GDF cria burocracia que leva estudantes de baixa renda a desistirem do PAS

img-20160920-wa0008Termina, nesta terça-feira (20), o prazo para solicitação da isenção da taxa de inscrição no Programa de Avaliação Seriada (PAS) para ingresso na Universidade de Brasília (UnB), porém, grande parte dos estudantes da rede pública de ensino não conseguiu nem sequer acessar a internet para solicitá-la. É o caso de vários estudantes do Centro de Ensino Médio (CEM) 404, de Santa Maria, que atende aos 1º, 2º e 3º anos do Ensino Médio durante o dia, e, à noite, oferece o EJA. Nos três turnos, a escola atente a um corpo discente de 1.800 estudantes. A prova do PAS será realizada em novembro.
Por causa disso, os professores do CEM 404 irão enviar um documento ao Governo do Distrito Federal (GDF) pedindo a prorrogação do prazo de solicitação da isenção para que os estudantes que ficaram de fora tenham mais tempo para reunir a documentação exigida, fazer a digitalização e o upload para o site do Cebraspe e pleitearem a desobrigação desse pagamento. “Diga-se de passagem que esse rol de documentação é exigida nas três etapas do PAS e, aqui, aqueles que recebem o Bolsa Família vão usar o número do NIS. Com isso, segundo o edital, a isenção estará garantida. Porém, quem não recebe o benefício social, terá de fazer todo um procedimento burocrático para ver se será ou não deferido o pedido”, afirma o professor Marco Antônio.
O CEM 404 é uma das escolas que o governo Rodrigo Rollemberg (PSB) transformou para priorar. Retirou dela a prerrogativa de ser pólo de aplicação das provas do PAS, transformou a inscrição no Progama em pesadelo e a vida dos estudantes em estresse, desistência e sofrimento, impedindo o acesso, sobretudo dos de baixa renda, ao ensino público superior público. Apesar da retomada da isenção da taxa de inscrição, o GDF adotou, juntamente com o novo modelo de isenção, uma burocracia tão forte que a população está achando que é uma forma de levar, propositadamente, os estudantes a desistirem do PAS.
“Além da imensa burocracia para conseguirmos concretizar a inscrição, ele retirou da nossa cidade, sem nenhuma justificativa, a prerrogativa de ser um Pólo de Prova. As provas são realizadas nos fins de semana e, aqui no DF, o transporte nesses dias é praticamente inexistente. Com isso, ele sobrecarrega o sistema de transporte, que é falho durante a semana, e, no fim de semana, é praticamente inexistente, e temos, por causa disso, um problema sério porque vamos chegar no local da prova já cansados”, afirma Jales, estudante do 2º Ano, do Centro de Ensino Médio (CEM) 404, de Santa Maria.
Roberto, 16 anos, também do 2º ano do CEM 404, reclama da burocracia. “Até mesmo na entrega dos documentos. Diversos estudantes que requereram isenção de taxa estão enfrentando muitos problemas para o envio desses documentos até porque o grande gasto que está sendo feito para tirar essas documentações está causando problema. Muitas famílias não têm essa documentação em mãos e têm de gastar dinheiro para adquiri-la porque estamos numa comunidade que não têm o hábito de guardar esse tipo de documento que está sendo requerido no edital”.
Ele assegura que a burocracia funciona como barreira e que essa situação está causando  um efeito reverso, “ou seja, em vez de optarem pela isenção, que é um direito estudantil, diversos estudantes acabam pagando um valor que não poderia ser taxado, porque, de certa forma, ao pagá-lo, ele estará comprando o seu futuro. Mais grave ainda é que está fazendo isso sem que tenham condições financeiras para tal. Infelizmente, essa burocracia tem deixado vários estudantes de fora de um futuro melhor”, relata Roberto.
O professor Marco Antônio, do CEM 404, informa que, este ano, com o subsídio do GDF via projeto de lei que o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) enviou para a Câmara Legislativa do DF (CLDF), a garantia da isenção só será efetivada se o estudante provar que a renda da família é igual ou inferior a um salário mínimo e meio. A taxa de R$ 120 cobrada pelo Cebraspe é excludente porque é pesada e acima das condições financeiras da maioria dos estudantes da rede pública de ensino do DF.
O professor critica o governo por estipular o teto de um salário mínimo e meio como limite para concessão da isenção e a aponta a burocracia como um problema grave que tem provocado sofrimento e ansiedade entre os estudantes que tentam alcançá-la. Ele conta que “ontem, véspera do fim do prazo para isenção da taxa, o sistema de internet estava falho, eles não conseguiam efetuar a solicitação via internet. Eles são de uma comunidade que não têm essa cultura de guardar documentação, como contracheque, carteira de trabalho. Muitos aqui não têm acesso a computador em casa, à digitalização. Isso que o governo está fazendo é uma perversidade, está gerando desgaste, sofrimento e desistências”.
Ele diz que muitos estudantes estão preferindo pagar a taxa de R$ 120, que é o valor cobrado este ano, a fazer a solicitação da isenção e mandar para o Cebraspe. “Tem ainda o problema da foto que é fundamental para o estudante conseguir avançar nas etapas de inscrição. Temos relatos de estudantes que tiraram foto cinco, seis vezes para conseguir fazer o upload dela, dentro dos padrões que o Cebraspe exige, e foi muito desgastante para muitos. Acredito que isso tenha sido um desgaste geral no DF, não só aqui no 404 de Santa Maria”.
O professor critica o GDF e diz que a retomada da isenção da taxa está parecendo um presente de grego: se, por um lado, o governo facilitou, readotando a isenção para a taxa de inscrição do PAS, por outro, criou um excesso de burocracia que tem gerado uma situação estressante, desgastante e que tem levado muitos estudantes a desistirem da isenção ou optarem, sem poder aquisitivo para isso, por pagar pelo direito à inscrição.
A retirada da isenção da taxa do Programa de Avaliação Seriada (PAS) no ano passado barrou a participação de centenas de estudantes da rede pública, o que causou sérios prejuízos materiais e até psicológicos nos jovens de comunidades carentes que viam na educação superior a saída para melhorar as condições de vida. O prejuízo foi tão grande que vários estudantes desistiram do ensino superior. Deixaram de fazer a prova porque tinham de pagar uma taxa de R$ 100, a qual pesava fortemente no orçamento das famílias.
Cássia, de 16 anos e também estudante do 2º ano do Ensino Médio, considera como maior dificuldade para conseguir a isenção é a burocracia. “No ano passado não teve tanta burocracia e, ainda assim, muitas pessoas desistiram de fazer a prova porque o valor da taxa presava no orçamento familiar. Muitas famílias não tinham R$ 100 reais para isso. Este ano, o novo critério que obriga os estudantes a escanearem e levar para eles uma gama imensa de documentos foi o motivo da desistência porque não tem o dinheiro para isso ou porque quando vê a lista acha que não tem condições de conseguir em tempo hábil toda aquela documentação”, afirma.
Ela diz que o número de estudantes que faziam o PAS está visivelmente, cada vez mais, diminuindo. “Essa quantidade de documentos exigida tem funcionado como mais uma barreira para estudantes de baixa renda. Acredito que isso faz parte dessa concepção do governo de que a escola, o ensino, a educação não seja um direito e sim uma mercadoria para eles investirem. Infelizmente o nosso governo não pensa no nosso futuro. Em vez de nos ajudar a sair dessa condição, apontando um caminho mais fácil para a gente chegar no ensino superior, ele tem nos prejudicado”, avalia a estudante.
Polo de aplicação das provas
Outra ação do governo que pegou professores e estudantes de surpresa foi a notícia de que Santa Maria não é mais uma região polo de aplicação de provas do PAS. Em “Em nenhum momento houve uma explicação plausível por parte do GDF e do Cebraspe para que isso tenha ocorrido. Nos últimos 10 anos, Santa Maria sempre foi polo de aplicação. Não só o CEM 404, mas também outras escolas de Ensino Médio e, simplesmente, não apresentou nenhuma opção”.
Marco Antônio disse que a categoria docente quer saber os motivos dessa quebra. “A gente gostaria de saber porque o GDF e Cebraspe em quebrar essa prerrogativa. Afinal, há interesse dos estudantes de participar desse processo. O CEM 404 tem o foco totalmente voltado para o PAS. Nossas aprovações têm aumentado a cada ano nos últimos cinco anos. A gente tem uma média de aprovação de 15 a 20 estudantes só pelo PAS e a cidade deixar de ser polo de aplicação da prova é um grande prejuízo em razão do tradicional transporte público muito ruim da capital do país, sobretudo, nos fins de semana”.
Ele afirma que os professores já estão prevendo a maratona e os transtornos que os estudantes irão enfrentar para conseguirem fazer essa prova na cidade mais próxima, que é o Gama. “Essa situação também já está gerando desgaste. Já ouvi de estudantes que vão desistir de participar do processo também por causa disso. Acredito que nem o GDF e nem o Cebraspe consideraram essas variáveis do DF, que é uma cidade grande e tem realidades muito distintas. O edital não considerou isso”.
Essa também é uma preocupação dos estudantes. “Consideramos o fato de Santa Maria ser pólo de aplicação da prova extremamente importante, uma vez que essa importância está demonstrada no SIS-UnB, que assegura ao PAS 50% das vagas da universidade”, comenta Jales. A isenção da taxa de inscrição no PAS foi totalmente subsidiada pelo GDF até o ano de 2014. Em 2015, quando os professores entraram no site do GDF para requerem as isenções, foram pegos de surpresa com a cobrança da taxa. Isso obrigou muitos estudantes a desistirem do PAS, até mesmo os que já estavam nas 2ª e 3ª etapas.