É preciso desbravar o PNE

A proposta de Plano Nacional de Educação, elaborada pelo MEC – à luz de parte das resoluções da Conae 2010 –, possui limites de duas ordens que precisam ser superados. O primeiro refere-se à ausência e/ou à timidez de algumas metas e estratégias que podem ser revistas tanto no diálogo com o Congresso Nacional como em negociação com o MEC, a fim de serem instituídas adequadamente. É o caso do Custo Aluno Qualidade (CAQ) – bandeira histórica dos educadores protelada no documento do MEC – que constitui parâmetro fundamental para aferição dos resultados do Plano e, consequentemente, para a elevação da qualidade da educação.

Já a segunda limitação do PNE é de caráter estrutural, e, por esta razão, terá de ser transformada no seio do pacto federativo. Conforme observado pela CNTE à época do lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), em 2007, o alicerce do Capítulo III, Seção I da Constituição Federal – que norteia a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – não é suficiente (como não foi entre 2001 e 2010) para comprometer sistemática e legalmente os entes federados com as ações do PNE. Esta estrutura compreende tão somente o frágil Regime de Colaboração, o qual o MEC transpôs, em grande parte, do PDE e de outros programas do Ministério para o PNE.

O caminho a ser desbravado, portanto, continua sendo o da constituição do Sistema Nacional de Educação, compreendido não na forma puramente articulada (por adesão), mas, sim, através de Regime de Cooperação, capaz de preencher as lacunas institucionais. Como exemplo dessa dinâmica, o debate do CAQ precisa voltar-se à regulamentação do art. 23, parágrafo único da CF/88 (que trata do equilíbrio, do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional), com vistas a assegurar a contrapartida financeira dos entes federados para atingir percentuais do PIB compatíveis com o cumprimento das metas e estratégias do PNE (e dos PEE e PME). E, conforme disposto no art. 5º do PL 8.035/2010 – número sob o qual o PNE tramitará na Câmara dos Deputados – os percentuais do PIB poderão ser ajustados de acordo com a necessidade apontada nas avaliações periódicas do PNE, mediante aprovação do Congresso.

Especificamente sobre a valorização dos profissionais da educação, a proposta de PNE não observa o art. 61 da LDB, introduzido pela Lei 12.014, que distingue as categorias de trabalhadores da educação (professores, funcionários e especialistas). Por esta razão, três das quatro estratégias destinadas aos funcionários de escola encontram-se deslocadas na Meta 18, que trata dos “profissionais do magistério”. Não obstante, o documento governamental desconsidera a necessidade de regulamentar o art. 206, VIII da CF/88, tampouco prima pela eficácia da Resolução CNE/CEB nº 5/2010, a qual é consubstanciada pelo PL 1.592/03, que visa fixar as diretrizes nacionais para a carreira dos profissionais da educação.

Preocupa-nos, ainda, o fato de o PNE propor data divergente à Lei 11.738 para a implementação definitiva de planos de carreira para o magistério. O assunto não foi alvo da ADI 4.167 – que questionou pontos da norma do PSPN – razão pela qual não se deve sobrepor datas. Mais: embora o Plano busque articular os elementos da valorização do magistério (formação, carreira, jornada e salário), algumas estratégias mostram-se insuficientes para garantir as metas. E essa é uma questão intrínseca do CAQ, que deve também estabelecer contrapartida financeira definida para a obtenção das metas.

Em suma: é preciso que o Estado brasileiro assuma a lógica de garantir os investimentos necessários para a obtenção da educação de qualidade – princípio já introduzido pelos arts. 212 e 60 do ADCT da Constituição – ousando instituir novas estruturas em âmbito do pacto federativo.

Em breve a CNTE disponibilizará análise completa do PL 8.035/10, a fim de contribuir com o debate social acerca do PNE. Lembramos, também, que o Plano Nacional de Educação é tema central do 31º Congresso da CNTE – a realizar-se entre 12 e 16 de janeiro de 2011, em Brasília –, o qual indicará as ações de intervenção no parlamento e de mobilização da categoria para obtermos avanços nesta importante legislação que traçará os rumos da educação brasileira na próxima década.