Com desgoverno e economia em crise, medo do desemprego atinge 67% dos brasileiros
Lucas Guilherme Cena, 23 anos, funcionário de uma loja de calçados em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, está trabalhando, mas tem medo de ficar desempregado. Ele teve o salário reduzido durante o isolamento social para conter a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) e mesmo depois da reabertura da economia não tem certeza de que seu emprego está garantido.
“Eu continuei empregado, mas alguns colegas foram demitidos. A gente não vê aquele movimento que tinha antes e o que se fala dentro da loja é que precisa cortar gastos”, diz Lucas se referindo ao temor de – mais cedo ou mais tarde – entrar para a lista dos desempregados, que já atinge quase 14 milhões de trabalhadores e trabalhadoras, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A angústia de Lucas é a realidade de 67% dos trabalhadores e trabalhadoras. De cada três brasileiros, dois estão pessimistas e acreditam que o desemprego vai aumentar nos próximos tempos. É o que mostra um estudo feito pela Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), divulgado pelo jornal Folha de S Paulo.
A longa estagnação da economia, que ‘patina’ desde o golpe de 2016, e se agravou com a pandemia e a falta de medidas por parte do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL), que em quase dois anos de mandato não apresentou uma proposta sequer de desenvolvimento econômico, é sentida pelos brasileiros que pagam a conta da crise, avalia o secretário de Relações do Trabalho da CUT, Ari Aloraldo do Nascimento.
Desde 2016, lembra o secretário, as taxas de desemprego não são inferiores a 10%. Com Bolsonaro, dispararam para mais de 14% e nada foi feito para reverter a situação.
“Desde o início do mandato, as ações do governo Bolsonaro têm se sido insuficientes para alavancar a economia e, em alguns casos, pior que isso: são contrárias ao desenvolvimento”, diz o secretário.
“A redução de gastos sociais do governo, o não cumprimento da regra de valorização do salário mínimo, o desmonte da previdência são fatores que demonstram a política desastrosa que vivemos e que penaliza os trabalhadores. A pandemia somente intensificou o processo”, completa Ari.
E o cenário não deve melhorar. De acordo com o economista da subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos da CUT, Clovis Scherer, a taxa de desemprego, que hoje está em 14,4%, tende a aumentar porque muitas pessoas perderam o emprego durante a pandemia e não buscaram uma nova colocação no mercado de trabalho.
“Esses trabalhadores deixam a condição de ‘inativos’ e passam para a de desempregados. Sem uma recuperação da atividade econômica, o resultado vai ser de muitas pessoas procurando emprego sem demanda de trabalho para absorver essa mão de obra”, diz o economista.
De acordo com a metodologia do IBGE, se uma pessoa está sem trabalho, mas não procura emprego, por medo da Covid-19, ela não é computada como desempregada.
Segundo Clóvis, o setor serviços, maior empregador, tem vários segmentos que ainda não apresentam bons sinais de retomada. “Isso pode demorar a acontecer, então a perspectiva não é muito animadora” ele conclui.
Expectativa X realidade
O economista do Dieese vê uma grande incerteza sobre uma melhora no mercado de trabalho. “Depende da vacinação, quando ela ocorrerá, e da condução da política econômica a partir de janeiro. Isso porque não se sabe se o governo vai manter medidas de estímulo”.
Uma dessas políticas é o auxílio emergencial. Resultado da luta da CUT, partidos de oposição e movimentos sociais tem data marcada pelo governo Bolsonaro para terminar. O governo já reduziu para R$ 300,00 e dezembro deve ser o último mês do programa.
O auxílio emergencial garantiu renda para o sustento de mais de 60 milhões de brasileiros durante a pandemia. Clovis Scherer afirma que o fim do programa vai obrigar mais trabalhadores, em especial os mais pobres, a saírem do isolamento para buscar uma colocação no mercado.
Tanto o auxílio emergencial quanto outros programas de transferência de renda, como o Bolsa-Família, dependem do teto de gastos (EC-95), que será uma barreira a essas medidas.
“É compreensível, portanto, que as pessoas estejam pessimistas tanto em relação ao emprego quanto em relação ao consumo. O teto dos gastos influencia na execução de obras e programas sociais, que resultam em maior movimentação econômica e consequente aumento de demanda e de empregos”, diz Clovis.
Para Ari Aloraldo, o pessimismo dos brasileiros “mostra que as pessoas começam a sentir na pele a visão elitista do Estado, que faz de tudo para os mais ricos enquanto que para os mais pobres são desmontadas as políticas deixando-os à deriva, lutando para suprir necessidades”.
Outros dados
A pesquisa “Perspectivas 2020: Expectativa dos Brasileiros com o Cenário Político & Social” mostra que em outubro do ano passado, menos pessoas demonstravam pessimismo em relação ao futuro no trabalho. O percentual era de 55%.
Dos 2.000 entrevistados, apenas 18% dizem estar tranquilos sobre estabilidade no emprego. Outros 59% dizem estar preocupados e 23% já estão desempregados.
O estudo mostra ainda o nível de satisfação com a economia. Levando em consideração a soma entre ruim e péssimo, a avaliação sobre a condução da economia pelo governo é negativa. Mais da metade da população não está satisfeita.
Boa: 9%
Regular: 38%
Ruim: 32%
Péssima: 19%
Edição: Marize Muniz
Fonte: CUT