Após isso, o deputado federal bolsonarista Heitor Freire, do PSL do Ceará, invadiu o CED 01, acompanhado de uma assessora, não se apresentaram ao corpo pedagógico da escola e filmaram a vice-diretora sem o consentimento dela. O parlamentar também tentou intimidá-la e fez ameaças do tipo “você vai cair” quando ela lhe informava qual o procedimento formal para registrar reclamações e questionamentos. 

 

Militarização substituiu a aprendizagem pelo terror

Aliás, a primeira atitude dos gestores militares do CED 01 foi perseguir a cultura e a história da população negra. À revelia do desejo da comunidade e das recomendações pedagógicas, apagaram a identidade da juventude da classe trabalhadora dos muros internos e externos da escola. Com uma tinta branca, retiraram das paredes do CED 01 o “mural de inclusão”, pintado por artistas da Estrutural. O obscurantismo prosseguiu para dentro da unidade e apargaram também a imagem de Nelson Mandela.

A militarização conseguiu acabar com o ambiente escolar e transformou o local em um espaço sombrio, triste e vazio de conhecimento. A relação profissional de empatia entre professores deu lugar ao assédio moral, ao ódio, à delação, à traição entre colegas. O CED 01 hoje está refém do medo.

Esse modelo de Estado policial dentro das escolas públicas foi adotado para substituir o ensino-aprendizagem pelo terrorismo, instituir o assédio moral, a perseguição e a pressão sobre os(as) professores(as) e “naturalizar” o uso de agressões físicas e ameaças a estudantes na infância e adolescência. A ideia é adestrar todo mundo para baixar a cabeça perante os abusos dos governantes autoritários.