Secundaristas resistem aos retrocessos da Lei da Mordaça

Quando o projeto fala em respeitar o “direito” dos pais de alunos de que seus filhos recebam a educação religiosa de acordo com as convicções impostas por suas religiões, está implícito, por exemplo, que um professor pode até ser processado por ensinar o evolucionismo de Darwin. Ou então que não poderia tecer críticas ideológicas ao nazismo ao lecionar sobre a Segunda Guerra Mundial. Sendo assim, não é difícil perceber que o autoritarismo na verdade está ao lado de quem tenta emplacar o projeto em nossas escolas.
O avanço do projeto é alarmante. Dentro de um contexto de grande avanço de ideias conservadoras no Brasil, diversos estados vivem o risco de ver a “Lei da Mordaça”, como vem sendo chamada por quem tenta defender a democracia em sala de aula, aprovada. Entre os estados estão Goiás, Ceará, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e o próprio Distrito Federal. Em Alagoas a lei já foi inclusive aprovada. Na Câmara dos Deputados e no Senado, existem também projetos em análise dos parlamentares, como o PLS 193/2016, do senador Magno Malta (PR-ES).
Mas por todo o Brasil, os secundaristas, organizados em Grêmios e também através da Ubes, tem resistido e enfrentando os retrocessos.
Para Camila Lanes, presidenta da Ubes, “o projeto Escola sem Partido expressa o projeto neoliberal de Temer e todos seus aliados de uma forma expressivamente despolitizada e oportunista e tem como objetivo central impedir a democracia e a liberdade de expressão na escola. Defender que os interesses individuais devem ser colocados acima dos interessantes coletivos, que a educação não-formal deve ser priorizada dentro da escola e que a censura como punição para os e as professoras que falem sobre política ou qualquer assunto que envolva em especial as lutas movimento sociais dentro da sala é claramente a pauta de um movimento que tem base apenas nas redes sociais, que não está interessado em defender e debater sobre as reais necessidades da educação pública brasileira”.
A dirigente ainda citou a recente “conquista” desse movimento ao garantir que a obrigatoriedade em respeitar os direitos humanos na redação do ENEM fosse anulada, para Lanes, “essa ação mais uma vez representa os reais interesses desse projeto e movimento, que é garantir que toda uma geração seja educada de forma desumana e precária. Nós do movimento estudantil temos enfrentado uma série de ataques, desde as ocupações quando fomos totalmente criminalizados, desde lá temos participado assiduamente de sessões em todos as instâncias políticas para garantir que este projeto não avance”.
No site do projeto “Escola sem Partido”, são citados municípios onde o projeto estaria em tramitação na Câmara de Vereadores. Atualmente as seguintes cidades compõe essa lista: São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Curitiba (PR), Palmas (TO), Joinville (SC), Santa Cruz do Monte Castelo (PR), Toledo (PR), Foz do Iguaçu (PR), Vitória da Conquista (BA) e Cachoeiro do Itapemirim (ES).
Maiara Oliveira, secretária de organização da UJS do Paraná, estado onde o projeto tramita em quatro cidades e mais na Assembléia Legislativa, coloca que “assim como a Reformulação do Ensino Médio, a Lei da Mordaça vem pra destruir todas as conquistas dos últimos anos na busca por uma escola democrática, inclusiva e que respeite a diversidade da sociedade”, e reforçou também que a UJS paranaense estará presente em todos os debates para resistir aos retrocessos que tentam implementar.
Já em São Paulo, o presidente da UPES, Emerson Santos (Catatau), aponta que “tratam nós, estudantes, como vulneráveis e incapazes de ter opinião ou formular nossas próprios pensamentos, e buscam perseguir os professores e o real sentido do aprendizado. Totalmente contrário ao que demonstramos com as ocupações e ao sentido que a escola deve ter de possibilitar ideias divergentes que promovam uma sociedade plural que respeita a diversidade cultural e social. Nossa mobilização acerca do tema já renderam vitórias importantes ao movimento em defesa da democracia na escola, como o recente arquivamento do projeto na Câmara de Santo André”. O dirigente estudantil nos contou também que está sendo construída uma “frente ampla na ALESP contra este projeto, a partir de uma manifesto que contará com assinaturas de entidades e movimentos da educação, afim de travar o debate com toda comunidade e os defensores de uma educação de qualidade e verdadeiramente democrática, sem Leis de Mordaça e censura contra a liberdade de expressão e diversidade de ideias”.
No Rio de Janeiro, outra cidade onde o projeto passou pela Câmara de Vereadores, Isabela Queiroz, presidenta da Ames-RJ e estudante do Colégio Estadual Amaro Cavalcante, exemplifica que “até a eleição para delegados do Congresso da Ubes foi uma grande conquista, porque mesmo a direção, que é progressista, quase proibiu a atividade por conta dos ataques dos defensores do Escola sem Partido. Assim como pautar, debates, fazer outras atividades dentro das escolas, tem sido um grande enfrentamento ao Escola sem Partido”. A estudante carioca conta que desde o ano passado, no Rio de Janeiro, “promovemos caravanas culturais e uma das principais campanhas foi a caravana “Escola sem Mordaça”, que começou no Dia do Estudante, do ano passado, numa atividade de rua como se fosse um sarau e que passou por diversas escolas debatendo o projeto “Escola sem Partido” e explicando o que isso acarreta na sociedade e na luta por um ensino e por um país mais democrático e relacionando isso tudo com a conjuntura nacional, mas de uma forma mais lúdica, de um jeito que conseguisse trocar essa ideia sobre censura, democracia e política com os estudantes de uma forma que dialogasse mais. Teve grafite nas escolas, realizamos rodas de rima e sarau de poesia”.
A luta contra o autoritarismo do projeto “Escola sem Partido”, a Lei da Mordaça, está só começando, mas os secundaristas mais uma vez se mostram prontos para a batalha com muita resistência e criatividade, para dessa forma fazer com que mais esse retrocesso seja barrado!
(do Vermelho)