Escola supera abandono, reorganiza gestão e vira referência no Distrito Federal
Uma reportagem do Correio Braziliense, publicada em 9 de dezembro, destacou que o Centro Educacional nº 104 do Recanto das Emas (CED 104) recebeu reconhecimento da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) em sessão solene realizada em 1º de dezembro, por iniciativa do deputado distrital Gabriel Magno (PT).
O tributo se deve ao processo de transformação conduzido por professores(as) e gestores(as), que recuperaram a escola após anos que figurava entre as piores do país. Em 2011, a unidade enfrentava altos índices de reprovação e de abandono. Este ano, 14 anos depois de constatado esse quadro, e graças ao empenho contínuo da equipe, o cenário foi completamente revertido por meio de ações estruturadas e políticas pedagógicas consistentes.
Se em 2011 a reprovação e a evasão definiam o perfil da escola, hoje, o CED 104 figura entre uma das melhores escolas do país, que coloca, por ano, cerca de 30 estudantes na Universidade de Brasília (UnB). A reviravolta passou por ações instituídas pelo diretor Sergio Elias Carvalho, que administrou a escola entre 2012 e 2015. O processo de reconstrução pedagógica permaneceu e, a partir de 2020, passou a ser conduzida pelo professor Felipe Renier Maranhão Lima, que assumiu como diretor.
Militarização: a falsa sensação de segurança e disciplina
Mestre em ensino de física e professor da disciplina, ele começou na escola em 2014 e atuou como professor até 2017. Entre 2018 e 2019, ele foi coordenador. Desde 2020 atua como diretor e afirma que, no CED 104 do Recanto, a equipe de educadores(as) não acredita que seja necessária a militarização para reverter indisciplina entre estudantes.
Felipe é categórico: “Nós, do 104, não acreditamos nisso. A gente sabe que é possível ter uma organização dentro da escola, apesar de a gente ter consciência de que temos outra escola pós-pandemia de covid, mas que continua dando resultado e cada vez mais impactando na vida dos estudantes. A militarização não é necessária e não consigo visualizar em que contexto realmente precise da militarização”, afirma o diretor. Ele destaca que as conquistas de hoje nasceram de um trabalho contínuo iniciado há mais de uma década. “Práticas pedagógicas consistentes e projetos contínuos têm mostrado resultados muito mais efetivos do que a militarização”, assegura.
A transformação da escola começou em 2011, quando a instituição ainda registrava altos índices de reprovação, abandono e problemas estruturais de convivência, como indisciplina. O cenário começou a mudar com a valorização da gestão democrática e a chegada do diretor Sérgio Elias Carvalho, professor de língua portuguesa, e da vice-diretora Dilce Eça, também professora de língua portuguesa, que assumiram em 2012 dispostos a enfrentar as dificuldades históricas da unidade.
O professor Felipe — que vivenciou o período e acompanhou parte das ações ao lado de supervisores, como o professor de física Paulo Henrique Cruz —, conta que a escola passava por um momento crítico, com desgaste do patrimônio, conflitos disciplinares constantes e pouca participação dos(as) estudantes. “Foi um trabalho de bater de frente com aquela situação para ver o resultado acontecer”, relembra.
“Essa experiência mostrou que, para os nossos estudantes do 104, não é necessária a presença da PM em momento algum. O ingresso na UnB ocorre, majoritariamente, pelo Programa de Avaliação Seriada, o PAS, embora alguns estudantes entrem também pelo Enem. O PAS é o nosso principal caminho porque envolve um preparo contínuo ao longo dos 3 anos. Sabemos da importância do Enem, mas reconhecemos que muitas famílias têm compreendido, cada vez mais, o papel dessa preparação antecipada, construída também com o apoio das escolas de ensino fundamental”, conta Felipe.
Ele informa que a escola realiza um projeto de transição para conscientizar os(as) estudantes sobre o espaço que vão ocupar no primeiro ano do Ensino Médio e sobre a mudança de mentalidade necessária para o ingresso em uma universidade pública e de qualidade — sem o sacrifício de arcar com mensalidades.
“Nosso trabalho não é transformar a escola em um grande pré-vestibular: temos estudantes que empreendem e trilham diferentes caminhos. Oferecemos a formação básica que consideramos adequada para a vida e para os vestibulares. É esse o projeto sonhado por educadores(as), como Sérgio Elias e Adil Ciesa, e que seguimos cultivando com um corpo de professoras e professores, coordenação, direção e orientação educacional que acreditam no poder da educação pública de qualidade”, diz.
Valorização do espaço e enfrentamento da indisciplina
As primeiras ações da nova gestão focaram na recuperação e valorização do patrimônio e na reorganização do ambiente escolar. Uma pintura mais colorida e acolhedora foi aplicada nos prédios, ao mesmo tempo em que regras básicas de funcionamento foram reforçadas. Houve controle rígido de horários, tanto para estudantes quanto para professores(as), e alguns estudantes tiveram de ser transferidos em razão das reincidências de indisciplina.
O acompanhamento mais próximo dos(as) estudantes também passou a integrar a rotina da escola. Conversas individuais, atendimentos frequentes e o uso de carteirinhas para controlar entradas e saídas ajudaram a recuperar o clima organizacional.
Perfil dos estudantes e novos horizontes
Com a melhora do ambiente escolar e o fortalecimento da reputação da instituição, o perfil dos(as) estudantes também mudou. Segundo Felipe, muitos(as) jovens procuram a escola motivados(as) pelo desejo de entrar na universidade e ocupar espaços antes distantes da realidade daquela comunidade escolar. Ainda assim, a heterogeneidade permanece, marcada pela presença de estudantes em situação de vulnerabilidade — característica típica da rede pública. A escola atende a estudantes de 14 a 20 anos e não realiza seleção: as vagas são distribuídas entre duas unidades sequenciais e, quando há excedente, são ofertadas à comunidade.
Pertencimento e resultados
A transformação da escola também passou pelo estímulo a projetos que fortalecem o vínculo dos(as) jovens com o espaço escolar. Desde 2014, ações como o Pré-Enem Solidário em que os(as) professores(as) dão os tradicionais aulões pré-vestibulares à noite e que já integravam a rotina. Hoje, festivais de dança, Feiras de Ciências e torneios esportivos — como o Interclasse — ampliam o sentimento de pertencimento e contribuem diretamente para a redução da indisciplina e para a melhoria dos indicadores educacionais. “O pertencimento é o principal ponto para melhorar os índices”, finaliza Felipe.
