Encontro nacional traça estratégias para fortalecer CIPAs e combater precarização

A Fundacentro em parceria com sete centrais sindicais, entre elas a CUT, promoveu o Encontro Nacional de Cipeiros e Cipeiras para o Trabalho Seguro e Saudável, evento que teve a participação de centenas de pessoas presencialmente e mais de 350 de forma online. O evento debateu os desafios enfrentados pelas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAs) e traçou propostas para fortalecer sua atuação em um contexto marcado por precarização, assédio e subnotificação de acidentes.
A iniciativa foi marcada pela construção coletiva entre entidades como CUT, CTB, UGT, Força Sindical, Nova Central, CSB e Intersindical. Ao longo do evento, cipeiros denunciaram a falta de apoio institucional, a sobrecarga de trabalho, a perseguição patronal e a invisibilização de problemas como o adoecimento mental e o assédio moral nos ambientes de trabalho.
O Secretário-Geral da CUT Nacional, Renato Zulato, destacou na abertura do encontro a importância do fortalecimento das CIPAs para garantir ambientes de trabalho mais seguros e saudáveis:
“Nos reunimos com muita disposição, coragem e responsabilidade para participar do 1º Encontro Nacional de Cipeiros e Cipeiras para o Trabalho Seguro e Saudável, promovido pela Fundacentro, em parceria com as centrais sindicais. Nosso objetivo consiste em fortalecer a atuação das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e de Assédio – as CIPAs – e, com isso, avançar na construção de ambientes de trabalho mais seguros, saudáveis, livres de assédio e que respeitem, verdadeiramente, a dignidade da classe trabalhadora”, disse o dirigente.
Renato ainda destacou, no encontro, que CUT tem compromisso histórico com a defesa da vida, da saúde e da integridade física e mental da classe trabalhadora. Para isso, investe na formação de cipeiros, atua na revisão das Normas Regulamentadoras e mantém diálogo com suas instâncias em todo o país.
“Proteger a saúde dos trabalhadores é um ato de resistência e uma posição política frente à lógica do lucro acima da vida”, disse, citando que há uma pesquisa feita pela CUT e pelo DIEESE que mostra que as CIPAs já representam quase metade das estruturas de representação nos locais de trabalho da base da Central.
CUT denuncia obstáculos e propõe fortalecimento da CIPA
Para Josivânia Pereira, secretária nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora da CUT, a CIPA é o maior e mais estratégico instrumento de representação dos trabalhadores no local de trabalho. “É um espaço fundamental para a promoção da saúde e segurança”, afirmou. Josivânia, no entanto, apresentou um diagnóstico preocupante: empresas tratam a CIPA como obrigação burocrática, sem compromisso com a prevenção, e cipeiros enfrentam dificuldades cotidianas, como a falta de recursos básicos, ausência de respaldo da gestão e perseguição de trabalhadores atuantes.
Entre os relatos colhidos junto a cipeiros da base CUTista, destacam-se a falta de tempo e sobrecarga de trabalho, que inviabilizam a participação efetiva; o assédio institucional e práticas antissindicais; a desvalorização da CIPA, que frequentemente não tem autonomia para implementar ações; e a inexistência de CIPA´s mesmo em empresas onde sua criação é obrigatória por lei.
Josivânia defendeu ainda a revalorização da história das CIPAs e seus militantes, e destacou que sindicatos devem ser acionados sempre que empresas se recusarem a reconhecer riscos ou impedir investigações sobre adoecimentos e acidentes. “Se necessário, o Ministério Público do Trabalho deve ser acionado para garantir os direitos dos trabalhadores”, afirmou.
Atuação
No encontro, Josivania, , apresentou um panorama com a atuação da Central, os desafios e as demandas sobre o tema. “A CIPA, pilar fundamental para a saúde e segurança nos ambientes de trabalho, enfrenta um cenário de desafios crescentes. Aqui a gente faz um alerta e apresenta propostas para fortalecer a atuação da CIPA e garantir ambientes de trabalho mais seguros e dignos”, disse a dirigente sobre sua participação.
Para a CUT a CIPA é um espaço fundamental para a promoção da saúde e segurança e o maior instrumento de representação dos trabalhadores nos locais de trabalho. Contudo, relatos de cipeiros de diversas áreas de representação da Central indicam um cenário preocupante.
As principais dificuldades enfrentadas pelos membros da CIPA, conforme apontou Josivânia, impactam diretamente sua efetividade:
- Limites Institucionais e Perseguição Patronal: Cipeiros atuantes que insistem no cumprimento de medidas de proteção são frequentemente perseguidos. Há um medo real de perda do emprego devido a práticas antissindicais, o que leva a uma atuação com medo, autocensura ou desmotivação.
- Sobrecarga de Trabalho e Falta de Tempo: A atuação dos cipeiros é frequentemente comprometida pela falta de tempo e sobrecarga de trabalho, limitando sua participação em reuniões e ações da CIPA.
- Falta de Apoio e Recursos: Soma-se a isso a ausência de apoio institucional e respaldo da gestão, falta de engajamento dos colegas e escassez de recursos básicos, como Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e materiais para campanhas educativas.
- Baixo Conhecimento e Ausência de Formação: Muitos cipeiros ainda enfrentam baixo conhecimento sobre suas atribuições e a ausência de formação continuada. Em alguns casos, a estabilidade no emprego é o motivo central que leva à participação na CIPA, o que pode desvirtuar seu propósito.
- Desvalorização e Inexistência da CIPA: Há relatos sobre a desvalorização da CIPA como instância legítima, com dificuldades de autonomia para propor ou implementar ações, e até mesmo sua inexistência em locais onde é obrigatória por lei, evidenciando o desrespeito às normas e à saúde dos trabalhadores.
- Caráter Burocrático: Muitas empresas tratam a CIPA como uma obrigação meramente burocrática, e não como um espaço de promoção ativa da saúde e da vida. A falta de uma cultura prevencionista e o descompromisso do RH, gestores e SESMT (Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho) fragilizam suas ações.
- Invisibilização de Casos Críticos: Situações como o assédio moral, o adoecimento psíquico e acidentes graves são invisibilizados, sem acolhimento ou investigação adequada. Mandatos curtos, sem transição ou memória das ações anteriores, também dificultam a continuidade de projetos.
Para reverter esse quadro desfavorável, a CUT, em diálogo com cipeiros e dirigentes sindicais, Josivania Pereira apontou sugestões para fortalecer a atuação das CIPAs, entre elas:
- Capacitação Contínua e Aprofundada. É fundamental garantir uma formação que aborde riscos psicossociais, assédio e saúde mental, tornando a participação de gestores nas formações da CIPA obrigatória.
- Mecanismos Eficazes de Fiscalização: Criar ferramentas mais eficazes para fiscalizar o cumprimento das obrigações legais pelas empresas.
- Incentivos e Valorização: Implementar incentivos concretos para cipeiros, como bonificações, apoio logístico, campanhas de valorização e premiações para os mais atuantes.
- Autonomia da CIPA: Assegurar a autonomia das CIPAs para decidir e agir sem interferência dos empregadores.
- Diálogo e Atuação Conjunta: Fortalecer o diálogo e a atuação conjunta com os sindicatos e o SESMET.
- Apoio de Órgãos Públicos: Garantir apoio dos órgãos públicos, com canais de denúncia acessíveis e eficazes para casos de assédio, racismo, discriminação e outros riscos psicossociais.
- Ampliação da Participação da Base: Estimular a participação ativa dos trabalhadores nas ações da CIPA.
- Melhora na Comunicação: Aprimorar a comunicação interna e externa da CIPA com os demais setores.
Compromisso da CUT com a Formação
Ciente da importância estratégica da CIPA, a CUT tem organizado e promovido formações, cursos e debates para cipeiros e militantes sindicais. A Central reafirma seu compromisso histórico com a defesa da saúde e segurança da classe trabalhadora e apresenta uma proposta concreta para fortalecer as CIPAs em todo o seu território de representação.
Entre as ações de formação, destacam-se o mapeamento de cipeiros, ampliação da oferta de formação com ferramentas digitais, e produção de materiais pedagógicos incluindo cartilhas e guias práticos sobre assédio moral, riscos psicossociais e saúde mental.
A CUT enfatiza que a formação é uma ferramenta de empoderamento e que fortalecer os cipeiros é, em última instância, fortalecer a vida, o trabalho digno e a organização dos trabalhadores. A luta segue por CIPAs autônomas, atuantes e valorizadas, vistas como instrumentos fundamentais para transformar os ambientes de trabalho em espaços de respeito, cuidado e dignidade.
Fundacentro aponta retrocessos e propõe CIPA mais democrática
Na abertura do evento, o diretor de Conhecimento e Tecnologia da Fundacentro, Remígio Todesquini, destacou que o encontro marca a retomada de uma política de valorização da saúde e segurança no trabalho, após anos de desmonte. Segundo ele, a Fundacentro passa por um processo de reconstrução e retomará sua missão de produzir conhecimento e formular políticas públicas. Anunciou, inclusive, a realização de concurso público para 65 novos servidores.
Remígio criticou o enfraquecimento institucional da CIPA nos últimos anos. Segundo ele, a redução da quantidade de acidentes — de 2 milhões em 1975 para cerca de 800 mil atualmente — não reflete avanços reais, mas sim altos índices de subnotificação, em especial durante o governo anterior.
Entre as propostas apresentadas por Todesquini, estão:
- Eleição direta e exclusiva dos membros da CIPA pelos trabalhadores;
- Mandato de três anos, com estabilidade reforçada e autonomia para atuação;
- Capacitação de 40 horas presenciais, com conteúdo adaptado à realidade de cada setor;
- Inclusão obrigatória dos sindicatos nos processos eleitorais da CIPA;
- Criação de um Dia Nacional dos Cipeiros e Cipeiras;
- Exigência de canais de denúncia anônimos e eficazes contra assédio moral e sexual;
- Integração do SUS e articulação com o Sistema Nacional de Saúde do Trabalhador.
Para Todesquini, é preciso romper com a lógica da culpabilização do trabalhador, frequentemente responsabilizado por “atos inseguros” enquanto as empresas negligenciam a prevenção. Ele defendeu uma formação crítica e transformadora, capaz de empoderar os trabalhadores para reconhecer e enfrentar os riscos de seus ambientes.
Durante o período da tarde do Encontro Nacional, foi realizado um trabalho em grupo com foco no enfrentamento ao assédio nos locais de trabalho, no dimensionamento das CIPAs e na importância da formação e qualificação dos cipeiros e cipeiras.
As propostas construídas pelos grupos subsidiaram a elaboração de um documento unificado das centrais sindicais, contendo nove pontos estratégicos que serão encaminhados à Comissão Tripartite Paritária e Permanente (CTP) e ao Ministério do Trabalho e Emprego. O objetivo é contribuir diretamente para o aprimoramento das políticas públicas de saúde e segurança no trabalho em nosso país.
Unidade sindical e reconhecimento da CIPA como política pública
Tanto a CUT quanto a Fundacentro convergiram na defesa da CIPA como instrumento essencial para o trabalho digno, seguro e saudável. A necessidade de garantir autonomia, valorização e representatividade às comissões foi uma das principais bandeiras levantadas por participantes e debatedores.
O Encontro Nacional mostrou que o fortalecimento da CIPA passa, necessariamente, por uma articulação entre sindicatos, Estado e trabalhadores, com investimento contínuo em formação, fiscalização e democratização do espaço laboral. A mensagem final foi a se que sem saúde e segurança, não há trabalho decente. E sem CIPA forte, não há saúde nem segurança garantidas.
Fonte: CUT