21 Dias de Ativismo: mobilização pressiona Senado para barrar o PDL da Pedofilia

Nos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra Meninas e Mulheres, o olhar atento à infância e à adolescência torna-se ainda mais urgente. Em novembro de 2025, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 3/2025, que revoga a resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) sobre atendimento humanizado a meninas e adolescentes vítimas de estupro. A medida foi imediatamente apelidada por organizações de direitos humanos de “PDL da pedofilia”.
A resolução, aprovada pelo Conanda em 2024, organizava protocolos para garantir acesso ao aborto legal, acolhimento e proteção integral às vítimas, especialmente nos casos em que os abusadores fazem parte da própria família. Ao derrubar essas diretrizes, o PDL retira garantias fundamentais e torna ainda mais difícil o atendimento nos casos de estupro de vulnerável, justamente onde a violência é mais brutal e frequente.
O PDL foi apresentado pela deputada bolsonarista Chris Tonietto (PL-RJ) sob o argumento de que o Conanda teria “extrapolado suas atribuições”. Para especialistas, autoridades e movimentos sociais, esse discurso sustenta um moralismo que ignora a realidade de que a maior parte dos estupros contra meninas ocorre dentro de casa, cometidos por pais, padrastos, tios e avôs, onde silêncio e medo imperam.
Ameaça às vítimas e impacto na infância
A aprovação na Câmara desmonta uma política criada justamente para enfrentar essa realidade. De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil registrou 74.930 vítimas de estupro em 2022, sendo seis em cada dez crianças com até 13 anos. Em 70% dos casos, o agressor era alguém da família ou do círculo de confiança. Somente 10% dessas violências chegam à polícia.
Para Amanda Corcino, secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, o PDL agrava a vulnerabilidade das meninas, por isso é preciso derrubar o retrocesso. “Vamos pressionar o Senado para que o PDL da Pedofilia seja derrotado. Estamos falando de vidas, não de ideologia e qualquer argumento que apresentam para defender a proposta deve ser rechaçado porque a realidade e os dados mostram que os estupros ocorrem dentro das casas, quando essas crianças deveriam estar protegidos pelos pais, avôs e irmãos, mas estão totalmente expostas a essa violência”, diz a dirigente. “
“Imagine uma criança carregar no ventre outra criança, fruto de um ato tão abominável como o estupro”, ele pontua.
Amanda afirma também que o decreto desmonta a rede de acolhimento e distorce o debate. “Esse decreto não trata de ‘ampliar o aborto’, como dizem os conservadores. Ele trata de humanizar o atendimento, garantir acolhimento onde o Estado falhou, de proteger a menina que foi violentada e agora precisa de amparo, não de julgamento. O que eles chamam de defesa da vida é, na verdade, uma condenação da infância à dor e ao abandono”, diz
O nome disso não é defesa da vida. É conivência com a violência
Governo reage e articula mobilização no Senado
Com o texto encaminhado ao Senado, o governo federal montou uma ofensiva para impedir que o PDL avance. A estratégia inclui mobilização nas redes, articulação com parlamentares e reuniões com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre.
Nas redes sociais, a secretária da Criança e do Adolescente do Ministério de Direitos Humanos e presidente do Conanda, Pilar Lacerda afirmou que a resolução do Conanda apenas reforça e reorganiza o que já existe na Constituição e no Código Penal
“De acordo com a legislação, qualquer relação com menores de 14 anos significa estupro de vulnerável. E mesmo assim, dados do DataSUS mostram que 57 meninas e adolescentes dão a luz todos os dias no Brasil. O mais preocupante é que grande parte desta violência acontece dentro de casa geralmente por pessoas parentes ou muito conhecidas da família”, disse a presidente do Conanda
Este é um grande retrocesso, grave ameaça à vida e ao futuro de meninas e adolescentes no Brasil. Estamos fazendo uma grande mobilização. Vamos barrar no Senado. Contamos com os senadores e senadoras para derrubar o PDL da pedofilia e garantir a todas as meninas e adolescentes do Brasil uma vida digna, plena de direitos
Congresso contra as mulheres
A reação à aprovação do PDL também escancara o debate sobre a atuação de um Congresso majoritariamente conservador na formulação de políticas sobre corpos femininos.
“O Congresso Nacional, hoje de maioria conservadora e parte significativa fundamentalista, trabalha para aprovar projetos que impõem regras sobre o corpo da mulher, sempre em nome da “família”, das “tradições”, dos “bons costumes” e de supostos valores religiosos. Na prática, essa narrativa sustenta o controle sobre as mulheres, mantendo-as fora da política, dos espaços de poder e submetidas a papéis de subserviência. E essa lógica, lamentavelmente, também é defendida por parcela de parlamentares mulheres que rejeitam avanços em igualdade de gênero”, diz Amanda Corcino.
São homens, brancos e heteronormativos decidindo sobre os corpos das mulheres, muitas vezes colocando as vidas delas em risco
Mais do que uma disputa política: uma luta pela vida
A articulação no Senado, a mobilização social e a resistência das organizações de direitos humanos refletem que o que está em jogo é a a proteção de meninas e adolescentes em situação de violência extrema.
O PDL, ao desmontar garantias já previstas em lei, transforma a infância em palco de disputa ideológica e aprofunda desigualdades, atingindo sobretudo meninas pobres, negras e sem acesso a redes privadas de saúde.
Nos 21 dias de ativismo é preciso ter a consciência de que para milhares de meninas brasileiras, o perigo não está nas ruas, mas dentro de casa. E a resposta do Estado – ou sua omissão – é que vai definir quem vive ou não, quem é silenciada e quem recebe proteção.
Fonte: CUT
