45 anos do Sinpro

O Sinpro é o melhor sindicato de professores do Brasil. Ele consegue reunir professores, consegue mobilizar, consegue vitórias, mesmo [estando] nós em casa.
Tem três coisas que eu respeito muito: a minha família, a igreja e o sindicato.
(Professora Holanda)

 

As palavras da inesquecível professora Maria Holanda Carvalho durante a pandemia de Covid-19 dão o tom da importância e da relevância do nosso Sindicato dos Professores na vida do Distrito Federal e do Brasil.

Chegamos aos 45 anos com a consciência da maturidade de nossa ação social e política. Sobrevivemos à intervenção federal nos sindicatos em 1979. Crescemos e trouxemos relevância para os rumos da redemocratização do país.

Enquanto lutávamos em prol da democracia, também participávamos e influenciávamos a vida política da população do Distrito Federal. Nossa atuação nos tornou um dos maiores sindicatos do magistério do Brasil.

Nós somos feitos por você. Juntos, somos mais fortes. Não somos neutros, nunca. Temos um lado, sempre: o lado dos professores e das professoras, dos orientadores e das orientadoras educacionais. O lado da educação pública, laica, socialmente referenciada. Da luta, jamais fugimos e jamais iremos fugir. Foi a luta e a união da categoria que nos fez grandes, e fortes, e relevantes.

“O Sinpro é referência de capacidade de organização e de luta, e tem uma relação com a sociedade do Distrito Federal. É uma atuação cidadã de um sindicato que nunca se omitiu com relação aos interesses e direitos da população de modo geral. Nossa luta central é a busca por uma educação de qualidade para os filhos da classe trabalhadora”, lembra a ex-diretora do Sinpro e atual dirigente da Central Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Rosilene Corrêa.

 

Muita luta na redemocratização…

O trabalho que começou há 45 anos rende frutos até hoje.

“Ingressei na carreira em 1986, e foi também nesse ano que eu me sindicalizei”, conta a professora aposentada e doutora Edileuza Fernandes da Silva, que hoje é professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (FE-UnB).

“Na década de 1980, quando eu ingressei, ao mesmo tempo ingressou um grupo muito significativo e muito combativo, organizado e politizado que ajudou a construir muitas lutas organizadas pelo nosso sindicato. Não foi fácil: vivíamos um momento de redemocratização do país e, aqui no DF, os governadores ainda eram indicados. Isso exigia de nós uma luta organizada e forte, mas também muito cuidado nessa organização. A pressão era muito grande.  Lembro quando o Joaquim Roriz, ainda governador nomeado, ameaçou demitir os professores recém-contratados, e eu estava entre esses profissionais. Eram muitas ameaças, nossas lutas e movimentos eram reprimidos, apanhávamos da polícia montada com cacetetes. Não era fácil, mas era uma militância efetiva e resistente.”

“Devo reconhecer, olhando para a minha história, que a participação no Sindicato dos Professores foi importante. Os movimentos sindicais de formação política, os movimentos de formação das greves, de luta pela defesa dos direitos e interesses da nossa categoria e em defesa da educação pública do DF foram fundamentais na minha formação como pessoa, como cidadã e como educadora”, recorda Edileuza.

Quem também se recorda desses tempos difíceis é a professora e doutora Olgamir Amância, ex-diretora do Sinpro e aposentada da SEEDF, que hoje trabalha na UnB e foi candidata a vice-governadora em 2022:

“Eu comecei a militar como delegada sindical da minha escola em Sobradinho. Nessa época, em 1992, fazíamos parte de um conselho de delegados que assessorava a direção do sindicato dos professores, e eu também tive o privilégio de integrar a comissão de negociação do sindicato. A Constituição Cidadã havia sido promulgada três anos antes, e estávamos na efervescência do movimento sindical. Era época da luta por garantias de direitos, uma época em que a categoria do magistério, além dos baixos salários, tinha condições de trabalho muito difíceis e muitos direitos negados. Mas era também uma época em que o sindicato tinha uma capacidade de mobilização muito grande.”

“Entrei para a SEEDF em junho de 1991”, lembra a professora e mestra Vânia Rego, que também recorda a mobilização daquele ano: “buscávamos, naquela greve, questões não apenas salariais, mas de condições mais dignas de trabalho em prol da qualidade da educação pública. Trabalhávamos dois turnos em sala de aula. Pouquíssimo tempo para planejarmos.”

Essa mobilização de toda a categoria agregada pelo sindicato transformou o Distrito Federal, e ajudou a transformar aquele Brasil que engatinhava na redemocratização, e já fazia o impeachment de um Presidente da República.

“As lutas eram difíceis, mas a categoria era muito consciente e militante. Havia lutado pelo fim da ditadura. Tinha “pescoço grosso”, “firme”. Outro detalhe importante era democratizar os sistemas de ensino, não somente as escolas. A cada mobilização ficávamos mais fortes.”, completa Vânia.

Olgamir lembra: “Hoje a gente tem coordenação pedagógica, plano de carreira (que ainda não contempla nossas necessidades, mas garante nossos direitos), temos regras para movimentação de profissionais dentro da SEEDF. Essa realidade cotidiana é fruto de várias conquistas do sindicato, e que antes não existiam.”

 

… que renderam conquistas históricas, como:

A luta dessa época se traduz em uma série de direitos e garantias que, de tão arraigados em nosso cotidiano, passam desapercebidos.

 

“Foi um período de grandes lutas e grandes conquistas. Dentre as várias conquistas deste século, obtivemos a aprovação do Regime Jurídico Unificado (RJU), que unificou toda a legislação dos direitos de professores e demais servidores num único estatuto, e também conquistamos a fundação do Inas e do Iprev, institutos que gerem nosso plano de saúde e previdência”, recorda-se o advogado e ex-dirigente do Sinpro Washington Dourado.

Cada uma dessas conquistas é fruto de muito suor e negociação: conseguimos a jornada ampliada, que nos garantiu o tempo para pensar e planejar o fazer pedagógico, e a promulgação da Lei 957/1995, que implementava a gestão democrática.

“A Lei da Gestão Democrática é a expressão da educação construída coletivamente, com a participação da comunidade escolar, uma educação pensada a partir do território, uma escola democrática como possibilidade de transformação da realidade. Uma escola que seja capaz de fazer a formação técnica, levando em consideração o território onde está inserida, a opinião e o jeito de perceber o mundo dos estudantes e dos que ali trabalham”, analisa a professora Olgamir.

 

– Gestão Democrática

“Até então, na estrutura da SEE-DF tínhamos diretores(as) das escolas escolhidas pelo governo. A maioria sequer conhecia a realidade da escola que dirigia, que dirá a região onde a escola estava inserida. Chegavam apenas para cumprir com o expediente, não estavam abertos à discussão, muito pelo contrário, quem questionasse era punido ou advertido – às vezes, era transferido à revelia. Hoje em dia isso é impensável e inconcebível, graças à atuação do sindicato”, lembra Olgamir, que completa: “a gestão democrática traz essa perspectiva, de construção de um projeto político pedagógico com a participação da comunidade, de reconhecimento da comunidade, e a gestão garante direitos a professores e estudantes, mas acima de tudo garante uma educação emancipatória, de qualidade, e com muita participação e crítica.”

“Somos uma das raras Unidades da Federação que tem a gestão democrática não só regulamentada como inserida na rotina do calendário letivo. Nada disso surgiu de decisão de governador, foi a categoria organizada, reunida no Sinpro, que batalhou, brigou e conquistou cada ponto da lei da gestão democrática. Somos vanguarda nacional”, aponta Rosilene.

 

– Coordenação Pedagógica

Edileuza Fernandes da Silva aponta o pioneirismo do Sinpro na conquista da coordenação pedagógica, e como isso ainda faz do Distrito Federal uma das unidades da federação mais avançadas no quesito.

“Foi muita luta para chegarmos até aqui. Teve ocupação do Buriti, teve greve de fome de professores, teve gente se amarrando às árvores para não serem removidos dos locais de mobilização pela polícia. Para a categoria do magistério público do Distrito Federal, essa conquista foi uma vitória pedagógica, que nos permite investir na nossa formação continuada, nas nossas leituras, na nossa formação, estudos, debates com nossos pares. Nesse investimento coletivo de construção de projeto de docência, temos mais oportunidades de organizar um trabalho com vistas a garantir a nossos estudantes uma educação pública de qualidade. Garantir não só o acesso ao conhecimento, mas um conhecimento transformador. Foi também uma vitória profissional, pois a coordenação pedagógica contribui para a melhoria de nossas condições de trabalho e de valorização da carreira. Mas, principalmente, é uma vitória política: o Distrito Federal é uma das raras Unidades da Federação que se destaca com relação à coordenação pedagógica. E quem teve um papel de destaque no processo de pautar a regulamentação da lei de coordenação pedagógica foi o Sinpro, que atuou de forma intransigente na luta pela defesa do cumprimento das nossas conquistas em movimentos de greve.”

 

Plano de carreira

Do primeiro plano de carreira em 1989 até o mais recente em 2013, passando pela incorporação da Gaped em 2023, nada caiu do céu. Foi tudo fruto de muita luta, muito confronto, muita greve. A carreira do Magistério Público foi criada pela Lei nº 66, de 18 de dezembro de 1989. O Sinpro fará uma série especial com a evolução dos planos de carreira conquistados pela união da categoria mobilizada no sindicato. Acompanhe.

 

Perspectivas e desafios para o século XXI

O perfil das pessoas sindicalizadas mudou neste início de século XXI, uma das consequências da mudança do perfil profissional do magistério público do Distrito Federal. Ao longo das últimas décadas, uma sequência de governos comprometidos com ideais neoliberais fez com que chegássemos no ano de 2024 com 70% de seu contingente profissional trabalhando sob regime de contrato temporário. São pessoas com excelente formação profissional, porém submetidas a condições precarizadas de trabalho, com menos garantias e direitos que o contingente de efetivos – que, por sua vez, se converte em contingente de servidores(as) aposentados(as). O atual ocupante do Palácio do Buriti relegou ao magistério público distrital a existência de 9 mil vagas não preenchidas.

Trata-se de sucateamento da educação pública. Um dos ingredientes desse processo é a precarização do funcionalismo público – servidores(as) da educação incluídos. Como fazer frente a isso?

“Depois da greve de 2023, eu entendi como muitas das condições de trabalho que a gente tem hoje são resultado dessas mobilizações. É necessário sair de casa, participar, fazer vigília, votar. O sindicato do século XXI é de resistência para garantir os nossos direitos já conquistados. É fundamental a união da categoria para garantir condições de trabalho para a nossa categoria, que se traduzem em educação de qualidade para nossos(as) estudantes”, conta o professor de filosofia do CEM 01 do Guará, Felipe Lima Melo, nomeado e sindicalizado neste ano de 2024.

A orientadora educacional Cristiana Almeida Magela, sindicalizada desde 1996, concorda: “A força das lutas coletivas faz toda a diferença, e as conquistas que tivemos ao longo desse tempo se devem a essa soma. Quando nós orientadoras educacionais passamos a integrar a carreira magistério público, a luta e as conquistas tomaram mais forças, e conseguimos muitos avanços. Ainda há muito a conquistar, mas já tivemos grandes avanços. Para quem está chegando, eu deixo um recado: juntem-se a este sindicato, e tornem suas vozes mais atuantes e participativas. A luta é coletiva. O sindicato é a tradução da força de um coletivo em prol de educação pública de qualidade, laica, democrática, socialmente referenciada, de todos, com todos e para todos.”

Há outro problema aqui: o apagão docente. É um problema de todas as sociedades. O desestímulo à profissão docente compromete também o tamanho do sindicato. Muitos professores chegam e não ficam. “Um dos grandes desafios é tornar a profissão mais atrativa para as pessoas permanecerem no magistério durante toda sua vida laboral. Isso passa por garantir uma carreira não precarizada, com boas condições de trabalho e melhores salários. Para isso, é necessário um sindicato forte, mobilizado e de luta. Para um sindicato forte, mobilizado e de luta é necessário que a categoria se interesse tanto pela carreira quanto pelo trabalho sindical. Mas o que temos é um contingente de docentes em contrato temporário de trabalho, com condições precarizadas. Isso gera descontentamento com a carreira e abandono. É um ciclo vicioso e perigoso”, aponta Rosilene.

“Nenhuma diretoria é capaz de responder às demandas se não houver uma categoria forte, mobilizada, organizada, dando sustentação para que os dirigentes possam enfrentar o debate. O que dá força a um sindicato é a mobilização da base da categoria”, lembra o ex-dirigente do Sinpro e atual presidente da CUT-DF, Rodrigo Rodrigues.

Edileuza Fernandes da Silva traz uma reflexão importante para quem está chegando agora: “Precisamos, coletivamente, encontrar e renovar as energias transformadoras e entender que essas energias nascem do antagonismo que existe na sociedade em que vivemos hoje, que é uma sociedade desigual, de exploração do trabalho. Essas energias transformadoras só vão ganhar forma por meio de nossa ação política. E é nesse processo de ação política consciente que poderemos contribuir para as transformações sociais e educacionais que acreditamos. A gente não consegue fazer isso de forma individualizada e fragmentada. Só conseguimos fazer isso coletivamente. O movimento sindical é o lugar dessa construção coletiva.”

Vida longa ao Sinpro DF!

 

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