Laptops nas escolas pelo programa “Um Computador por Aluno” falhou

Quando a professora Marta Regina Resende pede para que as crianças do 3º ano peguem os laptops do programa Um Computador por Aluno no armário, a turma se anima. Em fase final de alfabetização, os estudantes vibram com a possibilidade de uma atividade diferente na sala de aula. Com os olhos brilhantes, eles explicam que aprendem muito com o computador.
Os professores e a direção da Escola Classe 1 do Guará, no Distrito Federal, lamentam que nem todos os alunos do colégio possam ter a mesma sensação das crianças da turma da professora Marta. A escola, selecionada para participar do projeto-piloto que começou em 2010, possui laptops suficientes, mas não tem infraestrutura para usá-los em todas as salas de aula.
Os obstáculos enfrentados pela escola para fazer com que o programa Um Computador por Aluno (UCA) dê certo se repetem em inúmeras outras pelo Brasil. Lá, a rede elétrica não suporta a demanda de energia, a internet não chega a todas as salas de aula (ou fica muito lenta) e muitos computadores já não funcionam.
A diretora de Formulação de Conteúdos Educacionais do Ministério MEC, Mônica Gardelli Franco, conta que a contrapartida exigida dos municípios pelo governo federal na fase piloto era garantir as condições mínimas para o funcionamento dos equipamentos. Mas há anos as escolas públicas brasileiras enfrentam dificuldades para colocar em prática outros projetos, como os laboratórios de informática de uso coletivo.
De acordo com dados do Censo Escolar 2012, 42,4% dos colégios urbanos (51.085) ainda não possuem laboratórios de informática. Na área rural, o índice sobe para 78% (57.887). O Programa Nacional de Tecnologia Educacional (Proinfo), responsável por distribuir equipamentos para promover o uso de tecnologias no ambiente escolar, foi criado em 1997.
Tomadas improvisadas e choques
Na Escola Classe 1 do Guará, nenhum professor tem dúvidas de que a tecnologia contribui muito para o aprendizado das crianças. As professoras que cuidam do laboratório de informática do colégio, usado por cada uma das sete turmas do 1º ao 5º ano do ensino fundamental uma vez por semana, são tratadas como celebridade pelos alunos.
Elas ajudam as professoras regentes das turmas a preparar atividades que contribua para a fixação do conteúdo trabalhado durante as aulas. Jogos educativos e pesquisas são as atividades mais comuns. “A tecnologia é um caminho sem volta. É ela que tira os muros da escola”, pondera Regina Célia Lopes de Castro, uma das coordenadoras do laboratório.
A turma da professora Marta é privilegiada: a sala é uma das poucas que permite que os alunos acessem a internet
Regina conta que a escola recebeu 448 máquinas do UCA em 2009, que ficaram, pelo menos, um ano guardadas em caixas dentro do espaço, porque os professores e servidores do colégio participaram de curso preparatório durante um ano. A crítica é que a capacitação não ensinou o principal: adaptar os conteúdos à ferramenta.
Em 2011, quando os laptops foram, de fato, para as salas de aula, a equipe da escola se assustou. Como a bateria dos computadores têm durabilidade curta, cerca de uma hora e meia, as crianças precisavam deixar os equipamentos ligados na tomada. Com as adaptações elétricas mal feitas, eles perceberam que não poderiam deixar todos os alunos da escola usarem os equipamentos ao mesmo tempo.
Em algumas salas, não é possível que nem todos os computadores sejam ligados na mesma hora por causa de riscos de curto -circuito e choques nas crianças. Situação que desanimou muitos docentes. Assim, hoje, algumas turmas utilizam os equipamentos toda semana, uma ou duas vezes. Outros não usam nunca. E ninguém os utiliza o tempo todo.
“Muitos professores deixaram de usar por causa disso. Quando o programa foi lançado, a promessa era de que um armário, já com tomadas, fosse enviado às escolas para guardar os equipamentos e carregá-los. Mas ele nunca chegou”, conta. Além disso, ela diz que a internet disponível é lenta e não atende a todos conectados ao mesmo tempo.
Banda larga nas escolas
A falta de conectividade é outro grande entrave para o UCA. Dados do MEC mostram que, até 2012, 64.454 escolas estavam conectadas pelo projeto que leva banda larga às escolas urbanas, criado em 2008. Mais 4.902 colégios têm outros tipos de conexão, o que totaliza 97,5% das escolas urbanas. Na área rural, só 13% afirmaram ter internet no Censo 2012.
Mesmo na área urbana, em muitas escolas a rede não suporta a conexão de muitos estudantes ao mesmo tempo. Por isso, o MEC estuda uma solução com a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) para distribuir o conteúdo nas salas de aulas sem sobrecarregar a internet.
Um grupo de pesquisadores da instituição está montando uma espécie de servidor em nuvem (que é um grande banco de dados virtual) onde os materiais poderiam ser baixados e armazenados em horários alternativos, para depois serem usados em horário normal pelos alunos, sem precisar da conexão à internet. O projeto deve ser concluído no ano que vem.
Receio do futuro
Regina lamenta que, em vez de avançar, o projeto esteja se perdendo. “Além dos problemas de infraestrutura da escola, os laptops ficam defasados logo e a assistência e manutenção não acontecem como deveriam”, diz Maria da Paz, outra coordenadora do laboratório.
Segundo o MEC, essa era uma responsabilidade dos Estados e dos municípios. Eliane Carneiro, coordenadora de Mídias Educacionais da Secretaria de Educação do DF, conta que, por conta dos problemas, o projeto não saiu do piloto na capital.
“Os computadores têm uma limitação tecnológica, que vai se impondo naturalmente. Além disso, para cada aluno ter um computador, o investimento seria gigantesco. E por todos os problemas não conseguimos o resultado que esperávamos”, afirma.
Mesmo com todas as dificuldades, professores e coordenadores de projetos de uso de tecnologias são unânimes em dizer que, quando o professor acredita na proposta e se esforça para fazê-lo acontecer, os problemas são minimizados e as experiências, mais exitosas.
A professora Regina contou que, há um tempo, uma das professoras criou um projeto em que as crianças levavam um boneco e o laptop para casa. Com o equipamento, elas tinham de fazer fotos e vídeos contando o que fizeram com o boneco no fim de semana. A proposta foi um sucesso
Fonte: UOL