Bolsonaro pede desculpas, diz que não queria golpe e faz convite a Moraes

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Alexandre de Moraes ouve depoimento do ex-presidente Bolsonaro

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em seu depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (10), no segundo dia em que o ministro Alexandre de Moraes ouve os réus acusados de tentar um golpe de Estado contra a democracia, afirmou que os impropérios e as falsas acusações contra os ministros da Corte de que teriam recebido de R$ 30 a R$ 50 milhões para fraudarem as eleições nada mais eram de que “retóricas” .

“Não tem indícios nenhum, senhor ministro. Tanto é que era uma reunião para não ser gravada. Um desabafo, uma retórica que eu usei. Se fossem outros três ocupando, teria falado a mesma coisa. Então, me desculpe, não tinha qualquer intenção de acusar de qualquer desvio de conduta os senhores três”, respondeu Bolsonaro.

O ex-presidente tentou desanuviar o interrogatório e chegou a brincar oferecendo ao ministro Alexandre de Moraes uma vaga como candidato à vice em sua chapa numa eleição presidencial, o que o ministro declinou. Bolsonaro está inelegível por oito anos.

Ele, no entanto, caiu em contradição ao admitir que discutiu com auxiliares e comandantes militares “alternativas dentro da Constituição” para tentar reverter o resultado das eleições de 2022, vencidas por Lula.

“Era conversa informal para ver se existia alguma hipótese de um dispositivo constitucional para a gente atingir o objetivo que não foi atingido no TSE”, disse.

Ao responder ao ministro Luiz Fux sobre ter recebido voz de prisão do ex-comandante do Exército Freire Gomes durante reunião com os comandantes das Forças Armadas para apresentação de estudos sobre a adesão das tropas à tentativa de golpe, em 2022, ele negou.

“As Forças Armadas sempre primaram pela disciplina e hierarquia. Aquilo falado pelo brigadeiro Baptista Júnior não procede, tanto é que foi desmentido pelo próprio comandante do Exército. Se dependesse de alguém diferente para levar avante um plano ridículo desse, eu teria trocado o comandante da Aeronáutica”, afirmou, “desmentindo” o ex-comandante da Aeronáutica Baptista Júnior, que estava numa das reuniões que tramavam o golpe. No mês passado, ao prestar depoimento como testemunha no processo, o general Marco Antônio Freire Gomes negou que tenha dado voz de prisão a Jair Bolsonaro durante a referida reunião. 

Sobre o Pix recebido por seus apoiadores que somou R$ 18 milhões, Bolsonaro riu e olhando para seus dois advogados, que também riam, o ex-presidente falou abertamente que “não pode trabalhar de graça” e justificou por que “merece” a verdadeira fortuna que recebeu de seus apoiadores e que é alvo de várias especulações com relação à utilização de tais montantes.

“E aí eu falei pra esse amigo que eu só tinha uma forma de arranjar essa grana… [Seria] fazendo besteira, e não vou fazer… Se não fosse a campanha de Pix, que eu não fiz, eu estaria [incompreensível] hoje em dia… R$ 17 milhões, depois teve um pingado e chegou a R$ 18 milhões, e a gente gasta… Eu não posso trabalhar de graça”, relatou às gargalhadas.

“Então, se não fosse [o dinheiro do Pix] eu não teria como ajudar meu filho também, e é outra história isso aí, ou seja, eu agradeço… E eu acredito que arrecadei mais dinheiro que o Criança Esperança, e é porque o pessoal gosta da gente”, continuou.

Recentemente, Bolsonaro admitiu num depoimento à Polícia Federal que deu R$ 2 milhões diretamente ao filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, nos Estados Unidos.

Além de Jair Bolsonaro foram ouvidos hoje o ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Heleno, o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres e o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, que começou a depor no final da tarde.

Resumo do que disseram os réus pela manhã

O ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, denunciado por suspeita de colaboração com a suposta trama golpista, negou as acusações que a Procuradoria-Geral da República (PGR) lhe atribui – dentre elas, a intenção de mobilizar o efetivo da Marinha em apoio a qualquer iniciativa que buscasse impedir o candidato eleito Luiz Inácio Lula da Silva de tomar posse em 1º de janeiro de 2023.

Garnier afirmou que se ateve ao seu papel institucional ao participar de reuniões no Palácio do Planalto, nas quais o ex-presidente da República Jair Messias Bolsonaro teria discutido o resultado das eleições presidenciais de 2022 e um suposto plano de golpe de Estado com os então chefes das Forças Armadas e integrantes da equipe de governo.

Ainda de acordo com Garnier, foram apresentados alguns tópicos e considerações acerca da possibilidade de decretação de uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem), mas nenhuma minuta ou documento que conferisse alguma legalidade à proposta.

“Eu não vi nenhuma minuta. Não recebi nenhum documento, nenhum papel. Vi uma apresentação na tela de um computador. Lembro que o conteúdo dizia respeito à pressão popular nas ruas, considerando que havia insatisfação, pessoas nas portas dos quartéis e alguma coisa de caminhoneiros. Também havia algumas considerações acerca do processo eleitoral. Talvez, alguma coisa ligada à forma como as questões eleitorais aconteceram. Mas não me lembro dos detalhes”, disse Garnier. 

Ele negou ter dito, na ocasião, que as tropas da Força Aérea Brasileira (FAB) estariam à disposição de Bolsonaro, conforme o ex-comandante da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Baptista Júnior contou em depoimento à PF. Leia mais na Agência Brasil.

O segundo a depor foi o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres. Um dos primeiros pontos questionados pelo ministro Alexandre de Moraes foi uma reunião ministerial realizada em 5 de julho de 2022 na presença de Jair Bolsonaro. Na ocasião, Torres teria dito que “todos vão se f…” caso o ex-presidente perdesse as eleições. Sobre o assunto, o ex-ministro afirmou que faltou “com a polidez”. “O que queria era pedir empenho de todos, dentro de suas pastas, [que] pudessem demonstrar todas as entregas, para que a gente se unisse para ganhar a eleição”, disse Torres. 

Anderson Torres também reconheceu que o Ministério da Justiça não encontrou indícios de fraudes no sistema eleitoral ao falar sobre um relatório da Polícia Federal (PF) e a segurança das urnas eletrônicas durante uma live em julho de 2022, no Palácio da Alvorada, ao lado do ex-presidente. 

“No âmbito do Ministério da Justiça propriamente dito, sem ser através da Polícia Federal, não temos setor, nem área nenhuma que trabalhe com essa questão de urnas eletrônicas. Tecnicamente falando, não temos nada que aponte fraude nas urnas. Nunca chegou essa notícia até mim”, afirmou Torres.

“Quando era questionado pelo presidente [Bolsonaro] e por qualquer autoridade, eu sempre passei isso: não tínhamos tecnicamente nada a dizer sobre as urnas eletrônicas. O material que tive acesso eram sugestões de melhorias às urnas eletrônicas”, declarou o ex-chefe da Justiça. “Eu nunca questionei a lisura do processo eleitoral. Todas as minhas falas foram sugestões técnicas de melhorias.”

Outro assunto foi a chamada minuta de um decreto golpista, encontrada na casa de Anderson Torres. Repetindo o depoimento que deu anteriormente à PF, Torres afirmou que o documento foi parar em sua casa por uma “fatalidade” e que não tratou do assunto com Jair Bolsonaro. Ele também respondeu aos questionamentos sobre as operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF),que visavam impedir que eleitores do Nordeste chegassem aos locais de votação, por ser uma região favorável ao presidente Lula. Leia mais no Brasil de Fato.

Por último o general Heleno se recusou a responder as perguntas feitas pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes e respondeu apenas ao que lhe foi perguntado pelo seu próprio advogado. A lei brasileira permite que o réu fique em silêncio.

Ao seu advogado, o general Heleno negou ter contribuído com a tentativa de descredibilização do sistema eleitoral com o intuito de desmoralizar o processo e manter governo Bolsonaro no poder. No entanto, afirmou não ter questionado o resultado das urnas, apesar de ser a favor do voto impresso.

Com informações do G1