MEC não recomenda shows com publicidade nas escolas

Eles são fofos, cantam músicas alegres e arrastam uma multidão por onde passam. Fora as centenas de produtos consumidos, como brinquedos e alimentos, que levam a marca da famosa dupla de palhaços. Pouco mais de um ano após sair da TV onde tinha um programa diário, a dupla Patati Patatá tem voltado a divulgar seus DVDs e CDs da maneira que fazia no início da carreira: dentro das escolas infantis.
O Ministério da Educação enviou na semana passada ofícios para os secretários municipais e estaduais de educação para alertar sobre a resolução do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes), órgão ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, que fala justamente sobre a abusividade do direcionamento de publicidade infantil. O documento pede que as unidades de ensino coloquem em prática um dos artigos da resolução 163, publicada em abril passado, que considera abusiva a comunicação mercadológica dentro dos ambientes escolares.
Pais de diferentes escolas de São Paulo têm sido informados por meio de um panfleto da realização de shows, que são gratuitos e realizados dentro do horário de aula. O evento é patrocinado pelos sucos Frisco, que tem a bebida em pó com a embalagem da dupla de animadores.
O panfleto ainda informa que a escola “se compromete a divulgar o novo kit ‘ A vida é Bela, contendo um DVD musical, um CD e um par de bonecos de 10 centímetros’. Para isso, os pais devem desembolsar R$ 45. Os produtos ficam na escola cinco dias após o show para serem adquiridos pelos interessados que podem pagar com cheque pré-datado para 30 dias ou em duas vezes no cartão de crédito. Nessa última opção, o pagamento é feito por um site criado especificamente para a compra onde é impresso o comprovante que deve ser entregue na escola.
No final da apresentação, a garotada ainda leva para casa uma amostra do suco artificial e uma espécie de régua dos personagens para ser colocada na parede de casa para medir a altura da criança. Nesse papel há espaços em branco para as crianças colocarem figurinhas que vem de brinde com o suco comprado nos supermercados.
A empresária Keli McGee, 28, ficou surpresa quando a filha mais velha, de 4 anos, chegou contando que os palhaços visitariam a escola e levariam um “monte de presentes”. “Seria a favor se eles fossem de fato apenas entreter as crianças, sem segundas intenções marqueteiras para vender suco em pó e DVD”, comenta a empresária. Para ela, a escola deveria ser um lugar para incentivar o brincar e não direcionar as crianças para o consumo.
Ela conta que tentou argumentar com a escola, mas ouviu da diretora que o show ocorre há anos e que ninguém nunca reclamou. O nome da escola não foi divulgado pelo Maternar  a pedido da mãe por temer represálias.
A diretora do Alana (entidade de defesa dos direitos da criança)Isabella Henriques, diz que esse tipo de ação de marketing é ilegal e não deveriam ocorrer, principalmente, dentro das escolas. “A criança não tem discernimento do que é propaganda e do que é atividade educacional. Fora que cria distinções com os próprios alunos sobre quem comprou e quem não comprou o produto”, comenta. Ela diz ainda que esse tipo de evento associado a uma marca ou produto fere o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e o Código de Defesa do Consumidor.
Isabella diz que muitas vezes a direção da escola e os próprios pais não se dão conta do abuso de propaganda que acontece naquele show. “Todo mundo acha que é divertido, que é gratuito e não param para pensar no impacto que isso terá na formação daquela criança”, comenta. Ela recomenda aos pais a conversar com a escola sobre esse tipo de show para, se possível, pedir o cancelamento do evento.  O mesmo vale para os shows do Ronald, do McDonald´s, que também foi mostrado pelo Maternar no ano passado.
OUTRO LADO
O criador da dupla de palhaços, Rinaldi Helder Faria, diz que as apresentações são gratuitas e que o show tem duração de aproximadamente 40 minutos. Segundo ele, não há qualquer irregularidade no evento pois a compra do kit é facultativa, ou seja, ninguém é obrigado a comprar. “A gente oferece diversão mais do que qualquer outra coisa. Em muitas escolas não vendo nenhum kit”, comenta Rinaldi. As escolas, explica Faria, não tem nenhum retorno financeiro ao ceder o espaço para os shows e vender os kits.
O empresário considera que faz “um baita bem” para as crianças de várias regiões do país ao oferecer o show, inclusive em regiões carentes, pois muitas não têm acesso a eventos de cultura. Para ele, como a resolução do Conanda não tem configuração de lei, não é feito nada ilegal pela sua empresa.
Procurado, o Grupo 3corações, responsável pela marca Frisco, diz que os shows são de responsabilidade da Rinaldi Produções, criadora da dupla. Sobre distribuir o suco, a empresa diz que “a marca reforça que não comete nenhuma infração, uma vez que não está promovendo a venda do produto, nem realizando campanha ou promoção de vendas por intermédio dos palhaços”.
(Da Folha de S. Paulo)