O Programa Mais Alfabetização e a precarização do trabalho docente no DF
O Governo do Distrito Federal (GDF) pôs em curso uma seleção simplificada para contratação de assistentes de alfabetização que irão atuar nas escolas da rede pública de ensino. Segundo o edital, é para fortalecer e apoiar as unidades escolares no processo de alfabetização.
A contratação será efetivada por meio do Programa Mais Alfabetização, do governo federal. A seleção começou no início de maio e, até o fechamento desta matéria, não havia sido concluída. A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado da Educação (SEEDF) informou que a finalização do processo deverá ocorrer no dia 30 de maio.
O Programa Mais Alfabetização é uma criação do governo federal com possibilidade de adesão ou não das unidades federativas. No Distrito Federal, em vez de convocar os concursados e realizar mais concurso para professor e orientador educacional, bem como construir mais e novas escolas, para atender à demanda, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) aderiu ao projeto do governo federal.
O edital indica que os pleiteantes devem ser graduados ou estudantes de pedagogia ou outra licenciatura. Diz ainda que a contratação não gerará vínculos empregatícios e será fundamentada na lei do voluntariado.
Os assistentes de alfabetização receberão uma ajuda de custo para transporte e alimentação no valor de R$ 150 ou R$ 300 para atuarem nos 1º e 2º Anos do Ensino Fundamental, respectivamente, por 10 horas semanais, caso estejam em escolas consideradas vulneráveis, ou por 5 horas semanais, caso atuem em escolas não vulneráveis.
“Trata-se de uma contratação sem ônus trabalhista, na lógica da reforma trabalhista e da lei da terceirização. Além dos conflitos trabalhistas, irá gerar problemas pedagógicos nas séries iniciais. Esse modelo de contratação tem fortes semelhanças com a condição de trabalho escravo”, compara Letícia Montandon, diretora do Sinpro-DF.
Ela diz que o programa é mais um instrumento do governo federal para introduzir o ensino básico da rede pública na terceirização. “Não é à toa que o governo ilegítimo de Temer pôs em curso, de forma aligeirada, vários ataques à educação pública, tais como a reforma do ensino médio e a lei da terceirização. Também eliminou a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que estava sendo construída democraticamente pela categoria docente e a sociedade civil e impôs outra, redigida nos gabinetes a toque de caixa e aprovada também de forma aligeirada completamente diferente da outra”, denuncia a diretora.
Roberto Tofolli, diretor da Apeoesp em Ribeirão Preto, afirma que é mais um elemento imposto ao país para fragilizar, sucatear e privatizar a educação e, ao mesmo tempo, impor, ao serviço público, a reforma trabalhista e a terceirização das atividades-fins. Ao criar mais uma “categoria” precarizada no setor da educação pública, os governos federal e locais trabalham para alcançar o objetivo privatista.
O Estado de São Paulo viveu experiência semelhante com os governos do PSDB, Geraldo Alckmin e José Serra, e não deu certo. Contrataram qualquer pessoa para exercer as atividades de professor em um programa de alfabetização. Serra queria passar a impressão de que dois professores em sala resolveriam o caso da alfabetização, como que para resolver o problema de o estudante não ter o conhecimento de português e de matemática ao chegar no 5º Ano fosse preciso ter dois professores.
“Ele criou, no 1º ano, o professor auxiliar, que trabalhava do 1º ao 5º ano auxiliando professores efetivos concursados do estado. Eram estudantes de de pedagogia e de licenciaturas que ingressavam no programa como estagiários. Nem recebia salário porque o estágio sem remuneração era disciplina obrigatória”, lembra Tofolli.
No caso de São Paulo, o assistente não precisava ir todos os dias, mas, apenas, uma ou duas vezes por semana, e atuava nos 1º, 2º e 3º anos do ensino básico. O programa era tão ruim que não se sustentou. Não houve aceitação. A Apeoesp pressionou para o governo acabar com essa precarização e realizou várias greves.
“Como para o PSDB e governos neoliberais quanto pior, melhor, para justificar a terceirização, eles aprofundaram a precarização. Tentaram mostrar para a sociedade que a educação pública estava péssima e que tinha de privatizar. Tinha de terceirizar. Diante disso e de outros problemas, em 2013, fizemos uma greve de 3 meses e acabamos com essa história”, conta.
Todavia, os (as) professores (as) do Estado de São Paulo sofrem até hoje as consequências desse “negócio”. “Há mais de 20 anos o PSDB ganha as eleições no Estado de São Paulo, estamos sofrendo até hoje. Nossas condições de trabalho são péssimas. Professores do PEB I ganham R$ 1.776 para trabalhar 25 horas, de segunda a sexta-feira, 6 horas por dia. O piso nacional é R$ 2.256 para trabalhar de 2ª a 6ª por 40 horas”, afirma o sindicalista.
Ele informa que, no Estado de São Paulo, esse tipo de contratação aconteceu por pouco tempo porque o governo viu que não era isso que iria resolver o problema da alfabetização. “Não é isso que vai resolver. A solução é contratar professores formados, concursados, com qualidade, com condições de trabalho e uma quantidade que atenda à demana da população, bem como salas de aula com, no máximo, 25 alunos, e professores com tempo para atuar com qualidade e condições de trabalho, com tempo para estudar e preparar as aulas, com tempo para se reunir, por exemplo, com coordenador pedagógico”, disse.
A diretoria colegiada do Sinpro-DF considera o Programa Mais Alfabetização um ataque à educação pública que aprofunda a precarização do trabalho docente e elimina toda possibilidade de se construir no país uma educação pública, gratuita, laica, de qualidade e socialmente referenciada.
“A partir desta sexta-feira (24), publicaremos no site do Sinpro-DF uma série de matérias sobre o Programa Mais Alfabetização e seus impactos na carreira docente e no ensino básico da rede pública de ensino do Distrito Federal e, assim, pretendemos denunciar mais esse ataque”, informa Cláudio Antunes, coordenador de imprensa do Sinpro-DF.