Arte, memória e resistência: CED 02 do Cruzeiro vive duas noites dedicadas à Consciência Negra

Duas noites de intensa vivência cultural marcaram a culminância do projeto pedagógico da escola sobre o Mês da Consciência Negra no 1º Segmento da Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Centro Educacional número 02 do Cruzeiro (CED 02 do Cruzeiro). Construída em consonância com a Lei nº 10.639/03 e com o Currículo, a atividade, realizada nos dias 27 de novembro e 1º de dezembro, mobilizou professores(as) e estudantes do turno noturno em uma programação sensível e profunda, batizada de “Negritude na noite”.
“Foi profundamente emocionante, como representante da categoria no Sinpro e coordenadora do Segmento da EJA nesta escola, acompanhar de perto esse trabalho. Nas duas noites, vi diante de mim a materialização não apenas de legislações, mas do próprio propósito social da educação antirracista, revelado nas atividades desenvolvidas com tanto cuidado e competência pedagógica pelo grupo de professores e professoras do Segmento. Para o Sinpro, dar visibilidade a pautas tão potentes é essencial para nossa atuação e para a valorização da categoria”, afirma Regina Célia, diretora do Sinpro.
Culminância: programação com raízes africanas
Ao longo deste ano, professores e professoras trabalharam atividades escritas, produções artísticas, rodas de conversa e reflexões sobre a presença africana no Brasil, a necessidade permanente de uma educação antirracista e a força estética, histórica e cultural do legado negro. Esse percurso resultou em dois encontros cheios de beleza, diálogo e ancestralidade, que marcaram a culminância do projeto.
A atividade final contou com a participação das professoras Ana Kátia, Francisca de Sales e Simone Komazawa Fernandes, que apresentaram projetos antirracistas desenvolvidos na Escola Classe número 05 do Cruzeiro (EC 05 do Cruzeiro). Logo após a oficina de confecção de Abayomis, conduzida pelas convidadas. A professora Simone apresentou aos(às) estudantes o livro “As tranças de Beatriz”, lançado recentemente.
A programação também incluiu um cardápio repleto de referências à culinária africana. Os(as) participantes puderam saborear angu, preparado com temperos usados em diversos países do continente, bolo de paçoca — já que o amendoim é ingrediente fundamental em pratos doces e salgados —, doce cremoso de amendoim, chá de hortelã fresca e sucos naturais. Os sabores fizeram grande sucesso entre estudantes, professores e convidadas.
Um dos momentos mais emocionantes aconteceu quando os(as) estudantes entraram no espaço trazendo seus trabalhos de arte e língua portuguesa, reunidos em cartazes, embalados pela música “Canto das três raças”, eternizado pela cantora Clara Nunes. A emoção se repetiu quando ecoou a música “Tereza de Benguela”, de Mestre Barrão, relacionada ao totem produzido pelos(as) estudantes com a professora, em homenagem à líder quilombola.
A segunda noite abriu com um vídeo contextualizou o rapto do povo negro, o papel das políticas sociais reparatórias e os desafios atuais, gerando novos diálogos entre estudantes e equipe pedagógica. Em seguida, foi realizado o Bingo Africano, um jogo educativo que apresentou palavras de origem africana comuns no vocabulário brasileiro, como “muvuca”. Além de ilustrações e significados, o bingo distribuiu prendas diversas organizadas pelos(as) professores(as).
A decoração da escola também foi destaque. Tecidos africanos, roupas penduradas em cabides, trabalhos dos(as) estudantes do CED 02 e peças emprestadas pela Escola do Parque da Cidade-PROEM (EPC-PROEM)— que atende a adolescentes em situação de vulnerabilidade — compuseram um ambiente sensível e potente. Entre as obras emprestadas, destaque para as telas com pinturas de mulheres negras com trajes de peças tradicionais e jarros de papelão pintados com grafismos africanos.

Referências africanas
A professora do 1º Segmento da EJA no CED 02 do Cruzeiro, Evillin Neves, disse que o “Negritude na noite” foi um tema necessário. “Nessa temática foram elaborados cartazes, murais, totens, bingo com palavras do tema trabalhado, vídeos que ilustraram a representatividade negra. As discussões sobre a percepção dos alunos foram de extrema importância para o entendimento do tema. Acredito que ações como essa são essenciais”.
Evillin enfatiza que “para muitas alunas e muitos alunos negros essas apresentações são um momento de reconhecimento e valorização de suas próprias histórias e identidades, o que foi percebido positivamente por nós, educadores. Para alunos não negros, foi uma oportunidade de aprender sobre a rica contribuição da cultura africana na construção do Brasil e para se engajarem nessa luta que é de todos”.
A professora de Atividades readaptada, atualmente no acompanhamento pedagógico e na Sala de Leitura na EC 05 do Cruzeiro, Simone Komazawa, pontua que a realização de atividades, como o “Negritude na noite”, colaboram para uma educação antirracista, formam cidadãos e cidadãs críticos e promovem uma sociedade mais justa. “Tal atividade vai além da data do 20 de novembro, trata-se de um compromisso diário com a identidade e a história de todos nós afro-brasileiros. A escola não é só um espaço de aprendizagens acadêmicas, mas também de aprendizagens mútuas”, pontua a professora Simone.
Ela observa que, “diante da Lei nº 10.639/03, é nosso dever, como professoras e professores, combater o racismo nas escolas, pois esse espaço é também um espaço hostil e violento em que vemos acontecer práticas de racismo cotidianamente, tornando assim nossos estudantes negros e negras não participantes de nossas atividades, levando até mesmo à evasão escolar desse grupo. Ao participar do ‘Negritude da noite’, me emocionei ao ver os estudantes, senhoras e senhores, em uma só voz dizer: ‘Racismo é crime!’ Nós, do Grupo Cultural Histórias de Griô, ficamos felizes demais por ter sido convidadas para participar desse momento tão rico”, declarou.
Fortalecimento de memórias
Para além da pauta sindical, a atividade também tem significado especial para a coordenação pedagógica do 1º Segmento da EJA, que acompanhou de perto a construção coletiva do projeto e reforça sua importância na formação crítica e cidadã dos(as) estudantes.
“As duas noites de “Negritude na Noite” deixaram um registro afetivo, político e pedagógico na comunidade escolar, reafirmando que a educação é um dos principais caminhos para combater o racismo, valorizar identidades e fortalecer memórias que sustentam a história do Brasil”, finaliza Regina Célia.
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