Ministro da Educação encena ação midiática para impulsionar Escola sem Partido

Há pouco mais de um ano, a mídia brasileira tratou como piada um crime de estupro. O crime foi contado pelo próprio autor. O ator Alexandre Frota revelou, em rede nacional na TV Bandeirantes, durante o programa “Agora é Tarde” e diante do apresentador Rafinha Bastos, que estuprou uma mãe de santo.
Em tom de piada e sem o menor constrangimento, o ator detalhou como forçou uma mãe de santo a ter relações sexuais sem seu consentimento. Relata que fez tanta pressão no pescoço da vítima que, em um determinado momento, percebeu que ela estava desmaiada. Foi aí que ele interrompeu o ato sexual forçado e largou a mulher no chão.
A plateia achou graça e aplaudiu a atitude do ator. O caso repercutiu nas redes sociais. E sumiu nos abismos da internet pouco tempo depois. Conhecido popularmente como ator de filmes pornô e novelas televisivas, volta e meia Frota regressa à cena midiática envolvido em algum tipo de escândalo. Desta vez, trazido pelo governo interino Michel Temer (PMDB), ele reaparece na mídia nacional para angariar a simpatia da população e chancelar uma das mais perversas ideias contra a educação pública do Brasil.
A presença do ator no Ministério da Educação não passa de mais uma jogada midiática para conquistar apoio da população para um projeto comparável ao Ato Institucional nº 5, da ditadura civil-militar, em 1968. O ator e outros integrantes do movimento de extrema direita “Revoltados Online” alcançaram expressão nacional não por acaso. A ideia era popularizar o projeto “Escola sem Partido”.
A ação midiática do governo em curso deixa claro que irá usar qualquer atitude para levar adiante o projeto de privatização da educação pública, com fortalecimento do projeto “Escola sem Partido”, um programa inconstitucional e doutrinário, que visa a destruir mais ainda o currículo escolar enfraquecido por sucessivas reformas da educação e a instituir, na escolas brasileiras, o terrorismo e a perseguição a professores e professoras.
A diretoria colegiada do Sinpro-DF entende que a educação pública, gratuita, de qualidade, socialmente referenciada é inconciliável com o projeto “Escola sem Partido” e incompatível com ações midiáticas reacionárias cujo objetivo é desqualificar para mercantilizar e privatizar, como vem ocorrendo no Estado de Goiás, ao arrepio da Constituição Federal.
Aliás, desrespeitar a Constituição Federal e infringi-la parece ter se tornado algo cotidiano no Brasil. Não é à toa que uma pessoa confessa um crime em público, em rede nacional, e, além de ficar impune, é convocado para servir de garoto-propaganda de uma proposta terrorista e privatista que ameaça a educação pública e os (as) educadores (as).
A proposta apresentada no documento “Escola sem Partido” parece convidativa em razão do clima político atual, criado pela mídia. Todavia, como mostra os seis projetos de lei sobre o assunto, em tramitação na Câmara dos Deputados – Projetos de Lei (PL) nº 867/2015; 7.180/2014; 7.181/2014; 1.411/2015; 1.859/2015; e 2.731/2015 –, todos têm uma única pauta: a doutrinação partidária.
Apesar de pronunciarem-se contrários à doutrinação (partidária), o “Escola sem Partido” e os PL em tramitação no Congresso Nacional, contraditoriamente, defendem uma escola doutrinária, que inibe a discussão de temas extremamente relevantes nas salas de aula e trata o conhecimento como se fosse algo estanque, blindado dos debates que ocorrem na sociedade.
Nas salas de aula, há estudantes das mais variadas origens socioculturais, que, neste salutar ambiente diverso, podem conviver com diferenças de opiniões, conhecimentos, valores, amadurecendo suas próprias perspectivas sobre o mundo. As propostas desses PL minam essa diversidade.
Para se ter uma ideia, o PL nº 867/2015, de autoria do deputado federal Izalci Lucas (PSDB-DF), em apreciação pela Comissão de Educação da Câmara, afirma, no artigo 3º, que “são vedadas, em sala de aula, a prática de doutrinação política e ideológica bem como a veiculação de conteúdos ou a realização de atividades que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos pais ou responsáveis pelos estudantes”.
Os PL e o “Escola sem Partido” são partes de um mesmo projeto que tem como um de seus objetivos, proibir professores e professoras de discutirem qualquer assunto que possa resultar em conflito com convicções religiosas, morais e políticas dos pais ou responsáveis. O problema é que discutir diversidade em sala de aula não é o mesmo que combater doutrinação partidária.
A proposta desse grupo de empresários e políticos privatistas é propor uma escola que não lide com valores e atitudes. A ideia é adotar, no Brasil, uma escola esvaziada de sua função social, uma escola que não aborde política (o que é muito diferente de doutrinação partidária) e que não ofereça aos estudantes a oportunidade, fundamental para sua formação cultural, de compreender a diversidade de modos de entender o mundo e se situar na sociedade.
O “Escola sem Partido” e os PL visam a instituir justamente o contrário dos ideias dos educadores Paulo Freire e Anísio Teixeira: em vez de uma escola pública, gratuita e socialmente referenciada, o projeto defendido no MEC nesta semana institui o terrorismo na categoria docente e, assim como os projetos de lei, fere o direito fundamental dos estudantes de trilhar, com autonomia, o caminho de sua formação. Isso mostra as contradições que acometem o movimento “escola sem partido”: no afã de combater doutrinação partidária, compromete-se com a doutrinação religiosa, moral e política, comprometendo a autonomia dos(as) educandos(as).
Além da defesa midiática de um projeto persecutório, a atitude do ministro interino da Educação, Mendonça Filho (DEM-PE), revela também o objetivo nefasto de desqualificar a discussão nacional sobre educação pública. Em menos de um mês, o ministro conseguiu reduzir as grandes discussões nacionais no campo da educação a um espetáculo midiático sem qualidade acadêmica e científica.
Nos últimos 13 anos, a educação pública brasileira ganhou investimentos financeiros e pedagógico-científicos. Diferentemente do que aconteceu nos governos neoliberais e privatistas dos anos 1990, o governo democrático-popular ampliou a rede pública de ensino fundamental e médio e expandiu a universidade pública. Trouxe para o MEC uma discussão superior e procurou envolver a sociedade em um debate elevado sobre o tema nas conferências regionais e nacionais de educação.
Hoje se assiste a um Ministério da Educação que não busca na comunidade acadêmica e escolar os grandes debates. Em vez disso, apresenta uma cena midiática rasteira com uma proposta de perseguição política a professores e professoras. Preocupada com essa desqualificação profissional, o Sinpro-DF reforça sua concepção de que o MEC deveria estar preocupado em cumprir o Plano Nacional de Educação (PNE) e outros projetos de financiamento público do setor. Também quer saber quando os grandes educadores (as) e estudiosos (as) da educação voltarão a serem recebidos no Ministério da Educação.

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