Sindicalismo deve combater 'ajustes' em todo o mundo, diz Felício

Além das lutas sindicais, com questões comuns em todo o mundo, o movimento sindical deve estar preparado para enfrentar os “ajustes fiscais” promovidos pelos governos, geralmente buscando diminuir o tamanho do Estado e sempre atingindo os trabalhadores. Essa avaliação foi feita pelo presidente da Confederação Sindical Internacional (CSI), maior entidade trabalhista global, João Felício, no encerramento do conselho geral da CSI, reunida pela primeira vez no hemisfério sul. O ex-presidente do Uruguai José “Pepe” Mujica, atual senador, participou da conclusão do encontro.
“A esmagadora maioria dos governos, em dados momentos, se utiliza desses artifícios. Claro que devem controlar suas contas, mas a forma é profundamente desumana e antidemocrática”, diz Felício. “Nunca se procura taxar a riqueza. O lugar onde mais vão buscar recursos é na classe trabalhadora. Na CSI, devemos rejeitar essa opção política”, acrescenta o dirigente, citando também o Brasil. Ele afirma que, enquanto se busca ajustar as contas públicas à custa dos mais fracos, a sonegação global soma US$ 3 trilhões anuais.
Para o dirigente, ex-presidente da CUT (uma das centrais brasileiras filiadas à CSI, ao lado da Força Sindical e da UGT), um desafio da entidade, cuja presidência ele assumiu em 2014, é desenvolver ações mundiais conjuntas. “A gente ainda não conseguiu estabelecer uma ação que se consiga efetivar ao mesmo tempo em todos os continentes.” Alguns passos nesse sentido já foram dados, como o Dia Mundial pelo Trabalho Decente (7 de outubro) e a atuação da central sindical na Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Precisamos de mais momentos dessa natureza”, afirma Felício. “As multinacionais são as mesmas.”

Avanços

Entre os mais de 200 dirigentes que participaram do conselho da CSI (encontro anual da entidade), se identificam alguns problemas comuns, como as más condições de trabalho, as restrições ao exercício da atividade sindical e a questão de gênero. O secretário-geral da entidade na região Ásia/Pacífico, Noryuki Suzuki, por exemplo, diz que a mais recente conferência da região, realizada em agosto na Índia, com 157 delegados, teve 51% de mulheres e 15% de jovens. “A igualdade de gênero é um desafio, mas estamos avançando aos poucos”, afirmou.
Segundo o secretário-executivo da Confederação Sindical Árabe (Atuc, na sigla em inglês), Mustapha Tlili, 2015 “foi um ano muito duro na região, com seus milhões de refugiados, centenas de milhares de mortes e destruição em quatro países (Síria, Líbia, Iraque e Iêmen)”, além de ataques a direitos trabalhistas e ao sindicalismo livres em nações do Golfo. Em todos os relatórios regionais, se destaca também a importância de reforçar espaços de diálogo social.
A questão da migração foi um dos temas discutidos no encontro da CSI. “Hoje você tem dois tipos de cidadão: o que migra pelo desemprego alto, pela falta de condições. É um deslocamento provocado pelo capital. E o provocado pela guerra. É o cidadão que está fugindo da morte”, diz Felício.
Ao se referir à próxima Conferência do Clima, a ser realizada na França entre 30 de novembro e 11 de dezembro, o presidente da CSI afirma que desenvolvimento sustentável pressupõe respeito pela organização sindical e funcionamento efetivo do chamado tripartismo (diálogo entre governo, trabalhadores e empresários). “A maioria dos governos ouve o patronato”, critica.
O cenário de crise internacional atinge diretamente os trabalhadores e deteriora as condições de vida, mas a CSI avalia que essa situação de precariedade é crônica em vários locais do mundo, independentemente do período. A entidade pretende atuar em movimentos com objetivos como a erradicação do trabalho escravo e da pobreza extrema, além da implementação de políticas de trabalho decente. E tem como meta conquistar mais de 20 milhões de trabalhadores sindicalizados até 2018, atingindo aproximadamente 200 milhões.
A confederação também aprovou moção pela democracia no Brasil, referindo ao respeito “à vontade popular expressa na urnas” em 2014, com a reeleição da presidenta Dilma Rousseff. “Não há fatos que justifiquem que grupos ultrarreacionários derrotados queiram fazer no Brasil o que já testemunhamos com pesar em países como Honduras e Paraguai em anos recentes. Golpes de Estado foram cometidos com o apoio da grande mídia local através de manobras judiciais e parlamentares, com a pretensão de passarem por processos democráticos de impeachment. Sabemos que a consequência destes golpes foi, além do grave dano à democracia, o empoderamento de regimes conservadores e autoritários que promoveram a perda de liberdades civis e políticas” diz a moção.
Parte dos delegados do conselho geral da CSI, que durou três dias, até hoje (12), deve participar amanhã de seminário internacional e da abertura do congresso da CUT, também em São Paulo. O evento vai até sábado (17).
(Da Rede Brasil Atual)