Eu não sou macaco!

Sou contra o preconceito. Sou contra o racismo. Sou contra a discriminação. 

Achei poderoso o gesto do jogador Daniel Alves, de comer a banana que lhe foi atirada por um torcedor do time rival ao dele. Foi simples e forte. Demonstrou total desprezo pelo gesto e transformou o símbolo de sua agressão em troféu de sua superioridade diante do preconceito.
Mas o oportunismo de Neymar, Luciano Huck e Angélica ao mostrar sua indignação seletiva, somado ao adesismo impensado que tomou conta das redes sociais foi assustador.
A campanha de Neymar nas redes sociais (#somostodosmacacos) não ajuda a combater o racismo, mas sim o reforça. Talvez após algumas temporadas na Europa Neymar tenha sido obrigado pela força do preconceito sofrido na pele a se reconhecer negro, e repensar a afirmação que fez de que não sofria preconceito por não ser “preto”. Lá, ao som de imitação de macacos a cada crítica da torcida do time adversário e de seu próprio time, Neymar deve ter refletido melhor. Então resolveu se solidarizar com seu colega e aproveitar para fazer um marketing pessoal. Já está claro que foi sua agência de publicidade que pensou na foto e no “hashtag”. Logo seu gesto foi copiado por famosos e globais. Não demorou para cair no gosto popular e virar febre instantânea.

Neymar pode ser um excelente futebolista. Mas deveria ter mais responsabilidade com a figura pública que representa. Poderia usar sua enorme influência com a mídia para promover uma verdadeira reflexão sobre o gravíssimo problema que é o preconceito que a FIFA tenta negar existir em suas inúteis campanhas de slogans publicitários e nenhuma postura concreta de punição aos casos óbvios e flagrantes de racismo.
Já Luciano Huck e Angélica, parecem indignados de ocasião e oportunistas de primeira hora. Quem não se lembra da polêmica que se envolveu Huck quando teve seu relógio roubado e exprimiu toda sua verve burguesa conservadora? Nas palavras de Zeca Baleiro, que escreveu à época, “por que um cidadão vem a público mostrar sua revolta com a situação do país, alardeando senso de justiça social, só quando é roubado?”. E Angélica, qual foi sua posição quando Faustão declarou que uma dançarina negra teria cabelos de vassoura de bruxa? Não me lembro de ela ter se indignado.

Mas me lembro de Luciano Huck ter usado a tragédia de dezembro de 2010 para potencializar a publicidade de seu site de compras coletivas. Denúncia que foi feita amplamente pelas redes sociais que criticam a manipulação da mídia, como GGN, de Luis Nassif. Agora, o mesmo “bom moço” usa o caso de racismo e a jogada publicitária de Neymar para lucrar, vendendo camisetas de sua grife estampando uma banana e a frase cunhada pelo jogador como campanha. Mais que depressa o oportunismo de um bom negócio apareceu. Isso se chama indignação seletiva. Aliado ao oportunismo.
Essa campanha em nada ajuda a superar o preconceito e o racismo de que vários jogadores negros como Daniel Alves e o próprio Neymar são vítimas. Essa campanha é o fortalecimento de um estereótipo que se quer combater. No caso, o termo macaco é reservado aos seres humanos de pele negra. São burros os que não apresentam inteligência considerada exigida. Assim como são veados os homens que não correspondem aos padrões do macho ideal. E são piranhas ou vacas as mulheres que fogem ao comportamento adequado aos valores patriarcais.
Quando se trata de humilhação, a atitude opressora é a desumanização, inferiorizando o oprimido.
Na rede social essa campanha é bacaninha. Mostra que nos indignamos com uma atitude de extremo preconceito. Mas, nas escolas, qual é o aluno que será alvo de piadas por “ser macaco”, o aluno branco ou o negro? E por “ser macacos”, quem tem melhores chances numa seleção de emprego, a mulher loira ou a com “cabelos de vassoura de bruxa”?
E não sou macaco! Neymar não é macaco! Daniel Alves não é macaco! Somos todos seres humanos!

Rodrigo Rodrigues é professor da rede pública de ensino do DF e secretário de Formação da CUT Brasília