Para reduzir evasão no ensino médio, escolas apostam no acompanhamento e reforço

O abandono escolar de jovens no ensino médio e a dificuldade em melhorar os índices de conclusão têm ocupado parte importante do debate sobre a educação básica nos últimos anos. Dos 8,2 milhões de jovens matriculados no ensino médio em 2013, 659 mil abandonaram o estudo (8,1%) e 977 mil foram reprovados naquele ano (11,9%), segundo o Censo Escolar compilado na plataforma Qedu.

“O atraso no ensino médio impacta no mercado de trabalho porque reduz a qualidade do trabalhador e repercute no ensino superior, onde sentimos as dificuldades de formação do aluno “, analisa João Cardoso Palma Filho, especialista em política educacional da Unesp.

O quadro é mais preocupante no primeiro ano do ensino médio, quando o índice de abandono chega a 10,1% (339 mil estudante) e o de reprovação atinge 16,7%.
“A escola precisa conhecer melhor seu estudante, sua trajetória escolar e sua história de vida. Isso para que o professor possa perceber não apenas as lacunas de aprendizado, mas também lacunas relacionadas a aspectos emocionais, como auto-estima e autonomia”, avalia Rosângela Fritsch, professora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e pesquisadora da evasão de alunos na fase final da educação básica.
A fim de entender quais são as dificuldades enfrentadas nessa etapa do ensino e combatê-las surgem projetos que reúnem universidade e escolas em diferentes áreas do País.
Acompanhando três escolas públicas de São Leopoldo (RS), Rosângela explica que características dos alunos, como o alto índice de matrículas no período noturno, presença de alunos em atraso escolar e que trabalham, explicam parte importante do abandono escolar.
“É marcante esse círculo vicioso entre a reprovação, que leva à defasagem idade-série e ao abandono escolar”, afirma a pesquisadora. Nas escolas estudadas, o aluno que está na idade certa para sua escolaridade tem 148% mais chances de se formar no ensino médio que aquele que já está atrasado.
“Percebemos que por conta da dinâmica da escola, os professores sabiam muito pouco de seus alunos. Nós, então, apresentamos as informações coletadas sobre os estudantes para eles e começamos a discutir propostas para que as escolas tivessem melhores resultados”, conta.
Em parceria com os professores dessas escolas, uma das atividades feitas foi acompanhar os alunos que ao longo dos bimestres mostravam ter desempenho abaixo do adequado. “Fizemos uma proposta pedagógica de trabalho específica para eles e conseguimos que não houvesse reprovação nesse ano.”
Segundo Rosângela, mudanças simples na escola ajudam a criar um ambiente de troca que beneficie o aprendizado e a continuidade dos estudos. Algumas unidades de São Leopoldo mudaram adiantaram o jantar para o horário de início das aulas para aproximar os estudantes trabalhadores.
“Muitos desses alunos saem do trabalho direto para a escola, cansados e muitas vezes com fome. A escola criou a alternativa de antecipar a janta e trouxe os professores para a refeição. Assim, os alunos que chegam cedo podem tirar dúvidas e conversar com os professores. É uma ação bem simples, mas que pode aumentar a interação entre alunos e professores.”

Aluno precisa ser encantado pela escola

No ano passado, o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) apresentou os resultados de uma pesquisa que perguntava a jovens de baixa renda o que eles pensavam sobre a escola. Entre os achados, a pesquisa mostrou que os alunos não veem utilidade em muitas das disciplinas oferecidas. Apenas 30,5% consideravam biologia uma matéria útil, 28,8% percebiam valor no ensino de química e 27,6% no ensino de física.

Sentido na prática em escolas de Foz do Iguaçu (PR), esse cenário deu origem ao projeto Encantar para Ficar, criado por pesquisadores da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila). Localizado em uma cidade fronteiriça com o Paraguai, a coordenadora, Catarina Fernandes, conta que as escolas notavam a grande perda de alunos ao longo do ano.

“Uma sala que começava com 30 alunos chegava a julho com 15. Percebíamos que muitos deixavam a escola e eram atraídos para trabalhar com contrabando e outras atividades ilegais. Em entrevistas, eles diziam que parte do motivo do abandono era por não entenderem o conteúdo passado na escola”, conta.

“A escola precisa criar mecanismos para encantar este aluno do ensino médio para que ele fique dentro da escola. Ele precisa se sentir dentro da escola, criar um sentimento de pertencimento àquela unidade escolar.”
No projeto, alunos de licenciatura em ciências naturais da universidade e pesquisadores acompanham as aulas do ensino médio das escolas e, a partir das dificuldades dos alunos e do conteúdo apresentado pelos professores, fazem uma programação opcional de atividades em laboratório para os estudantes no contraturno. “É um projeto a título de reforço escolar, mas que também cria interesse e aumenta a autoestima dos estudantes”, avalia.
Desde fevereiro, os estudantes que quiserem podem participar das aulas em laboratório, visitas à universidade, ao observatório e outras propostas dos monitores do projeto. Ao longo do ano, Catarina conta que 70% dos estudantes de 1o ano se envolveram no projeto e, entre eles, não houve abandono escolar.
“Para o próximo ano devemos acompanhar os estudantes que já participaram do projeto e muitos deles serão monitores dos novos alunos do ensino médio, que entrarão no ano que vem. Após terem participado de uma feira de ciências, eles se sentem prontos para ajudar os futuros colegas e têm orgulho de participar das atividades e isso não podemos tirar deles”, afirma.
(Do IG)