Caso Carlos Mota: Júri condena três dos quatro acusados

O julgamento de três dos quatro acusados de matar o professor Carlos Mota, 44 anos, diretor do Centro de Ensino Fundamental (CEF) 4, no Lago Oeste, terminou somente na manhã desta quinta-feira. O juiz Daniel Mesquista Guerra declarou as penas de Carlos Lima do Nascimento (conhecido como Gabiru), 22 anos, Benedito Alexandro do Nascimento, 20, e Alessandro José de Sousa, 19. Os três réus confessos foram condenados pelo crime. Mota, conhecido por lutar contra o tráfico de drogas na escola, foi assassinado em junho de 2008.

O advogado dos três, Wandercy Ferreira, afirmou que recorrerá da decisão. Ele tem cinco dias para apresentar o recurso. “Eles não têm antecedentes criminais e alegam inocência. Dizem que foram torturados para confessar”, afirmou Ferreira. “De acordo com a perícia, o tiro que matou Mota foi disparado de cima para baixo. O autor teria de estar provavelmente em cima de uma árvore. Além disso, a distância do disparo – de 19 metros – impossibilitaria ter sido algum dos meus clientes”, completou. Benedito, Alessandro e Carlos saíram do fórum direto para o Complexo Penitenciário da Papuda.

Benedito foi condenado pela autoria do crime do homicídio duplamente qualificado com motivo torpe e por não ter dado chance de defesa à vítima. A pena foi de 20 anos de prisão, diminuída para 18 porque o condenado tinha 19 anos à época.

Alessandro pegou 16 anos pela co-autoria do assassinato de Mota. Ele foi condenado a 16 anos por homicídio qualificado sem chance de defesa à vítima. Pelo mesmo crime, o júri também considerou Carlos co-autor do crime. A pena dele foi de 18 anos.

Gilson de Oliveira, conhecido como “Gaúcho”, é acusado pelo Ministério Público de ser o mandante do assassinato do professor, e será julgado separadamente. A defesa dele recorreu da decisão de ele ser julgado no Tribunal do Júri, com os demais acusados. O recurso ainda não foi analisado. Segundo as investigações do MP e da Polícia Civil, mesmo não sendo aluno do CEF 4, Gilson frequentava a escola para cobrar dívidas do tráfico de drogas.

O julgamento
Cerca de 150 pessoas acompanharam durante todo o dia de ontem o julgamento. Professores e alunos do CEF 4 estenderam faixas em frente ao Fórum de Sobradinho e vestiam camisetas com a foto de Mota estampada. “Não acabaram apenas com o sonho do meu marido, acabaram com o sonho de toda uma comunidade”, comentou Rita de Cássia Pereira, 43.

Não teve aula ontem no colégio do Lago Oeste. Ônibus foram postos à disposição dos alunos que queriam ir ao fórum prestar homenagem ao professor. “Ele fez a diferença na nossa escola, foi ‘o’ professor. Sempre ficará um vazio ali”, disse a aluna Graciele Santos, 16. “Depois que ele entrou, a direção ganhou mais respeito. E muita gente viu isso como um problema”, completou Fábio Batista, 15. “O que fizeram com ela foi uma injustiça. Nunca tinha visto um diretor de escola lutar pela gente como ele lutou”, emendou Rone Alves Miguel, 18.

Deputados distritais, como Chico Leite e Paulo Tadeu (ambos do PT), e o senador Cristovam Buarque (PDT) estiveram no fórum pela manhã. O Sindicato dos Professores (Sinpro) organizou uma carreata da escola ao local do julgamento. “A morte de Carlos Mota precisa servir de exemplo para alguma coisa”, reforçou Rosilene Corrêa, uma das diretoras do Sinpro. “Essa manifestação não é só pela Mota, é em favor da escola pública”, ponderou a professora Silvia Brandão, que há seis anos atua na escola onde a vítima era diretor.

O auditório de 150 lugares ficou cheio o dia inteiro. Nas expressões de quem acompanhava o depoimento das testemunhas, havia um sentimento de revolta e um clamor por justiça. “É muito doloroso. A gente viu esses meninos crescerem, desde pequeno com a gente”, desabafou uma professora, que não quis se identificar. Dos três acusados julgados ontem, um era aluno e dois ex-alunos do CEF 4. Os rapazes – Carlos Lima do Nascimento (o “Gabiru”), Alessandro José de Sousa e Benedito Alexandre do Nascimento – acompanharam a sessão cabisbaixos, vestidos com roupas brancas.

Familiares de Mota ocuparam as primeiras fileiras do auditório logo no início do julgamento, por volta das 10h. “Estar aqui não é nada interessante. A saudade do meu filho é interminável”, disse o aposentado Marcelo Mota, 68. A filha do primeiro casamento do professor, Daniela Mota, 24, afirmou que a educação pública foi duramente atingida com a morte do professor. Ela comentou ainda que tem não consegue se acostumar com a ausência do pai. “Parece que vivo um pesadelo constante. É uma tragédia sem fim”, resumiu a jovem, formada em direito.

Ontem, o juiz ouviu cinco testemunhas arroladas pelo Ministério Público e sete pela defesa dos acusados. O delegado-chefe da 35ª Delegacia de Polícia de Sobradinho II, Márcio Michel, responsável pelas investigações do caso na Polícia Civil, prestou depoimento e reforçou não ter dúvidas de que os condenados são os atores do crime. Segundo ele, os rapazes decidiram matar o professor para “mostrar quem mandava no pedaço”. Em uma das oitivas mais contundentes do dia, o delegado detalhou como foram as investigações e lembrou que os três julgados haviam confessado a morte de Mota e, inclusive, participado da reconstituição do crime. “O professor Mota foi um idealista. Foi vítima de si mesmo porque quis combater coisas que nós devemos combater”, comentou o delegado.

Márcio Michel relatou ao juiz Daniel Mesquita Guerra e aos sete jurados que, durante as investigações, ouviu que o professor estava batendo de frente com as pessoas que ficavam na cercania das escolas, seja traficando ou bebendo.

Os depoimentos das testemunhas – sejam as arroladas pelo MP ou pela defesa dos acusados – foram, em sua maioria, confusos, cheios de contradições. Em alguns momentos, a platéia não conseguiu se conter e reagiu com risos e comentários em voz alta. O juiz Daniel Mesquita Guerra chegou a ameaçar esvaziar o auditório. Entre as testemunhas da defesa, estavam o pai e um irmão de acusados. Eles saíram em defesa dos familiares, sem entrar em detalhes. (publicado no Correioweb)