Lei Antiterrorismo colocará Brasil na escalada repressiva internacional contra direitos

A chamada Lei Antiterrorismo é uma séria ameaça aos direitos individuais e ao estado democrático de direito. “No plano da teoria do Estado, estamos avançando rapidamente para a deterioração absoluta do regime democrático”, afirmou o jurista Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, em seminário promovido pelo Fórum 21 sobre o tema, realizado hoje (11) na Assembleia Legislativa de São Paulo. “A Lei do Antiterrorismo é pura importação de medidas de exceção de modelagem europeia, que foi transferida ao Brasil sem necessidade. Se na Europa é ruim, aqui vai ser terrível, porque aqui nós temos o Judiciário como agente de exceção”, disse Serrano.
Para Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da PUC-SP, a incorporação de países, principalmente com a importância do Brasil, entre aqueles que adotam medidas nesse âmbito “faz parte da estratégia dos Estados Unidos”. “O Brasil entrou na órbita dessa preocupação. A forma como o Brasil vai lidar com isso é considerada importante”, avalia Nasser.
Márcio Sotelo Felippe, ex-procurador-geral do estado de São Paulo (de 1995 a 2000, no governo de Mário Covas), afirmou que “o projeto traz grave risco à democracia”. “Tanto que, nas justificativas, faz referência aos compromissos internacionais do Brasil.”
O grande problema de tal legislação é que, diante da dificuldade de se conceituar o que é terrorismo, a interpretação caberá a agentes públicos como policiais, promotores e juízes. Segundo o artigo 2° do projeto, “terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos de atos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública”.
O perigo dessa previsão, avalia Felippe, é a ampla possibilidade de interpretação pelas autoridades. “O que é ‘terror generalizado’? Essas conceituações ‘abertas’ permitem a interpretação que for mais conveniente ao policial, ao promotor ou ao juiz. Terror generalizado pode ser um coquetel molotov? Pode ser a bomba de Hiroshima?”, ironiza.
A adoção, pelo Brasil, de medidas “de exceção” como a Lei Antiterrorismo não é casual. “Hoje se dissemina no mundo um crescimento da direita contra movimentos sociais”, constata Felippe. Ele cita a chamada Lei da Mordaça, da Espanha, que fala em “segurança da sociedade”. “Estamos diante de uma escalada repressiva em âmbito internacional.” Para ele, o fato de o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) ter sido o relator do projeto no Senado é sintomático, assim como é estranho que a proposta seja de iniciativa do Executivo e, mais estranho ainda, do Ministério da Fazenda, e não da Justiça, como seria de se esperar.
O PLC 101/2015, já aprovado no Senado, precisa ser novamente votado na Câmara. Proposto pelo Executivo, o projeto relatado por Aloysio Nunes ficou ainda mais preocupante após passar no Senado dia 28 de outubro por 38 votos favoráveis e 18 contra.
Pelo texto aprovado na Câmara, estavam excluídas da tipificação de terrorista “pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios”. No texto original, ficavam fora da tipificação de terrorista “pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais”.
Aloysio retirou a exceção aos movimentos sociais do texto. Isso significa que um movimento de rua ou um protesto, caso a lei entre em vigor, pode ser enquadrado como “terrorismo”, de acordo com os debatedores no seminário do Fórum 21.

História

Pedro Serrano acredita que, enquanto no século 20 as ditaduras eram implementadas por meio de “formas de governos com pretensão de provisoriedade”, no século 21 as medidas de exceção são adotadas “no interior da democracia”, como, por exemplo, por meio de leis ou da atuação do Judiciário. “Marcadamente depois do 11 de setembro, com o Patriot Act (adotado pelo governo norte-americano de George W. Bush), sob o pretexto de combater o inimigo muçulmano.”
Segundo Serrano, “hoje, no primeiro mundo, o que se observa são atos legislativos que se traduzem em medidas de exceção, as quais, a título de combater o inimigo, têm o condão de suspender os direitos humanos fundamentais.” O Brasil caminha nesse sentido, avalia.
(Do Rede Brasil Atual)