Como vamos usar o jornal que nos chama de criminosos?

O Correio Braziliense divulgou na segunda-feira, 22, com destaque no caderno de Cidades, que 199 escolas do DF receberão exemplares do jornal para incentivar o hábito da leitura entre os alunos.
Não conseguimos saber quanto custou esse convênio assinado entre a Secretaria de Educação e a direção do Correio. Nem no site da Secretaria de Educação nem na matéria do jornal somos informados sobre esse “detalhe” sem importância (por aí se vê o compromisso do referido informativo com a transparência e correção da notícia). Também não sabemos qual o critério utilizado para a escolha do Correio Braziliense, se houve uma licitação da qual outros jornais participaram, se professores e pedagogos foram ouvidos sobre as implicações pedagógicas desse instrumento, se há um projeto efetivo para uso em sala de aula. Todas essas informações, relativas ao uso de recursos públicos, foram solenemente sonegadas. Ao não ser que o Correio esteja disponibilizando os jornais por caridade, mas será que neste caso o jornal não divulgaria o fato?
Sabemos apenas que a Secretaria de Educação irá distribuir 7.562 jornais diariamente à rede de ensino, como parte do projeto Leio e Escrevo meu Futuro. Esse número representa 15, 78% da tiragem diária do jornal, se levarmos em consideração o último dado divulgado pelo IVC (Instituto Verificador de Circulação) sobre a circulação diária do CB, em março de 2009 (47.901 exemplares nos dias úteis e 94.930 aos domingos). Ou seja, em plena era da internet, quando toda a grande imprensa registra queda de vendas, em grande medida pela forma como manipulam a notícia, essa ajudazinha ao Correio vem em boa hora, vocês não acham?
Não podemos achar positivo quando o secretário diz que o Correio é formador de opinião. Acreditamos que essa não é a função de um jornal. “Se o jornal for bem utilizado o aluno vai ter outra visão da realidade, e, cá entre nós, o professor também”, disse o secretário. Como podemos confiar na opinião do mesmo jornal que, no dia 8 de março deste ano, na abertura do mesmo caderno Cidades, publicou como visão do Correio um minieditorial com o indignante título de “crime de lesa-futuro”. Crime esse que nós, professores, cometeríamos se tomássemos a atitude “descabida” (sic) de entrar em greve para fazer valer nossos direitos. Fizeram uma matéria de duas páginas sem publicar nem sequer uma aspa do sindicato. O repúdio à manipulação foi tão forte que eles se obrigaram a dar uma entrevista depois, com meia página para o secretário e meia página para o Sinpro, isso depois de centenas de professores protestarem e cancelarem assinaturas. Ou seja, não podemos usar como “arma” de conhecimento o mesmo jornal que nos chama de criminosos. Temos informação de que convênio semelhante será firmado com a Revista Veja, a mesma que nos chamou de preguiçosos em 2007.
Como escreveu Paulo Freire, “Não basta saber ler, é preciso saber ler o mundo”. Poderíamos parafraseá-lo: Não basta ter opinião, é preciso saber a quem serve essa opinião.